domingo, 28 de fevereiro de 2016

ESTAMOS VIOLANDO O DIREITO À VIDA NO BRASIL.

“É como se a cada dois dias derrubássemos um avião lotado de jovens”

Para o diretor-executivo da Anistia Internacional no Brasil, Átila Roque, o Estado brasileiro não está conseguindo focar e dar prioridade ao enfrentamento dos altos índices de homicídio, que é a maior emergência humanitária que o Brasil vive. A Anistia lança hoje, no Rio de Janeiro, o relatório completo com um debate.



O artigo 5o da Constituição Brasileira garante a inviolabilidade do direito à vida. Mas as conclusões apresentadas pela Anistia Internacional no relatório “O Estado dos Direitos Humanos no Mundo”, que será lançado hoje, revela que estamos violando sistematicamente o direito à vida no Brasil. São cerca de 58 mil homicídios por ano no país. É uma letalidade altamente seletiva: 77% das vítimas são jovens negros, moradores da periferia. Como se essas vidas não tivessem valor algum para a nossa sociedade e para o Estado. Ao invés de o Brasil reagir com políticas públicas para enfrentar uma situação duas vezes superior à considerada epidêmica pela Organização Mundial de Saúde, o Congresso avança em pautas que tendem a dirimir direitos conquistados e a expor ainda mais essa população à violência, como a tentativa de reduzir a maioridade penal e a proposta de revogação do Estatuto do Desarmamento. “Há uma focalização dos homicídios e da penalização em um certo tipo de pessoa, de um determinado território”, explica Átila Roque, diretor-executivo da Anistia Internacional no Brasil. “São sujeitos considerados ‘matáveis’, quase descartáveis. É como se a cada dois dias derrubássemos um avião lotado de jovens – e isso não é notícia no jornal.”
A boa notícia é que a sociedade brasileira, por meio dos movimentos sociais, está reagindo aos retrocessos e omissões.
A entrevista é de Maria Carolina Trevisan, publicada por Jornalistas Livres, 24-02-2016.
Eis a entrevista.
O relatório apresentado pela Anistia Internacional este ano evidencia uma série de graves violações a direitos humanos e revela que o parlamento reforça medidas conservadores, na contra-mão do enfrentamento às violações. Há alguma surpresa, na sua opinião?
O que chamou a atenção da Anistia no caso do Brasil no ano passado, foi a agressividade da agenda conservadorano âmbito do Legislativo, que fez avançar a sua pauta. Terminamos o ano com muitos direitos importantes sob risco. São propostas que estão em tramitação ou já foram aprovadas na Câmara e aguardam confirmação do Senado. Percebemos que, diante de um certo vazio de lideranças no Congresso, acabou acontecendo a ascensão de uma liderança muito oportunista no sentido de engavetar uma série de propostas que significam um grave retrocesso em várias áreas importantes para a agenda de direitos humanos e que agora estão sujeitos a serem aprovados pelo Congresso.
É possível destacar algum avanço na garantia de direitos humanos no país?
Um ponto positivo foi que houve uma mobilização importante da sociedade na defesa desses direitos, especialmente de parcelas bastante significativas da juventude, tanto no que diz respeito à tentativa de redução da maioridade penal, como no que se refere aos direitos das mulheres e, mais para o final do ano, a mobilização dos estudantes, com várias manifestações importantes. Isso mostra que apesar do enorme baixo astral da agenda legislativa e do enorme descrédito que as instituições e os partidos estão sofrendo devido à crise do próprio modelo político, existe ainda uma força de participação da sociedade muito disposta a não recuar nas conquistas da democracia.
Diante desse cenário conservador atuante no Congresso, qual a importância das Comissões Parlamentares de Inquérito que se instauraram e se mantiveram ativas, como, por exemplo, a CPI contra o genocídio da juventude negra? 
Tivemos duas CPIs tratando especificamente do genocídio da juventude negra, uma na Câmara e outra no Senado. A Anistia vem tentando, há um ano e meio, mobilizar a sociedade e pautar, no marco da campanha Jovem Negro Vivo, a agenda do alto índice de homicídios no Brasil, o impacto que isso tem sobre a juventude brasileira e a juventude negra em particular. A gente vem demandando, por um lado, que a própria sociedade rompa essa cortina de silêncio e invisibilidade sobre essa agenda e por outro lado que o Estado coloque esse tema no marco de prioridades que a gente acha que ele deve ter. O fato de o Congresso ter respondido com as CPIs merece destaque. Foram momentos em que essa agenda entrou de maneira muito qualificada no debate parlamentar. Em geral, esse debate chega no parlamento por vias muito tortas e marcadas por estereótipos e preconceitos, com uma visão conservadora, como aconteceu no debate sobre a redução da maioridade penal. Foram momentos em que esse debate pode chegar à agenda do Legislativo de maneira muito mais qualificada.



Em relação aos índices de homicídio, quais as tendências observadas pela Anistia?
Os dados mais recentes mostram uma assustadora continuidade no crescimento desses índices. No último Mapa da Violência, a curva dos últimos 10 anos, referentes ao homicídio de jovens entre 15 e 29 anos, há uma situação bastante dramática. Quando você olha os jovens brancos, há um decréscimo da ordem de 33%. Quando você olha, nessa mesma faixa de idade, os jovens negros, há um crescimento de 33%. Ou seja é um espelho invertido, o que leva a gente a pensar que em grande medida, a taxa de homicídios de jovens negros é o que está sustentando a taxa de homicídios na faixa tão alta de 56 mil, ou 58 mil, segundo o Fórum de Segurança Pública Brasileiro.
O fato é que o Brasil vive uma situação que pode ser considerada de emergência, de epidemia de homicídio. De acordo com a Organização Mundial da Saúde, uma taxa de homicídios por cem mil habitantes, acima de 10, já pode ser considerada epidêmica. O Brasil, em média, está em mais ou menos 25 homicídios por cem mil habitantes. Ou seja, nós estamos mais no patamar da calamidade, porque 60 mil mortos por homicídio no ano é muito acima de várias guerras.
É uma taxa muito expressiva e que preocupa por sua seletividade racial e geracional.

A taxa absoluta de quase 60 mil homicídios por ano é muito alta sob qualquer aspecto. A taxa relativa, de 25 homicídios por 100 mil habitantes também é muito alta, porque está muito acima do patamar de epidemia. A taxa por idade e o registro por cor também são muitos elevados. Mais de 50% dessas mortes são de jovens. E entre os jovens, 77% são negros. Isso significa uma focalização da vitimização de jovens negros e pobres, da periferia. Mostra que há uma letalidade altamente seletiva.
Como o Estado reage? Há um desenho de política pública para enfrentar essa situação?
Juventude Viva [programa federal com desdobramentos municipais, desenhado especialmente para enfrentar o homicídio de jovens negros] é uma gota no oceano. É um programa que, quando você olha o conceito, é um meritório. Agora, o alcance dele, diante da tragédia que estamos vivendo é absolutamente pífio, para não dizer quase ridículo, considerando o tamanho do problema que a gente enfrenta no Brasil. O Governo Federal, o ministro da Justiça, vem há anos prometendo e adiando a publicação de um Plano Nacional de Redução de Homicídios, que traria um conjunto de iniciativas integradas, que envolveria o Estado e a União, focados na redução de homicídios. Nós estamos esperando isso há oito anos. A última vez que o ministro Cardoso prometeu isso foi no ano passado, no encerramento do encontro anual do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, quando ele disse que o plano estaria pronto e seria apenas questão de fechar os detalhes, para lançar não um “plano” mas um “pacto”. Estamos até agora esperando esse pacto. Já passou um ano desse momento.
Então, isso tudo sugere que estamos vivendo um impasse: o Estado brasileiro não está conseguindo focar e dar prioridade àquilo que é a maior emergência humanitária que o Brasil vive. É uma situação que, daqui a 10 anos, vai nos deixar na mesma ou pior. Porque se você não fizer alguma coisa, de forma organizada para reverter isso, isso não vai se reverter naturalmente. Pelo contrario. O que a gente deve assistir é o que estamos começando a ver nos dados: uma focalização 
cada vez maior dos homicídios, com a penalização cada vez maior de um certo tipo de pessoa, de um determinado território, que estão sendo considerados sujeitos ‘matáveis’, quase descartáveis, e a sociedade, o Estado consegue dormir todos os dias com essa tragédia. São 30 mil mortes de jovens por ano, é como se a cada dois dias você estivesse derrubando um avião lotado de jovens, 77% negros, e isso não é notícia no jornal.
O relatório diz que um dos pontos importantes para combater essa violência é a transparência na área da segurança pública. Como o senhor vê o posicionamento do governador Geraldo Alckmin, que impôs sigilo de 50 anos aos registros dos Boletins de Ocorrência?
Essa medida do governador Alckmin é inacreditável. Vai na contra-mão do que pedem os especialistas e dessa reivindicação por maior transparência e por maior sistematização dos dadosSão Paulo, que já foi um evento nessa área, está entre os estados que no passado deram exemplo, junto com o Rio de Janeiro. Hoje está caminhando a passos largos para um retrocesso gravíssimo. Se essa medida se confirmar, vai ser realmente assustador.
O que temos hoje no Brasil é uma situação em que a participação da polícia nos índices de homicídios é muito alta, ainda que os dados sejam fragmentados. Mostram que a participação do Estado, através da polícia, nesse total de homicídios é altíssima. No caso do Rio de Janeiro, por exemplo, olhando apenas os “autos de resistências”, ou seja, não estamos falando de todas as mortes que envolvem policiais, mas se a gente olhar apenas a situação em que a própria polícia diz que matou em legítima defesa, nós tivemos uma média nos últimos quatro anos de 15%. Ou seja, cerca de 15% do total de homicídios ocorridos no Rio de Janeiro são de pessoas mortas pelas mãos da polícia, supostamente em ações de legítima defesa. Mas diversas pesquisas mostram que essas mortes tratam-se de execuções sumárias e não de resistência seguida de morte. O relatório “Você matou meu filho”, lançado pela Anistia no ano passado, faz uma análise dos autos de resistência ocorridos no Rio em 2014 e também uma análise histórica desde 2011: há fortes indícios que a maioria dos casos de auto de resistência se tratou, na verdade, de execuções.
Então é correto afirmar que uma parte importante dos homicídios no Brasil é causada pela polícia.
Temos uma situação em que a polícia é parte do problema. A gente tem dificuldade de falar do conjunto do Brasil porque não há transparência, coleta uniformizada por parte das instâncias do estado, que têm responsabilidade sobre o controle e o monitoramento das ações policiais, com medidas efetivas nesses casos. O Ministério Público se omite e não atua no marco da sua responsabilidade constitucional, afinal de contas cabe ao MP o controle externo da ação policial, que não está fazendo isso. A Justiça, por sua vez, atua de maneira lenta, quase parada. Então, o número de situações que chega a qualquer tipo de responsabilização é quase nulo e a Polícia Civil também não investiga esses episódios. É quase uma cadeia de cumplicidade. Embora seja uma palavra forte, é como se tivesse todo um sistema funcionando para manter e autorizar a má atuação da polícia, no sentido de que ela pode continuar exercendo um papel de executora de pessoas consideradas traficantes ou bandidos, ou que quer que seja.
Como isso se reflete no sistema prisional?
O campo da Segurança Pública e da Justiça no Brasil, que em qualquer sociedade funciona como um termômetro, um importante patamar de cidadania, está se revelando num enorme déficit de Justiça, uma enorme violência. O que a gente vê é esse sistema funcionando para penalizar um certo tipo de pessoa, muito mais como um fator de repressão, controle e até eliminação de um certo perfil de cidadão do que uma instância recuperadora, garantidora de um patamar de civilidade e eventualmente de punição e responsabilização daquela pessoa que está em confronto com a lei.
É, na verdade, um instrumento de controle e supressão de direitos da própria vida de uma certa parte da população. Ao traçar um paralelo entre a taxa de homicídios (quase 60 mil por ano) e a taxa de resolução de homicídios (entre 5 e 8%), ou seja, menos de 8% obtém qualquer resultado da Justiça, encontra-se um número altíssimo de impunidade. Como pode um país em que o crime contra a vida é praticamente impune, ter, esse mesmo país, a quarta maior população prisional do mundo? É um país que está prendendo a pessoa errada! A maior parte dessas quase 600 mil pessoas que estão hoje nas prisões, nas piores condições possíveis, não cometeram crimes violentos, não cometeram crimes contra a vida. São pessoas que cometeram crimes contra o patrimônio ou o chamado “tráfico de drogas”, porque o usuário é enquadrado como traficante, e 40% dos presos estão em prisão provisória – passam mais tempo na prisão do que no final das contas é a pena.
Sobre o posicionamento político do Brasil, o que significa o país não ter se candidatado ao Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas, como chama a atenção o relatório?
Isso foi visto como uma surpresa negativa. Desde o início o Brasil tem participado e ocupado assento na Comissão de Direitos Humanos. Pela primeira vez, o Brasil declinou da participação. É muito surpreendente que um país como o nosso, que tem reivindicado uma posição de protagonismo internacional político e econômico, no momento em que tem a oportunidade de ocupar um lugar de importância como essa comissão, espaço em que os Estados membro dasNações Unidas exerce seu mandato fundamental de monitorar as condições de direitos humanos do mundo, se furte voluntariamente a ocupar esse lugar. O Brasil está quase dizendo para o mundo que ele é um ator secundário. Quase declarando e assinando com firma reconhecida que não tem competência para estar em um espaço global de defesa dos direitos humanos tão importante como a comissão.
O Brasil também não ratificou o Tratado sobre Comércio de Armas.
Quando o tratado foi aprovado, o Brasil foi um dos primeiros países a assinar, aderiu imediatamente. Mas desde então, a ratificação ainda não foi feita. O que cria uma enorme frustração e uma reversão de expectativas. Havia uma expectativa de que o Brasil fosse um dos primeiros a ratificar, dada a importância desse tratado no mundo de hoje. É mais fácil exportar arma do que banana. Existe muito mais controle do comércio internacional sobre banana do que armas de porte médio e pequeno, as que mais matam. Hoje o Brasil está mandando uma sinalização muito negativa ao não priorizar, não pressionar o Congresso.
No conjunto dos países pesquisados pela Anistia, como vai o Brasil? Há algum motivo de orgulho?
Anistia não faz ranking. Normalmente não traçamos esse paralelo porque a gente prefere não comparar países. Mas podemos dizer que nós estamos entre os países que mais mata no mundo. Provavelmente em termos absolutos corre o risco de ser o país que mais mata e está entre os mais desiguais e mais violentos, mantendo um nível muito alto de violência de defensores de direitos humanos.
Se você olha o volume de pessoas mortas no campo ou lideranças indígenas camponesas que são assassinadas, oBrasil é dos países que mais mata no mundo. Então, se você traçar um paralelo, o cenário dos direitos humanos no Brasil não nos orgulha. Tem avanços pontuais, mas estamos vivendo um momento em que tem uma grave ameaça de retrocesso. Ainda não se configurou porque ainda não foram medidas aprovadas, foram parcialmente aprovadas.
Espera-se que a reação da sociedade possa reverter a situação. Mas estamos falando de grandes riscos. A situação brasileira não corresponde aos avanços que nós logramos em outras esferas, como o protagonismo global, a luta contra a pobreza, o avanço da democracia. O Brasil obteve grandes avanços ao longo dos últimos 30 anos do ponto de vista da Constituição, mas mantém ainda um patamar alto de violação, devido à dificuldade de implementação desse marco legal avançado, que não corresponde ao que nós gostaríamos de ver.
Fonte : Instituto Humanias Unisinos.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

BRASIL DE RECESSÃO À DEPRESSÃO.

"País precisa de ousadas medidas anti-depressão"

Dados divulgados pelo Banco Central (BC) na quinta-feira 18 sugerem que a economia recuou 4% em 2015. No mesmo dia, a OCDE, organismo internacional a reunir nações ricas, previu que o Brasil encolherá 4% este ano. Confirmados os prognósticos, o País passará da recessão à depressão. Pior num momento de desconfianças sobre uma nova onda de crise global.
A reportagem é de André Barrocal, publicada por CartaCapital, 22-02-2016.
Ex-presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o economista Marcio Pochmann diz só enxergar uma saída. A adoção de “medidas anti-depressão ousadas” por parte do governo. Em suma, aumentar os gastos e os investimentos públicos, para tentar estimular a atividade econômica e reverter as expectativas dos agentes econômicos. Sem dinheiro na praça, nada feito.
Só o Estado, diz Pochmann, “tem capacidade de gasto autônomo”. Em outras palavras, o setor público consegue funcionar planejadamente tendo prejuízo por um tempo, ao contrário das famílias e das empresas. A transformação do déficit público em superávit pode ficar para adiante, quando a economia tiver se normalizado. 
A mesma terapia acaba de ser prescrita aos países mais ricos pela Agência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento (Unctad). No jornal Valor da quarta-feira 17, o chefe da Macroeconomia da Unctad, Alfredo Calcagno, disse que, se os mais ricos gastarem mais, mesmo aqueles que têm déficit fiscal, ajudariam na recuperação da economia mundial.
De acordo com Calcagno, a recuperação global favoreceria os países emergentes, que escaparam dos piores efeitos da crise financeira internacional eclodida em 2008 mas agora são as vítimas da terceira onda da crise. A segunda onda afetou a Europa em 2011 e 2012, em especial países com dívidas altas, como Espanha, Portugal, Grécia e Itália.
Para Pochmann, já é possível vislumbrar uma quarta onda de crise. Esta nasceria de uma eventual recessão nos Estados Unidos caso o Banco Central de lá siga a elevar o juro. Em dezembro, o BC norte-americano subiu a taxa pela primeira vez desde 2006. Se este aumento prosseguir, talvez tire dinheiro empregado no setor produtivo e canalize-o para aplicações financeiras.
“Não estamos num estado normal do capitalismo”, diz Pochmann, a ver semelhanças com a maior depressão mundial já conhecida, a dos anos 1930 – superada, aliás, com um plano de investimento público adotado nos EUA, o epicentro da depressão. “Nos EUA hoje, o pré-candidato a presidente que é socialista cresceu nas pesquisas fazendo críticas ao sistema financeiro e capitalista.”
A grande depressão dos 1930, diz Pochmann, contribuiu fortemente para mudanças de governos e governantes em ao menos 20 países, Brasil incluído. Teria o mesmo impacto por aqui agora? “Estamos para colher os efeitos mais dramáticos da recessão iniciada no ano passado com a fracassada política de austeridade do [ex-ministro Joaquim]Levy, o aumento do desemprego.”
Em 2015, foram fechadas 1,5 milhões de vagas com carteira assinada. A taxa oficial de desemprego subiu de 4,3% em dezembro de 2014 para 6,9% ao fim de 2015. Uma taxa mais abrangente divulgada pelo IBGE na sexta-feira 19 aponta um desemprego de 9% em novembro passado. No Ministério do Trabalho, acredita-se no fechamento de ao menos mais um milhão de vagas este ano.
“O desemprego vai subir, o caldo político é muito grande, o PSDB tem radicalizado contra o governo, o PT ensaia uma mudança em relação ao governo, talvez até se afaste. O governo não vai ficar imune a isso”, diz Pochmann. “O governo vai ser levado a mudar ou deixará de ser governo. 2016 será um ano que marcará época.”
 Fonte : Instituto Humanitas Unisinos

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

IUGOSLÁVIA

Iugoslávia – Formação e desagregação


Fonte : educador.brasilescola.uol.com.br


A antiga Iugoslávia era composta por diferentes povos: croatas, eslovenos, sérvios, muçulmanos, albaneses, macedônios, entre outros. Esses povos tinham diferentes características culturais, como a língua, os hábitos e a religião, tão específicos que chegaram a entrar em conflito várias vezes no decorrer da história.

A FORMAÇÃO DA IUGOSLÁVIA E A IMPORTÂNCIA DE TITO



A Federação Iugoslava originou-se após a Primeira Guerra Mundial, a partir de territórios que faziam parte dos Impérios Austro-Húngaro e Turco-Otomano. Apesar da balcanização étnica e religiosa, a Iugoslávia manteve-se unida após a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Essa união deveu-se à influência e habilidade política de um líder socialista e carismático, o marechal Josip Broz Tito, que se destacou na luta contra os invasores nazistas durante a Segunda Guerra Mundial.
Tito implantou na Iugoslávia um regime socialista, mas jamais aceitou a interferência da União Soviética. Após a morte de Tito, em 1980, a situação política e econômica começou a se agravar.
A Iugoslávia era formada por uma federação de repúblicas (Sérvia, Montenegro, Croácia, Eslovênia,Bósnia-Herzegovina e Macedônia) e por regiões autônomas (Voivodina e Kosovo). Dentre as repúblicas que integravam a Iugoslávia, a Sérvia era a mais poderosa, uma vez que controlava a maior parte das forças armadas e da economia do país.
A ocorrência de minorias sérvias na Bósnia-Hezergovina, Croácia e Eslovênia teve o objetivo de misturar os povos do país, a fim de dificultar futuros movimentos separatistas nessas regiões.

Conflitos e mudanças geopolíticas recentes:
1-
 Bósnia-Herzegovina (Guerra Civil entre 1991-1995)
2-
 Kosovo (conflito em 1999, área com administração da ONU com presença de tropas da OTAN e Rússia)
3-
 Macedônia (conflitos entre macedônios e a minoria albanesa em 2001)
4-
 Independência de Montenegro por referendo em 2006

ESLOVÊNIA, CROÁCIA E MACEDÔNIA

Na década de 1990, com a ampliação da crise econômica na Iugoslávia, revigoraram-se as antigas rivalidades entre os grupos étnicos, conduzindo a movimentos nacionalistas e separatistas. A partir de então, iniciou-se a fragmentação política e territorial iugoslava.
A Eslovênia foi a primeira república a declarar-se independente, firmando a cidade de Liubliana como sua capital. Trata-se de um pequeno país, mas com razoável industrialização e renda per capita elevada para os padrões do Leste Europeu.
Em seguida, a Croácia declarou sua independência, com a capital em Zagreb. O governo central iugoslavo, controlado pelos sérvios, mandou tropas para conter os separatistas e os combates agravaram a crise.
A Macedônia, a mais pobre das ex-repúblicas iugoslavas, também tomou-se independente. A partir de 2000, o país passou a enfrentar conflitos entre macedônios e a minoria albanesa, que se rebelou na fronteira com Kosovo.

BÓSNIA-HERZEGOVINA

A crise na Iugoslávia tornou-se-ia mais grave na república da Bósnia-Herzegovina, pois sua população era composta por grupos étnicos diferentes, 44% de muçulmanos, 31% de sérvios e 17% de croatas, grupos estes que tinham objetivos divergentes:
·         os croatas e muçulmanos que viviam na Bósnia desejavam sua independência política;
·         os sérvios que moravam na Bósnia queriam continuar pertencendo à Iugoslávia, com a Sérvia e Montenegro.
Um plebiscito aprovou a independência da Bósnia-Herzegovina em 1992, reconhecida por vários países europeus e pelos Estados Unidos. Entretanto, as divergências entre os três grupos étnicos levaram a uma sangrenta guerra civil, que visava ao controle sobre vários territórios. Os sérvios-bósnios tiveram auxílio da Iugoslávia (Sérvia e Montenegro); já os croatas-bósnios foram ajudados pela vizinha Croácia.
A guerra civil deixou cerca de 200 mil mortos. Foram violados quase todos os direitos humanos básicos. Houve massacre de populações civis indefesas, campos de concentração, alocação de cadáveres em valas comuns, estupros em massa de mulheres de grupos étnicos adversários, entre outras atrocidades. Os anos de guerra levaram à devastação da economia e da infraestrutura da Bósnia.
Por meio de pressões internacionais lideradas pela ONU, Estados Unidos, Rússia e União Europeia, chegou-se a um acordo de paz a partir de 1995, após a assinatura do Tratado de Dayton. Por esse acordo, a Bósnia-Herzegovina foi mantida como país independente por meio de uma Confederação.

Cerca de 49% do seu território ficou sob controle sérvio-bósnio, enquanto que 51% dele passou para o controle dos muçulmanos e croatas-bósnios. Essa divisão territorial por grupos étnicos também passou a vigorar na sua capital, Sarajevo.
Fonte : coladaweb.com 
Ilustração : Geo-Conceição

A PREVIDÊNCIA SOCIAL NÃO TEM DÉFICIT.


A Previdência social não tem déficit, constata economista

"Em suma, à luz da Constituição da República, não se pode considerar a Previdência Social apartada da Seguridade Social. Mais especificamente, não se pode excluir o financiamento da Previdência Social (Rural e Urbana) do conjunto de fontes que integram o Orçamento da Seguridade Social que sempre foi superavitário. Portanto, não há como se falar em “déficit” na Previdência Social", escreve Eduardo Fagnani, professor do Instituto de Economia da Unicamp e pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e do Trabalho (Cesit/IE-Unicamp), em artigo publicado por Plataforma Política Social. Caminhos para o Desenvolvimento, 21-02-2016.
Eis o artigo.
As conquistas do movimento social das décadas de 1970 e 1980 contrariaram os interesses dos detentores da riqueza. Em grande medida, isso se devia ao fato de que mais de 10% do gasto público federal em relação ao PIBpassou a ser vinculado constitucionalmente à Seguridade Social. Desde a Assembleia Nacional Constituinte até os dias atuais, esses setores desenvolvem ativa campanha difamatória e ideológica orientada para “demonizar” a Seguridade Social e, especialmente, o seu segmento da Previdência Social, cujo gasto equivale a 8% do PIB.
Nesta campanha prepondera o vale-tudo para recapturar esses recursos. Em flagrante confronto com a Constituição da República, especialistas esforçam-se para “comprovar” a inviabilidade financeira da Previdência, para justificar nova etapa de retrocesso nesses direitos.
O objetivo deste artigo é assinalar que não existe déficit na previdência, caso seja considerado o que a Constituição da República Federativa do Brasil manda fazer e o modo como determina que sejam executados os procedimentos.
O modelo tripartite de financiamento da Seguridade
Seguridade Social é ao mesmo tempo o mais importante mecanismo de proteção social do País e um poderoso instrumento do desenvolvimento. Além de transferências monetárias para a Previdência Social (Rural e Urbana), contempla a oferta de serviços universais proporcionados pelo Sistema Único de Saúde (SUS), pelo Sistema Único de Assistência Social (SUAS), pelo Sistema Único de Segurança Alimentar e Nutricional (Susan) e pelo Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), com destaque para o programa seguro-desemprego.
Para financiar a Seguridade Social (artigo 194 da Constituição Federal), os constituintes de 1988 criaram o Orçamento da Seguridade Social (artigo 195) um conjunto de fontes próprias, exclusivas e dotadas de uma pluralidade de incidência. As contribuições sociais pagas pelas empresas sobre a folha de salários, o faturamento e lucro, e as contribuições pagas pelos trabalhadores sobre seus rendimentos do trabalho integram esse rol exclusivo de fontes do Orçamento da Seguridade Social, com destaque para:
* Receitas da Contribuição previdenciária para o Regime Geral da Previdência Social (RGPS) pagas pelos empregados e pelas empresas;
* Contribuição Social sobre o Lucro Líquido das Empresas (CSLL);
* Contribuição Social Para o Financiamento da Seguridade Social, cobrada sobre o faturamento das empresas (Cofins);
* Contribuição para o PIS/Pasep para financiar o Programa do Seguro-Desemprego e para financiar os programas de desenvolvimento do BNDES, igualmente cobrada sobre o faturamento das empresas;
* Receitas das contribuições sobre concurso de prognósticos e as receitas próprias de todos os órgãos e entidades que participam desse Orçamento.
Destaque-se que a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido das Empresas (CSLL) e a Contribuição Social para o Financiamento da Seguridade Social, cobrada sobre o faturamento das empresas (Cofins) foram criadas pelos constituintes em 1988 para financiar os benefícios típicos da Seguridade Social (Previdência RuralBenefício de Prestação Continuada e SUS, público, gratuito e universal). Essas contribuições estavam previstas no documento “Esperança e mudança: uma proposta de governo para o Brasil” (PMDB, 1982).
Com o Orçamento da Seguridade Social, os constituintes estabeleceram o mecanismo de financiamento tripartite clássico (trabalhador, empresa e governo, através de impostos) dos regimes de Welfare State.
Estudos realizados pelo IPEA (2006) demonstram que para um conjunto de quinze países da OCDE, em média, os gastos com a Seguridade Social representam 27,3% do PIB e são financiados por 38% da contribuição dos empregadores; 22% pela contribuição dos empregados; e 36% da contribuição do governo (através de impostos gerais pagos por toda a sociedade). Em cinco países (Dinamarca, Irlanda, Luxemburgo, Reino Unido e Suécia), a participação do governo é relativamente mais elevada.
No Brasil, a contribuição estatal que deve integrar essas contas é muito pequena. Em 2012, de um total de R$ 317 bilhões utilizados para pagar benefícios previdenciários, as contribuições exclusivamente previdenciárias (empresas e trabalhadores) somaram R$ 279 bilhões (88% do total). A parcela estatal propriamente dita seria de apenas 12%, um montante muito inferior à terça parte (33%) que caberia numa conta tripartite.
Se nessa conta fossem consideradas as renúncias fiscais, outros R$ 22 bilhões comporiam as receitas previdenciárias, cabendo ao Tesouro tão somente complementar 5% do total das despesas previdenciárias. Uma conta insignificante, de R$ 16 bilhões, 0,33% do PIB (ANFIP, 2013).
Portanto, os constituintes de 1988 seguiram a experiência internacional clássica e ratificaram o sistema tripartite introduzido por Getúlio Vargas na década de 1930 e seguido desde então, inclusive pela ditadura civil e militar.
Os reformadores de 1988 vincularam constitucionalmente recursos do Orçamento da Seguridade Social, para evitar uma prática corrente na Ditadura Militar: a captura, pela área econômica, de fontes de financiamento do gasto social. Naquela época, em vez de a política econômica financiar a política social, a política social financiava a política econômica. Aquela lógica invertida assim continuou (invertida) pelos governos democráticos a partir de 1990.
“Déficit” e Contribuição do Governo
Desde 1989 nunca se cumpriu rigorosamente o que reza a Constituição da República, no que diz respeito aos princípios da Organização, Financiamento e Controle Social da Seguridade Social (consultar FAGNANI E TONELLI VAZ, 2013). Como mencionado, o artigo 194 da Constituição Federal declara que a Previdência Social é parte integrante da Seguridade Social e conta com recursos do Orçamento da Seguridade Social (artigo 195).
Contrariamente ao que determina a Constituição os Poderes Executivo (MPAS, MPOG, MF e BC) e Legislativo não consideram a Previdência como parte da Seguridade Social. Desde 1989, o MPAS adota critério contábil segundo o qual a sustentação financeira da Previdência depende exclusivamente das receitas próprias do setor (empregados e empregadores). A parcela que cabe ao governo do governo no sistema tripartite não é considerada. Essa lacuna leva, inexoravelmente ao “déficit” do Regime Geral de Previdência Social (Urbano e Rural).
Essa prática contábil só serve, unicamente, para criar, alardear um falso déficit e justificar mais ‘reformas’ com corte de direitos. São invencionices, pois desconsideram os artigos 165, 194, 195 e 239 da Constituição da República.
A Seguridade Social é Superavitária
O governo jamais organizou a Seguridade Social e apresentou o Orçamento da Seguridade como ordenam os dispositivos constitucionais mencionados. Alguns especialistas (GENTIL, 2007) e instituições têm desenvolvido esforço metodológico nesse sentido. Esses estudos revelam que o Orçamento da Seguridade Social sempre foi superavitário. Em 2012, por exemplo, apresentou saldo positivo de R$ 78,1 bilhões (as receitas totalizaram R$ 590,6 bilhões e as despesas atingiram R$ 512,4 bilhões) (ANFIP, 2013)


Portanto, à luz da Constituição da República, não há como se falar em “déficit” na Previdência Social. Na verdade, sobram recursos que são utilizados em finalidades não previstas na lei. Assim, como ocorria na ditadura, a Seguridade Social continua a financiar a política econômica.
Captura de Recursos da Seguridade Social
Orçamento da Seguridade Social tem-se mantido superavitário, mesmo com a instituição da atual Desvinculação das Receitas da União (DRU), em 1994, que captura 20% dessas receitas para serem aplicadas livremente pela área econômica. Com subtração de recursos e com muitas manobras que inflavam artificialmente as despesas, fizeram da Seguridade uma importante fonte para o ajuste fiscal do período. Só em 2012, a DRU retirou da Seguridade Social R$ 52,6 bilhões. O acumulado, só para o período 2005-2012, totaliza mais de R$ 286 bilhões (ANFIP, 2013).
Da mesma forma, o Orçamento da Seguridade Social tem-se mantido superavitário mesmo com o aprofundamento da política de concessão de isenções fiscais para setores econômicos selecionados iniciado nos anos de 1990, quando, por exemplo, o setor do agronegócio foi isentado de contribuir para a Previdência Rural. Essa política foi aprofundada a partir de meados da década passada. Em 2012, as isenções tributárias concedidas sobre as fontes da Seguridade Social (CSLL, PIS/Pasep, Cofins e Folha de Pagamento) totalizaram R$ 77 bilhões (1,7% do PIB). Em 2013 a ANFIP previa que elas atingiriam 2,7% do PIB no ano seguinte (ANFIP, 2013).
Assim como a DRU, esse processo também deprime o superávit da Seguridade Social e poderá comprometer sua sustentação financeira no futuro.
A Previdência é parte da Seguridade Social.
Em 1988, a sociedade concordou em assegurar proteção à velhice para milhões de trabalhadores rurais que começaram a trabalhar nas décadas de 1940, sem registro na carteira e em condições de semiescravidão. Houve naquele momento um pacto social para resgatar uma injustiça histórica cometida contra esse segmento.
Por outro lado, a Carta de 1988 fixou uma contribuição com base muito limitada para financiar o estoque de trabalhadores rurais e o fluxo de novos beneficiários. Essa base de contribuição é ainda mais restringida pelas isenções fiscais dadas ao agronegócio exportador (Emenda Constitucional 33/1997). Entretanto a COFINS e a CSLL, criadas em 1988, suprem o financiamento deste benefício típico da seguridade. Essas contribuições foram instituídas para que o estado cumpra sua parte no sistema tripartite.
Em suma, à luz da Constituição da República, não se pode considerar a Previdência Social apartada da Seguridade Social. Mais especificamente, não se pode excluir o financiamento da Previdência Social (Rural e Urbana) do conjunto de fontes que integram o Orçamento da Seguridade Social que sempre foi superavitário. Portanto, não há como se falar em “déficit” na Previdência Social.
Nas contas dos resultados financeiros do RGPS apresentados pelo MPAS, além da devida e pronta compensação das renúncias, é necessário acrescer a contribuição do Estado, para complementar a base de financiamento tripartite do modelo. Se as contas da previdência social fossem assim apresentadas, o mito do déficit estaria desmascarado.
Notas:
1. Artigo escrito para o projeto “ Política, Planejamento e Gestão das Regiões e Redes de Atenção à Saúde no Brasil” (Região e Redes – Caminho para a Universalização da Saúde no Brasil). Baseado em Fagnani e Tonelli Vaz (2013).
Referencias:
ANFIP (2013). Análise da Seguridade Social 2012. Associação Nacional dos Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil e Fundação ANFIP de Estudos da Seguridade Social – Brasília: ANFIP, 2013, 131 p.
FAGNANI, E. e TONELLI VAZ, F. (2013). Seguridade social, direitos constitucionais e desenvolvimento. In: FAGNANI. E. & FONSECA, A (ORG). (2013 – B). Políticas sociais, universalização da cidadania e desenvolvimento: educação, seguridade social, infraestrutura urbana, pobreza e transição demográfica. São Paulo, Fundação Perseu Abramo (ISBN, 978-85-7643-178-7).
GENTIL, Denise, L. (2007) Política econômica e Seguridade Social no período pós-1994. Carta Social e do Trabalho, n.7. Campinas: Instituto de Econômica da Unicamp: Centro de Estudos Sindicais e do Trabalho. Publicação eletrônica (www.eco.unicamp.br)
IPEA (2006). Brasil – o estado de uma nação – mercado de trabalho, emprego e informalidade. Tafner, P (editor). Brasília: Ipea.
PMDB (1982). Esperança e mudança: uma proposta de governo para o Brasil. Revista do PMDB, ano II, n. 4. Rio de Janeiro: Fundação Pedroso Horta.
Fonte : Instituto Humanitas Unisinos

sábado, 20 de fevereiro de 2016

"JUSTIÇA CLIMÁTICA".

O que é justiça climática?

As mudanças climáticas têm sido debatidas há décadas, mas “justiça climática” é um conceito relativamente novo. O que significa esse termo e como esse movimento se diferencia de outros movimentos ambientais?
Mudanças climáticas como um assunto ético e político
No início da década de 1980, nos Estados Unidos, um novo movimento surgiu após vários protestos e processos judiciais contra o lixo tóxico e a poluição em bairros pobres e zonas rurais.  O movimento por justiça ambiental, como era chamado, buscava justiça para as pessoas que foram desproporcionalmente afetadas pela degradação ambiental e era liderado por diversos grupos marginalizados que acreditavam que suas comunidades eram as mais prejudicadas. Esse movimento era diferente do movimento ambientalista mais amplo, que centrava-se na degradação ambiental e, com frequência, ignorava os seus impactos nas comunidades e nos bairros mais pobres. O movimento por justiça ambiental procurou livrar o mundo do racismo ambiental – um problema que não era sequer levado em consideração pela maior parte dos ambientalistas.
À medida que as mudanças climáticas se tornaram um problema mais urgente, o movimento ambientalista mais amplo tomou para si a responsabilidade de tentar mitigar os impactos do aquecimento global e de educar as pessoas sobre como o meio ambiente seria afetado. Ao mesmo tempo que as consequências para os seres humanos sempre foram uma preocupação para os ambientalistas, esse não era necessariamente o seu foco – principalmente quando falamos de grupos marginalizados. Consequentemente, esforços e campanhas para ajudar ecossistemas podem acabar prejudicando comunidades pobres e indígenas e podem não conseguir chegar à raiz da degradação climática, o que é ainda mais importante.
O movimento por justiça climática é a resposta do movimento internacional por justiça ambiental às mudanças climáticas. Ele vê as mudanças climáticas como uma questão complexa de justiça social, e não apenas como um problema ambiental. Enquanto os ambientalistas podem considerar que as mudanças climáticas sejam o simples resultado de um sistema industrial com pouca regulamentação, a justiça climática acredita que elas sejam o produto da desigualdade e de um sistema econômico obcecado pelo crescimento em prol do crescimento. O racismo e o classismo estão intrinsecamente conectados às mudanças climáticas, e esses problemas não podem ser ignorados.
1
O poder das pessoas
Um fator importante para os movimentos por justiça ambiental e climática é que ambos são movimentos de base, que enfatizam a necessidade de envolver as comunidades na organização de suas próprias ações e nas decisões sobre seus próprios futuros. Embora a justiça climática frequentemente envolva pressionar grandes corporações e governos, essa pressão vem das pessoas, e não de cima. Acredita-se na capacidade das comunidades de influenciarem os poderosos, mais do que nos próprios poderosos. Em outras palavras, a justiça climática é movida pelo poder das pessoas.
A organização, em contraposição à ação individual, é a estratégia de base do movimento por justiça climática. Já vimos muitos exemplos desse tipo de organização ao redor do mundo, especialmente quando nos aproximávamos da Cúpula de Paris. Alguns poderão lembrar do que diz o livro de Naomi Klein, This Changes Everything (“Isto Muda Tudo”, em português): grupos e comunidades indígenas estão se tornando cada vez mais ativos na luta contra os interesses dos combustíveis fósseis.
Justiça climática ao redor do mundo
Oleoduto Keystone XL
Recentemente, a justiça climática ganhou as manchetes do mundo todo quando ativistas conseguiram impedir a continuidade do oleoduto Keystone XL, que levaria petróleo das areias betuminosas de Alberta, no Canadá, até as refinarias no Golfo do México. Uma rede popular massiva envolvendo povos originários, fazendeiros e outros grupos locais começou a campanha contra o oleoduto em 2010. O movimento se estendeu por anos, com ativistas trabalhando incansavelmente tanto contra o oleoduto quanto contra a extração das areias betuminosas, por meio do ativismo de base e de ações diretas não violentas, parecido com o que se viu no fim da década de 1960. No final de 2015, Barack Obama finalmente rejeitou o oleoduto.
2
Bloqueio do porto de Newcastle, na Austrália
As nações das Ilhas do Pacífico estão entre os locais mais vulneráveis no mundo aos impactos das mudanças climáticas. Em outubro de 2014, líderes de 12 nações das Ilhas do Pacífico – os chamadosPacific Climate Warriors (“Guerreiros do Clima do Pacífico”, em português) – formaram um bloqueio no maior porto de exportação de carvão do planeta, usando canoas tradicionais feitas no local. Como parte do movimento da 350 Pacífico, os 30 ativistas conseguiram impedir a saída de oito dos 12 navios previstos para deixarem o porto durante o período do bloqueio.
3
Desinvestimento
Em escala mais ampla, ativistas e organizações do mundo todo têm pressionado as instituições para que deixem de investir em fundos que apoiam os combustíveis fósseis e em corporações que os extraem. O movimento de desinvestimento, liderado pela 350.org, já conseguiu que mais de 500 instituições se comprometessem a retirar mais de US$ 3,4 trilhões de investimentos em combustíveis fósseis – com contribuições significativas por parte de grupos e fundações religiosas. Isso representou um golpe duro para a indústria dos combustíveis fósseis, e os investidores estão pensando duas vezes a respeito de questões éticas e de segurança antes de colocar seu dinheiro na extração de carvão, petróleo e gás.
Os valores da justiça climática
Os valores do movimento por justiça climática são semelhantes aos valores dos grandes movimentos por justiça social: comunidade, grupos marginalizados, poder popular e igualdade. Isso é percebido em suas ações, local e globalmente. A justiça climática é uma forma ativa e integrada de enfrentar os desafios causados pelas mudanças climáticas, pelo capitalismo e pela injustiça. Pessoas comuns podem fazer a diferença em suas comunidades e no mundo!
Fonte : 350 Brasil