sábado, 25 de fevereiro de 2017

SAPUCAÍ E OS POVOS INDÍGENAS DO XINGU.

Nota da Comissão Pastoral da Terra (CPT): Causa indígena na Marquês de Sapucaí

nota pública 
Às vésperas do carnaval, a Comissão Pastoral da Terra (CPT), o Conselho Pastoral dos Pescadores (CPP) e o Serviço Pastoral do Migrante (SPM) vêm a público manifestar seu apoio à Escola de Samba Imperatriz Leopoldinense, diante da celeuma provocada pela reação de diversas entidades ligadas ao agronegócio e empresas de comunicação a ele subservientes, ao tomarem conhecimento da homenagem aos povos indígenas do Xingu, que vai ser tema da escola de samba no carnaval carioca deste ano.
Os ruralistas estão se sentindo agredidos pela temática da escola, sobretudo com a ala “os fazendeiros e seus agrotóxicos”. Diversas entidades em que se organizam, desfecharam violentas críticas à escola acusando-a de atacar os produtores rurais que se afirmam responsáveis por expressiva porcentagem do PIB nacional. Órgãos da grande imprensa, alinhados ao agronegócio, também estamparam em seus meios sua indignação contra a escola e seu samba enredo. O senador Ronaldo Caiado até chegou a sugerir uma sessão temática no parlamento para discutir o assunto.
O carnavalesco Cahê Rodrigues, ao responder às críticas, diz que o samba quer simplesmente defender o indígena, dar voz a ele, por isso “tudo que agride a floresta, o meio ambiente e, diretamente o índio, nós precisamos citar. Porque o enredo não é um conto de fadas. É uma história real”.
Como se pode entender tamanha celeuma em torno a um tema de escola de samba?
O fenômeno encontra na história suas raízes mais profundas. Desde a invasão portuguesa o território brasileiro tem sido considerado propriedade exclusiva dos invasores.
Os povos indígenas e, posteriormente, os descendentes de escravos libertos, os quilombolas, e outras comunidades de pobres no campo, que ocupam parcelas do território nacional, têm sido até hoje sistematicamente invisibilizados, como se não existissem. E no decorrer da história foram arrancados de seus territórios por diversos mecanismos de espoliação.
Os que tentam resistir são tratados como empecilhos ao desenvolvimento e progresso de nosso país, sofrem perseguições e violências e, muitas vezes, perdem a própria vida, como as 61 pessoas que foram assassinadas devido aos conflitos no campo em 2016, segundo dados parciais da CPT, o maior número de assassinatos desde o ano 2003. Deste total, 12 são indígenas.
Somente com muita luta e determinação é que os indígenas e quilombolas conseguiram introduzir na Constituição Federal de 1988 dispositivos que reconhecem sua existência e os direitos sobre seus territórios, sua cultura e seus modos de viver.
As entidades que reagiram contra o enredo da escola de samba defendem um agronegócio apresentado como pop pela grande mídia. Mas, um pop que mata! Mata a terra e os demais seres que dela vivem. Inúmeras situações no Brasil denunciam os impactos nocivos das atividades do agronegócio sobre o meio ambiente, a saúde humana e a violação aos direitos básicos das pessoas.
A escola de samba Imperatriz Leopoldinense já se pode considerar vencedora do carnaval carioca de 2017, por estar resgatando da invisibilidade histórica os povos indígenas do Brasil e denunciando as agressões constantes que sofrem em seus territórios, em seus modos de vida e cultura.
As pastorais do campo, que buscam através de suas ações valorizar as comunidades com as quais trabalham, escutando suas histórias, seus apelos, seus sonhos, querem parabenizar a Escola e o carnavalesco Cahê Rodrigues por esta escolha histórica.
Goiânia, 22 de fevereiro de 2017.
Comissão Pastoral da Terra – CPT
Serviço Pastoral dos Migrantes – SPM
Conselho Pastoral dos Pescadores – CPP

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 24/02/2017

2050 : ONU ALERTA, TEREMOS MAIS PLÁSTICOS QUE PEIXES NOS OCEANOS.

ONU lança iniciativa global para eliminar grandes fontes de lixo marinho até 2022

Campanha #CleanSeas foi lançada nesta quinta-feira em Bali; iniciativa busca eliminar grandes fontes de lixo marinho até 2022, como microplásticos em cosméticos e desperdício de plásticos descartáveis; se nada for feito estimativas são que em 2050 oceanos tenham mais plásticos que peixes.
Em alguns lugares do mundo a poluição por plásticos é simplesmente catastrófica, como nesta praia em Mumbai, na Índia
Em alguns lugares do mundo a poluição por plásticos é simplesmente catastrófica, como nesta praia em Mumbai, na Índia, Foto: UN Environment – Divulgação / ABr
Laura Gelbert Delgado, da ONU News em Nova Iorque.
A ONU Meio Ambiente lançou nesta quinta-feira uma iniciativa global para eliminar grandes fontes de lixo marinho até 2022: microplásticos em cosméticos e o desperdício e uso excessivo de plásticos descartáveis.
A campanha #CleanSeas, ou mares limpos, lançada na Cúpula Mundial dos Oceanos, em Bali, está pedindo a governos que aprovem políticas de redução do material.
Danos irreversíveis
A ação também é voltada à indústria, para que minimize embalagens plásticas e redesenhe produtos. A campanha pede ainda a consumidores que mudem seus hábitos de produção de lixo antes que eles causem “danos irreversíveis” aos mares.
Segundo a ONU Meio Ambiente, mais de 8 milhões de toneladas de plástico acabam nos oceanos, causando grande prejuízo a animais marinhos, à pesca e ao turismo, custando pelo menos US$ 8 bilhões em danos aos ecossistemas marinhos.
A agência alerta que até 80% de todo o lixo nos oceanos é feito de plástico. De acordo com algumas estimativas, no ritmo em que itens como garrafas, sacolas e copos de plástico estão sendo jogados fora após terem sido usados apenas uma vez, até 2050, os oceanos terão mais plástico do que peixe.
A agência da ONU calcula que neste prazo, 99% das aves marinhas terão ingerido plástico.
Medidas ambiciosas
Durante este ano, a campanha #CleanSeas anunciará “medidas ambiciosas” por países e empresas para eliminar microplásticos de produtos de cuidado pessoal, banir ou colocar impostos sobre sacolas descartáveis e reduzir “dramaticamente” outros produtos de plástico de uso único.
Dez países já se uniram à campanha para reverter o uso do produto, incluindo o Uruguai que irá taxar sacolas plásticas descartáveis neste ano.
O músico Jack Johnson e o ator Adrian Grenier apoiam a campanha. Segundo a ONU Meio Ambiente, “grandes anúncios” são esperados para a Assembleia Ambiental da ONU, em dezembro no Quênia, e Conferência dos Oceanos, em junho, em Nova Iorque.
Um encontro preparatório para a Conferência foi realizado em 15 e 16 de fevereiro, na sede das Nações Unidas, em Nova Iorque.
Na ocasião, o embaixador de Portugal junto à organização, Álvaro Mendonça e Moura, que foi um dos organizadores do evento, conversou com a ONU News e fez um alerta sobre a situação da poluição com plásticos nos mares e oceanos.

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 24/02/2017

CULTIVAR E GUARDAR A CRIAÇÃO (GÊNESIS 2,15).

11º Mandamento, artigo de Roberto Malvezzi (Gogó)

artigo de opinião

[EcoDebate] A Quaresma continua a mesma e, com as Campanhas da Fraternidade, cada vez melhor. É um tempo que rememora os 40 anos do povo de Israel no deserto, ou 40 dias de Jesus no deserto, ou 40 dias que a Igreja delimitou como anteriores à celebração da Páscoa. Os sinais de “conversão”, no sentido de “rasgar os corações e não as vestes”, são o jejum, a oração e a esmola. Mas, o que importa é a conversão permanente.
Entretanto, ao trazer o tema da CF relacionando a fraternidade com o cuidado dos biomas brasileiros, a Igreja fala aos católicos, às outras Igrejas e a todo povo brasileiro. Agora nossa conversão adquire uma terceira dimensão. Se antes era um período de conversão a Deus e aos irmãos, agora inclui o 11º mandamento: cultivar e guardar a criação (Gênesis 2,15).
Bioma vem do grego. Bio é vida. Oma é conjunto, estrutura, etc. Portanto, bioma é um conjunto de vidas que ocupam um determinado espaço, sob um mesmo clima, um solo semelhantes e um relevo semelhante. Dai nossos 6 biomas oficiais: Amazônia, Caatinga, Cerrado, Mata Atlântica, Pantanal e Pampa. Para os movimentos sociais os povos que ocupam esses espaços são parte integrante dos biomas.
Para alguns cientistas a zona costeira dos manguezais e restingas deveria ser um bioma especial. Para outros ainda, a zona marinha deveria ser outro bioma. Para Aziz Ab’Saber deveríamos falar em “domínios morfoclimáticos”, incluindo o domínio das araucárias. Porém, oficialmente estamos definidos como 6 biomas.
Dessa biota – conjunto de todas as vidas – dependemos para comer, beber, produzir fármacos, essências, ter um clima ameno, e tantos outros serviços ambientais. Lembrando Francisco, tudo está interligado, vivemos numa fraternidade universal, cada criatura tem sua mensagem e precisamos entendê-las e respeitá-las.
Francisco nos mostra que precisamos de uma conversão ecológica. A Quaresma é um tempo propício. Que saibamos usufruir esse período numa verdadeira conversão ecológica, que exige o reconhecimento e agradecimento ao Criador por tudo que Ele nos deu, a gratidão aos irmãos e irmãs que fazem de sua vida um gesto de cuidado e à toda a criação pela abundância de bens – tão maltratados – que ela nos oferece.
Roberto Malvezzi (Gogó), Articulista do Portal EcoDebate, possui formação em Filosofia, Teologia e Estudos Sociais. Atua na Equipe CPP/CPT do São Francisco.
www.robertomalvezzi.com.br

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 23/02/2017

terça-feira, 21 de fevereiro de 2017

AQUECIMENTO GLOBAL E A AÇÃO DOS FURACÕES.

Nunca uma espécie que habita a face da Terra mudou, de forma tão radical e global, as condições no planeta quanto nós, seres humanos. Elevamos a temperatura e acrescentamos a rios, lagos e oceanos substâncias e sedimentos que não existiam. Somos comparáveis a uma “força tectônica”, como a que modificou a estrutura da Terra pouquíssimas vezes em bilhões de anos, a ponto de pesquisadores estarem propondo mudar o nome da época geológica atual: sairíamos do Holoceno, inaugurada com o fim da era glacial, e ingressaríamos no Antropoceno, a “época dos humanos”.
A entrevista é de Rodrigo Lopes, publicada por Zero Hora, 18-02-2017.
A proposta, do holandês Paul Crutzen, Nobel de Química em 1995, é defendida por Carlos Afonso Nobre, um dos principais cientistas brasileiros, doutor em meteorologia pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT), ex-presidente da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e curador do Museu do Amanhã. O prédio impressionante no Rio, quase flutuando sobre a Baía da Guanabara e assinado pelo arquiteto espanhol Santiago Calatrava, põe o dedo em nossa consciência: que mundo deixaremos para nossos filhos, qual nosso papel na mudança no ambiente? Entre as alterações provocadas pelo homem está a elevação da temperatura do planeta:
– Estamos condenando populações que vivem em ilhas oceânicas a mudarem de lugar. Se (o aumento da temperatura do planeta) passar de 4ºC, cidades que conhecemos há séculos e milênios, na Europa e na Ásia, e mesmo as mais jovens das AméricasRio de JaneiroNova York, deixarão de existir – afirma Nobre, nesta entrevista.
O cientista pesquisa os gases que provocam o efeito estufa desde os anos 1980. Climatologista, Nobre é o único brasileiro no grupo de trabalho que estuda, junto à comunidade científica mundial, a formalização da época do Antropoceno. Na entrevista a seguir, ele fala sobre os efeitos da ação do homem na Terra; o ceticismo de parte dos pesquisadores, em sua opinião, potencializado pela indústria de combustíveis fósseis; a luta contra o aquecimento global em tempos de Donald Trump na Casa Branca – os EUA são, junto com a China, um dos maiores poluidores mundiais – e sobre investimentos em ciência no Brasil.
Eis a entrevista.
A ideia do antropoceno defende que o ser humano alterou tanto as condições atmosféricas e ambientais do planeta Terra que estamos vivendo em uma nova época geológica. Qual o tamanho do estrago?
Nenhuma espécie desde que existe vida aqui – a primeira delas as cianobactérias nos oceanos, há 3 bilhões de anos – conseguiu transformar o ambiente, de forma global, em tão pouco tempo. Isso fez com que o professor Paul Crutzen, um dos ganhadores do Prêmio Nobel de Química em 1995, propusesse que somos a causa do surgimento de outra época geológica. Estamos há 12 mil anos em uma era que os geólogos chamaram de Holoceno, em que o clima relativamente ficou estável. Desde que existe o Homo sapiens, esses foram os 12 mil anos mais estáveis. Isso fez com que, pela primeira vez, os humanos pudessem estabelecer assentamentos. Antes, eram nômades. Com isso, houve o desenvolvimento da agricultura e das civilizações. Os geólogos dão nomes para as eras em cima da característica dos sedimentos, o material biológico carregado pelos rios, depositado no fundo de oceanos e lagos. Eles começam a ver certas características biológicas fósseis nesses sedimentos e, com base nisso, concluem: “Durante essa época aqui os sedimentos foram dessa natureza, essas espécies existiam centenas de milhões de anos atrás nesse registro fóssil, já nessa camada de sedimentos, deixaram de existir”.
E o que podemos esperar dessa nova era? Episódios climáticos extremos?
Se uma civilização futura olhar para esses sedimentos, irá ver que, de uns 200 anos para cá, são totalmente diferentes em todos os aspectos. Vamos supor que a espécie humana desapareça e algum disco voador, outra espécie, comece a fazer a reconstrução do tempo, daqui a alguns bilhões de anos. Eles falariam: “Nessa época aqui, alguma coisa diferente estava acontecendo nesse planeta...” Vão começar a olhar os registros: “Olha, tem uns negócios aqui...” Vão fazer a análise química e ver que é plástico. Isso nunca existiu antes. Vão ver também que há uns isótopos radioativos do carbono 14 que não existiam antes. É o resultado dos isótopos radioativos introduzidos pelo homem com as explosões nos testes nucleares, nos anos 1940, 1950, 1960. Foram banidos depois, mas deixaram rastros. Essa modificação foi chamada antropoceno: “ceno”, época em grego, porque é a época do homem, do “antropo”. Esse conceito ficou muito poderoso. A sociedade mundial de geólogos criou um grupo de trabalho e está para normatizar que estamos em uma outra época geológica. Isso deve ocorrer em uma reunião daqui a três anos. Há uma discussão metodológica, se começou em 1945, quando tem uma marca muito poderosa, o começo dos testes nucleares, ou se foi quando começou a aparecer o plástico. Nós nos tornamos uma força tectônica equivalente às forças geológicas que causaram grandes mudanças de épocas e eras geológicas, como o vulcanismo, os movimentos das placas tectônicas, os terremotos e as grandes extinções de espécie.
O senhor afirmou em uma entrevista para a emissora alemã Deutsche Welle que esses eventos extremos chegaram mais rápido do que o esperado. Chegamos a um ponto em que não adianta mais reduzir o aquecimento global?
O ponto de retorno seria na geração dos meus pais, nas décadas de 1960, 1970. Se essa geração tivesse tido a consciência que nossa geração tem hoje, dava praticamente para não afetar muito. Se diminuíssem as emissões (de gases poluidores) ou se escolhessem outro modo de desenvolvimento, o impacto no ambiente seria pequeno, e o planeta voltaria a seu estado anterior. Já passamos desse ponto. A Convenção do Clima (das Nações Unidas) exige esforço gigantesco para que o aumento da temperatura do planeta fique abaixo de 2ºC. Já temos 1ºC. E o ponto de não retorno a 1,5ºC é certo que já atingimos, porque com a quantidade de gases do efeito estufa que lançamos, só o que está na atmosfera garante isso. Hipoteticamente, se parássemos de emitir hoje, a temperatura subiria a 1,5ºC. Não dá para diminuir abaixo disso. E todos os esforços que o acordo de Paris clama são para não deixar passar de 2ºC, porque haveria consequências catastróficas. As geleiras da Groenlândia e da Antártica ocidental derreteriam. Isso significa o aumento do nível do mar de 10 a 15 metros em mil a 2 mil anos. Pode parecer distante, mas acontecerá. Então, em 500 anos, podemos ter entre três a quatro metros de aumento no nível do mar. Com isso, você está condenando populações de ilhas oceânicas a se mudarem. Os países-ilha deixarão de existir. E vão ter de ser reacomodados. Isso é para 2ºC. Se passar de 4ºC, o aumento do nível do mar pode chegar a 15 metros. Isso significa a zona costeira mudar totalmente, e cidades que conhecemos há séculos e milênios, na Europa e na Ásia, e mesmo as mais jovens das Américas, como Rio de JaneiroNova York, deixarem de existir como as conhecemos. A Holanda, nesse cenário, deixa de existir. Será oceano. Vietnã, 80% será oceano. É quase como criar Atlântida (o lendário continente submerso): as pessoas vão fazer viagens submarinas para ver o que foi um dia Nova York, a zona sul do Rio. Se as mudanças climáticas continuarem, mesmo com 2ºC, estima-se que desaparecerão da face da Terra entre 10% a 15% de todas as espécies. Cerca de 95% dos recifes de corais desaparecerão dos oceanos tropicais. Isso é o que dá o sentido de urgência. O aumento de 1,5ºC não dá para recuperar. O de 2ºC, teríamos que reduzir as emissões praticamente a zero até 2050 e depois estabilizar em zero até o final do século. No século 22, teríamos de passar a ter emissões negativas, ou seja, retirar gás carbônico da atmosfera. Mas isso é teórico, estamos longe disso. Na prática, estamos aumentando emissões.
A que o senhor atribui que tantos não acreditem no aquecimento global?
Raramente há um assunto científico em que exista tanto consenso quanto o aquecimento global. O percentual de cientistas que não têm dúvidas de que é a ação humana que causa o aumento da temperatura, com graves consequências, passa de 98,5%. Isso é raríssimo em qualquer área da ciência. Na medicina os consensos são muito menores. Por exemplo: o vírus da zika causa má-formação cerebral em fetos. Quantos cientistas da área médica endossam essa tese? Não passa de 70%. A OMS (Organização Mundial da Saúde) fez um alerta máximo, todo mundo está preocupado, mulheres evitam engravidar em regiões com a epidemia, isso inclusive vai ter efeito demográfico nessas cidades. A proteção do clima global exige criar uma economia sem combustíveis fósseis, e os interesses econômicos afetados são muito grandes. A indústria fóssil responde por quase 20% do PIB mundial. É poderosíssima, e mesmo que dure só mais 20 anos, quer sobreviver e vender petróleo, carvão e gás natural e ganhar dinheiro.
Mas ainda há ceticismo de parte da comunidade científica.
É uma coisa extremamente confinada aos EUA. Não se ouve mais falar em cientistas céticos (com relação ao aquecimento global) na Europa, na América Latina, na Ásia. Esse 1,5% se divide em várias categorias: há uma fração que não acredita que os gases estão aquecendo o planeta. Tem quem diga até que o planeta não está aquecendo; outros dizem que, sim, o planeta está aquecendo, mas o gás carbônico aumenta na atmosfera por causas naturais, fissuras, erupções vulcânicas e não pela queima de combustíveis fósseis. Isso já foi descartado porque, com estudos que analisam as moléculas de gás carbônico na atmosfera, se consegue ver pela fração isotópica o carbono 13, produzido pela queima de carvão, diferente do que tem na atmosfera e do que tem embaixo da terra; e há um terceiro grupo que diz que o gás carbônico aquece o planeta, só que as projeções estão exageradas. Esse consenso (sobre o aquecimento global) é quase como a lei de gravitação de Newton. Até o consenso científico sobre a teoria da relatividade geral de Einstein é menor.
Donald Trump já disse que o aquecimento global é “uma bobagem”. Que consequências vê com ele na presidência dos EUA?
Lógico que otimistas não estamos. Mas ele ainda não deu uma resposta completa. Falou no começo da campanha que era besteira. Depois, disse: “É, tem alguma coisa aí, parece que tem”. Mas a pessoa que ele colocou na Agência Ambiental dos EUA (Scott Pruitt) é representante da indústria de carvão, já processou inclusive essa agência... Ele colocou como secretário de Estado um ex-presidente da maior empresa petrolífera do mundo, a Exxon Mobil (Rex Tillerson, ex-CEO da empresa). Ele tem colocado no governo pessoas que, no passado, ou eram da indústria fóssil ou já defenderam o carvão. Não dá para ser otimista. Por outro lado, as pessoas dizem que o processo de tirar os EUA do Acordo de Paris, diplomaticamente falando, não só traria enorme desprestígio como seria algo lento, uma negociação internacional, que 95 países firmaram. Não é uma coisa que Trump, sentado na cadeira, simplesmente declara: “Não quero mais”.
Tivemos, em 2004, o primeiro furacão no litoral brasileiro, o Catarina, no Sul. No Sudeste, de tempos em tempos há enchentes. O que disso tudo se pode atribuir às mudanças climáticas e o que são fenômenos que ocorreriam independentemente delas?
O furacão Catarina foi atípico, não havia registro e as condições atmosféricas e oceânicas não são propícias para a formação de furacões no Atlântico Sul. Não foi relacionado com o aquecimento global. Aconteceu, era mesmo furacão, terminou sua “vida” como furacão de intensidade 1, a mais fraca, mas causou bastantes danos na divisa entre RS e SC. O mais provável com o aquecimento global não é o surgimento de coisas que nunca aconteceram. É a mudança no número de vezes que acontecem coisas que conhecemos. Por exemplo: furacões. O número de furacões é de 80 a 90 por ano. Com o aquecimento global, os furacões de categoria 4 e 5, como o Katrina (em 2005, em Nova Orleans, nos Estados Unidos), que representam no máximo 15% desses 90, vão subir para 25%. Um quarto dos furacões que acontecem no mundo será devastador. Os fenômenos extremos se tornam mais frequentes e quase sempre mais intensos. O que já acontece no sul do Brasil. Chuva acima de 50mm em 24 horas. Antes, um fenômeno desses em certa localidade acontecia uma vez a cada cinco anos. Agora, ocorre todo ano duas vezes. Vamos diferenciar: a origem de um evento extremo pode ser dentro da variabilidade natural, como a seca no NordesteLa Niña e El Niño, mas o impacto hoje normalmente é maior por causa do aquecimento global.
Nos EUA, institutos conseguem antecipar a chegada de um furacão a tempo de as autoridades organizarem a evacuação de populações nas áreas que serão atingidas. Por que no Brasil não temos o grau de precisão e antecipação da previsão meteorológica?
A previsão do tempo no Brasil é muito boa. Se você olhar na TV, nos jornais, não ficamos muito a dever à previsão em outros países. Hoje em dia, os modelos matemáticos de previsão são globais. É possível entrar no Centro Americano de Meteorologia e pegar a previsão para todo o globo. O Brasil também tem aqui no Inpe, fui eu que implementei esse projeto de modernização a partir de 1991. Como cidadão, olho as previsões e estou muito satisfeito. Ninguém faz previsões com mais do que alguns dias, uma semana é o limite máximo. Passando disso, em nenhum lugar do mundo se faz previsão com qualidade. Se quero saber se posso fazer um evento fora de casa daqui a três meses, não dá. Agora, se você me perguntar: “O La Niña, que está acontecendo agora no Oceano Pacífico, vai causar uma seca no Rio Grande do Sul?” Sobre esse tipo de previsão estamos no mesmo nível de países desenvolvidos.
O Museu do Amanhã, no Rio, do qual o senhor é curador, é um exemplo de valorização da ciência. Mas é uma exceção. Como é fazer ciência em um país cuja educação não é prioridade?
Brasil avançou muito cientificamente. Houve uma preocupação em aumentar os financiamentos para pesquisa, que cresceram nas últimas décadas em relação a 30 anos atrás. O Brasil em 2015 formou 18 mil doutores, eu estava na Capes à época. Isso tem muito a ver com o aumento dos financiamentos para a pós-graduação brasileira. Cresceu demais a pós-graduação brasileira, com mais de 4 mil programas em todo o Brasil. Melhoramos muito a qualidade da nossa ciência, hoje somos produtores de conhecimento respeitados internacionalmente, somos o 13º país em número de artigos científicos publicados no mundo. Tudo isso graças a investimentos que foram feitos tanto em nível federal, principalmente através das agências federais, CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) e Finep (Financiadora de Estudos e Projetos) e também das agências estaduais de financiamento, as FAPs (Fundações de Amparo à Pesquisa). Tivemos muito sucesso nisso e, lógico, depende de financiamentos públicos.
Como a ciência no Brasil será afetada a médio prazo pelos cortes no financiamento de pesquisas impostos pela crise financeira?
Essa crise demostrou que, na hora de efetuar cortes orçamentários no mais alto nível de governo, a ciência não teve valorização. Enquanto na crise de 2008 países que passaram por recessões mais ou menos profundas preservaram os investimentos em ciência e desenvolvimento tecnológico como pontes para o futuro, cortando outras coisas, o Brasil cortou pesadamente os orçamentos das agências de financiamentos, todas. A gente viu que, nos altos escalões dos tomadores de decisões governamentais, a ciência não é uma área que tem o mesmo grau de (valorização) da educação e da saúde. Ciência está relacionada com educação e é estratégico. O CNPq teve corte de 50% em três anos. Torço para que o Brasil volte a ter um ciclo de crescimento econômico e, quem sabe, com menos corrupção. Que comece a olhar com mais atenção não só educação e saúde, que não tem nem o que discutir, mas também para a ciência, que é o futuro. Se o Brasil diminuir investimentos em ciência e formação de pesquisadores, em pesquisa universitária, corremos o risco de um enorme retrocesso. É uma questão que a sociedade como um todo tem de valorizar.
Fonte : Instituto Humanitas Unisinos

EMPRESA BELGA IMPLANTA CHIPS EM SEUS FUNCIONÁRIOS.

dispositivo, similar àquele que é utilizado para identificar animais de estimação, consiste em uma cápsula de cristal pouco maior que um grão de arroz, equipada com tecnologia de identificação por radiofrequência (RFDI) e uma memória de 868 bytes.

A reportagem é de Javier Albisu e publicada por Sin Embargo, 18-02-2017. A tradução é de André Langer.

Implantar um microchip de identificação sob a pele é, para alguns, o passo seguinte natural para a “internet das coisas” e uma porta para um futuro em que a tecnologia estará a serviço do ser humano, incorporada diretamente em seu corpo.

Para outros, o fato de que uma empresa proponha aos seus funcionários que enxerte em seu organismo uma “cápsula” para abrir portas ou acessar o computador supõe uma perda de liberdade e privacidade em uma corrida rumo a uma sociedade em que a tecnologia, a serviço de governos e empresas, sirva para controlar os cidadãos.

“Não somos o Grande Irmão e não podemos rastrear os nossos empregados com o chip (...) É apenas uma maneira mais fácil de abrir as portas ou acessar o computador. É completamente voluntário”, explica à Efe Tim Pauwels, sócio-diretor da NewFusion, uma empresa belga de software especializada em marketing digital que implantou um chip em vários de seus funcionários.

O dispositivo, similar àquele que é utilizado para identificar animais de estimação, consiste em uma cápsula de cristal pouco maior que um grão de arroz, equipada com tecnologia de identificação por radiofrequência (RFDI) e uma memória de 868 bytes.

A tecnologia RDFI pode ser ativa, quando emite sinais rastreáveis e cuja aplicação é comum em armazéns industriais ou na pecuária, ou passiva, como essa que a NewFusion implantou em dezembro em sete dos seus 12 trabalhadores.

No caso dos seres humanos, o chip é inserido na mão, entre o dedo índice e o polegar, e funciona como um registro cujo número de série pode ser mudado a partir de uma aplicação do telefone celular. Não contém nenhum dado do usuário e não emite sinais que permitem sua localização, mas substitui os cartões pessoais comuns em muitas companhias.

“Aqueles que não querem o chip podem utilizar o cartão. Alguns dos nossos empregados, especialmente as mulheres, usam um anel ou um bracelete com a mesma tecnologia”, comenta Pauwels.

O chip pode ser adquirido na China a 20 centavos de euro a unidade, mas os chips escolhidos pela NewFusion são fabricados nos Estados Unidos, custam 100 euros e vêm com um kit de instalação esterilizado.

Os chips são implantados por um tatuador com uma seringa do mesmo calibre que aquelas utilizadas para doação de sangue. Sente-se a picada, mas, em seguida, a dor desaparece e fica uma pequena marca na pele, embora em alguns casos se possa distinguir o implante em forma de pequena protuberância.

“Você não pode rastrear ninguém, porque não contém GPS nem outro sistema de geolocalização” e “um profissional pode retirá-lo ou substituí-lo facilmente”, destaca o fundador da NewFusionVincent Nys, que considera “uma ingenuidade pensar que a nossa localização e a nossa privacidade são seguras”.

“Se você caminha pelas ruas de Londres, você pode ser rastreado o tempo todo através das câmaras de segurança. O mesmo pode acontecer com o telefone... Deveria abrir-se um debate sobre qual informação você aceita compartilhar com o mundo e qual não, em vez de governos ou grandes organizações como o Facebook ou o Google decidirem o que fazer com os seus dados”, acrescenta Nys.

A ideia nessa empresa belga de Malinas, situada entre Bruxelas e Antuérpia e com um plantel jovem e uma cultura aberta à inovação, surgiu “dos funcionários que perdiam o cartão para abrir a porta”.

A companhia já utilizava esse tipo de tecnologia sem fio em alguns dos produtos que seus trabalhadores projetavam e pareceu-lhes “natural” aplicá-los em seus próprios escritórios. E, de passagem, beneficiar-se com o impacto midiático da manobra.

O empresário indica outras potenciais aplicações destes chips, como substituir os passaportes, os cartões de banco e cartões de transporte ou incluir informações médicas para saber o tipo sanguíneo de um ferido que ficou inconsciente e que deve ser atendido urgentemente, ou se é alérgico a algum medicamento.

Pode-se, inclusive, imaginar um futuro com implantes mais avançados que meçam parâmetros médicos em tempo real, como o açúcar no sangue de um diabético ou a pressão arterial em alguém com problemas cardiovasculares.

“Talvez, com o tempo, possa ser muito útil, mas com as aplicações que tem hoje... não me convence. Não tenho em casa nada que funcione com essa tecnologia e para o trabalho prefiro continuar a utilizar meu cartão para abrir as portas”, explica Tom, um dos funcionários da NewFusion que não aceitou implantar o chip.

Fonte : Instituto Humanitas Unisinos

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

RESPOSTA DA ATIVIDADE REFERENTE AO MAPA : 02/16

 1 - Rússia                 6 - Turcomenistão   11 - Moldávia
 2-  Cazaquistão       7 - Azerbaijão           12 - Bielorússia                                                                        
 3 - Quirguistão        8 - Armênia               13 - Lituânia 
 4 - Tadjiquistão       9 - Geórgia                14 - Letônia
 5 - Uzbequistão      10 - Ucrânia               15 - Estônia

sábado, 18 de fevereiro de 2017

PRODUÇÃO E A CONSERVAÇÃO FLORESTAL

Reduzir unidades de conservação e desproteger 1 milhão de hectares não é bom para o agronegócio

desmatamento
Por André Guimarães e Paulo Moutinho*
Parlamentares do Amazonas e seus convivas que desejam reduzir unidades de conservação criadas no ano passado na Amazônia impõem um risco considerável a um setor da economia que tanto defendem: o agronegócio.
Eles pleiteiam que mais de 1 milhão de hectares sejam “desprotegidos”, pois atrapalhariam interesses econômicos, e o fazem de forma temerosa. Antes, deveriam escutar a ciência.
A preservação florestal tem um papel fundamental no equilíbrio do clima amazônico. E, como todo bom homem do campo sabe, um clima ruim inviabiliza qualquer negócio.
Estudos recentes do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) e instituições parceiras mostram que, sem floresta, determinadas áreas da Amazônia podem esquentar demais. Na região do Parque Indígena do Xingu, em Mato Grosso, por exemplo, a temperatura aumentou entre 2000 e 2010 quase 0,5 grau célsius. Pode parecer pouco à primeira vista, mas é suficiente para bagunçar padrões regionais de chuva, por exemplo.
Além disso, a temperatura das áreas desmatadas ao redor do parque é até 6 graus célsius mais alta do que a temperatura em seu interior. Isso mostra que, sem a floresta, o clima seria tão quente que a produção poderia ser inviabilizada.
O resumo é: sem floresta, a produção agrícola lucrativa se esvai. Por isso, essa pseudo disputa entre produção e conservação florestal que alguns atores ruralistas brasileiros insistem em travar está velha. Nem a ciência, nem os mercados internacionais de commodities, nem os consumidores, nem atores mais modernos do setor agrícola a aceitam mais.
A criação e a manutenção de áreas protegidas na Amazônia são um excelente negócio para a agricultura ao garantir um regador constante para lavouras. Ao mesmo tempo, ajudam a controlar as mudanças climáticas e preservam a biodiversidade, dois ativos no atual debate econômico mundial, além de ordenar o uso do solo em áreas em que o desmatamento tende a crescer, como os locais previstos para a construção de grandes obras de infraestrutura.
Sempre que surgem pleitos internos para reduzir a proteção de unidades de conservação e terras indígenas, com eles vem a dúvida de quem ganharia com isso. A população brasileira e o agronegócio responsável, certamente não. Pois, como o próprio setor reconhece, há área aberta suficiente para a produção crescer.
O próprio governo federal tem vendido o Brasil, especialmente em foros internacionais, como o país que produz alimentos com respeito à natureza. O agro brasileiro, pelo menos lá fora, é pop e verde. Ao mesmo tempo, dá espaço internamente para quem ainda vê floresta como problema em vez de solução.
É hora então de o governo mostrar se o discurso feito no exterior é verdadeiro ou se apenas tenta parecer mais moderno do que é de fato. Porque ainda que haja diferenças entre o moderno agronegócio brasileiro e o outro, retrógrado, o governo não pode pactuar com uma posição esquizofrênica que não traz nada de substancioso para o crescimento do país.
* André Guimarães, agrônomo, é diretor-executivo do IPAM, e Paulo Moutinho, biólogo, é pesquisador sênior. Esse artigo foi originalmente publicado no Blog do Planeta, da Revista Época.

Do IPAM, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 17/02/2017

ANTÁRTICA E O DEGELO ACELERADO.

O colapso do gelo da Antártica e o aumento do nível do mar, artigo de José Eustáquio Diniz Alves

larsen c ice shelf
[EcoDebate] A Antártica, depois de um período de ligeiro ganho na área de gelo, está entrando em fase de degelo acelerado. Uma das constatações é que uma imensa rachadura na plataforma de gelo Larsen C cresceu profundamente em dezembro de 2016 e falta pouco para que um imenso bloco de 5 mil km² (equivalente a área do País de Gales ou da Região Metropolitana do Rio de Janeiro) se desprenda da plataforma Larsen C.
A plataforma tem espessura de 350 metros e está localizada na ponta oeste da Antártida. Pode acontecer o mesmo que já aconteceu com o colapso das plataformas de gelo Larsen A, em 1995, e Larsen B, em 2002. Novas rupturas na plataforma podem provocar que outras geleiras se desprendam em direção ao oceano. Uma vez que esse gelo não seria flutuante, o nível dos mares seria afetado. Segundo estimativas, se todo o gelo da Plataforma Larsen C derreter, o nível global dos mares aumentaria cerca de 10 cm.
O gráfico abaixo (da NSIDC) mostra que, do ponto de vista do gelo marinho, houve expansão de área ao redor da Antártica entre 1979 e 2014. A tendência ao longo de 35 anos foi de uma lenta expansão, da ordem de 0,9% por década. Muitos “céticos climáticos” utilizavam estes dados para questionar o aquecimento global e o processo de desglaciação do mundo. Contudo, o degelo avançou em 2015 e atingiu o maior nível em 2016. Nunca a Antártica perdeu tanto gelo como no ano passado. E o pior é que a desestabilização continua em 2017.
southern hemisphere extent anomalies dec1978-2016
O gráfico abaixo mostra a variação da extensão do gelo da Antártica nos primeiros 34 dias dos diversos anos desde 1979 e a média do período 1981 a 2010 (com o desvio padrão). Nota-se que a extensão de gelo em 2011 teve um declínio acentuado, mas houve recuperação nos anos de 2014 e 2015, que ficaram acima da média de 1981-2010. O ano de 2016 voltou a ter comportamento parecido com 2011, batendo os recordes de degelo. Mas o mais grave e preocupante está acontecendo nos primeiros 34 dias de 2017, que mostra perdas acentuadas e totalmente distante das tendências dos últimos 37 anos. Parece que a desestabilização do gelo chegou para valer e a Antártica parece entrar no mesmo nível de desglaciação do Ártico.
global ice
O gráfico seguinte mostra claramente a redução do volume de gelo nos dois hemisférios. Existe uma tendência de longo prazo do degelo que pode ser vista pelas curvas anuais cada vez mais baixas. Mas a queda observada a partir de setembro de 2016 é um fato sem precedentes e mostra que o processo de desglaciação está se acelerando perigosamente. No passado, foi o Ártico e a Groenlândia (hemisfério Norte) que lideraram o derretimento, a partir do segundo semestre do ano passado a Antártica passou a ser o grande destaque para o processo de desglaciação e a elevação do nível dos oceanos.
giomas monthli gobal ice volume
O jornal New York Times (07/02/2017) atualizou a situação do eminente colapso do grande pedaço da Plataforma Larsen C. Em apenas dois meses, a rachadura aumentou 17 milhas. Faltam apenas 20 milhas para que o gigante iceberg se desprenda da Plataforma. Ou seja, até abril ou maio de 2017 pode ocorrer o colapso deste grande pedaço da Larsen C, mostrando a dramaticidade do processo de degelo da Antártica.

Plataforma Larsen C
No total, o degelo do Ártico, da Groenlândia e da Antártica pode fazer os oceanos subirem mais de 70 metros. Evidentemente, isto não vai acontecer no espaço do atual milênio. Mas somente 10% de degelo destas áreas pode fazer o nível dos mares subir 7 metros. Ou 5% de degelo pode elevar o nível do mar em 3,5 metros. Isto seria catastrófico para a dinâmica econômica e social e poderia aumentar a pobreza e os conflitos sociais, provocando o colapso da civilização. 
Plataforma Larsen C
Artigo de Robert M. DeConto e David Pollard, publicado na revista Nature (31/03/2016) mostra que no último período interglacial (130.000 a 115.000 anos atrás), com temperaturas pouco acima das atuais, a média global de aumento do nível do mar (GMSLR) foi de 6 a 9 metros. Os autores mostram que, se as emissões de GEE continuarem no nível atual, somente a Antártica tem o potencial de contribuir com mais de um metro de elevação do nível do mar até 2100 e mais de 15 metros até 2500. Assim, no pior cenário de emissões de gases de efeito estufa, o nível médio do mar subiria cerca de 2 metros até o fim do século, extinguindo nações insulares e gerando grande quantidade de refugiados do clima em cidades como Rio de Janeiro, Londres, Miami, Xangai, Mumbai, etc.
Os filmes “Earth Under Water” e “Before the Flood” (ver links abaixo) explicam e ilustram as consequências dramáticas da elevação do nível do mar. A bomba relógio climática está armada. Quando e qual o tamanho da explosão que vai atingir toda a população mundial, dependerá da vontade e da capacidade da humanidade em reverter, deter e minimizar o tamanho do desastre.
Referências:
Leonardo DiCaprio. Before the Flood (PT), National Geography, 31 de out de 2016
https://www.youtube.com/watch?v=aV9w_chyuf4
Jugal Patel. A Crack in an Antarctic Ice Shelf Grew 17 Miles in the Last Two Months, NYT, 07/02/2017
https://www.nytimes.com/interactive/2017/02/07/science/earth/antarctic-crack.html?_r=0
Robert M. DeConto & David Pollard. Contribution of Antarctica to past and future sea-level rise, Nature, 531, 591–597 (31 March 2016) doi:10.1038/nature17145
http://www.nature.com/nature/journal/v531/n7596/full/nature17145.html
NASA Earth Observatory. Antarctica’s sea ice is melting to its lowest levels in recorded history, 16/12/2016
http://www.businessinsider.com/climate-change-melting-south-polar-sea-ice-2016-12
Matt McGrath. Iceberg gigante ameaça se desprender da Antártida e gera preocupação, BBC, 06/01/2017
http://www.bbc.com/portuguese/internacional-38528532
NSIDC – National Snow & Ice Data Center
https://nsidc.org/data/seaice_index/

José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 17/02/2017