Aumento do nível do mar deve afetar mais de 1 milhão de brasileiros em 2030 .

 aumento médio do nível do mar

Inundações costeiras por consequência das mudanças climáticas devem impactar quase 100 milhões de pessoas no mundo até o fim do século, aponta novo estudo. Aumento do nível do mar deve afetar 1,3 milhão de brasileiros em 2030.

O aumento do nível do mar por consequência das mudanças climáticas deverá, até o final deste século, colocar em risco de inundações terras que hoje abrigam quase 100 milhões de pessoas no mundo. No Brasil, 2,1 milhões de pessoas serão afetadas por alagamentos anuais nas regiões costeiras até 2100, aponta estudo da organização independente de cientistas Climate Central.

relatório Estado do Clima Global 2023, da Organização Meteorológica Mundial (OMM), lançado em março deste ano apontou que 2023 foi o ano mais quente já registrado e que o nível médio do mar global atingiu um nível recorde na série de dados de satélite (desde 1993), refletindo o contínuo aquecimento dos oceanos bem como o derretimento de geleiras e calotas de gelo.

Segundo dados analisados pela OMM, a taxa de aumento médio do nível do mar global nos últimos dez anos (2014-2023) é mais que o dobro da taxa de aumento do nível do mar na primeira década do registro por satélite (1993-2002). O aquecimento do planeta e consequentemente dos oceanos são efeito das emissões de gases de efeito estufa, sendo a queima dos combustíveis fósseis a principal responsável pelo aumento desses gases na atmosfera.

À medida que os mares sobem, as terras que antes estavam seguras passam a ficar sob risco de inundação, expondo os residentes a ameaças cada vez maiores.

Os novos dados analisados pelos pesquisadores da Climate Central mostram que, até 2100, as zonas de risco se estenderão mais alto e mais para o interior das regiões costeiras, em áreas onde 93 milhões de pessoas vivem atualmente.

No Brasil, a população na zona de risco de inundação costeira anual em 2030 deverá ser de 1.3 milhão de pessoas. Até 2100, esse número deverá aumentar 68%, com 2,1 milhões de pessoas convivendo com a ameaça de inundações anuais.

Ameaça global

Em alguns países, o risco de inundação costeira até o final do século aumentará drasticamente o número e a proporção de residentes potencialmente expostos a danos, perturbações e perdas durante tempestades.

A China, por exemplo, tem aproximadamente 52 milhões de pessoas vivendo na zona de risco onde se espera que as inundações costeiras ocorram pelo menos uma vez por ano, em média, até 2030. Esse risco se expande até 2100 para terras onde vivem atualmente mais 29 milhões de pessoas.

No Vietnã, onde 18 milhões de pessoas vivem na zona de risco em 2030, espera-se que a elevação dos mares até 2100 ameace as terras que hoje abrigam mais 7 milhões de pessoas. Se atingir esse ponto, a zona de risco anual de inundação cobrirá uma área onde hoje vive 30% da população do país.

O risco anual de inundação até 2100 se expandirá para terras onde vivem mais de 10 milhões de pessoas em Bangladesh, 8 milhões de pessoas na Índia, mais de 6 milhões de pessoas na Indonésia e 5 milhões no Japão. Essas mudanças forçarão grandes comunidades a se adaptarem a ameaças mais graves e mais frequentes de inundações costeiras.

As estimativas vêm da análise atualizada da Climate Central sobre elevações globais e projeções de risco de inundação costeira, com base no cenário mais recente de emissões médias a altas do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC), aplicada a dados populacionais para determinar o número de pessoas que vivem hoje em áreas que se espera que sofrerão mais inundações costeiras devido ao aumento do nível do mar.

A análise foi baseada em uma atualização extensa, de março de 2024, do CoastalDEM, o modelo de elevação digital orientado por IA da Climate Central. (O CoastalDEM é o conjunto de dados globais de menor erro de alturas de terras costeiras, conforme avaliado em relação a um conjunto de dados de referência global).

Climate Central é um grupo independente de cientistas e comunicadores que pesquisam e relatam fatos sobre o clima em mudança e como isso afeta a vida das pessoas.

 

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in EcoDebate, ISSN 2446-9394

Resíduos sólidos: 3 em cada 10 municípios ainda utilizam lixões .

 

Após 14 anos da promulgação da Política Nacional de Resíduos Sólidos, 31,9% dos municípios brasileiros ainda utilizam lixões como unidade de disposição final de resíduos sólidos

  • Em 2023, 31,9% dos municípios brasileiros ainda utilizam lixões como unidade de disposição final de resíduos sólidos, considerada a pior maneira de destinação final do resíduo. Em 28,6%, ela era feita em aterros sanitários enquanto aterros controlados eram utilizados em 18,7%.
  • De acordo com a Política Nacional de Resíduos Sólidos, os municípios com população superior a 50.001 habitantes deveriam implementar disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos e dar fim aos lixões até agosto de 2023. Entretanto, 21,5% desses municípios ainda contava com lixões como unidade de disposição final dos resíduos sólidos.
  • No Brasil, 3.364 (60,5%) dos municípios com algum serviço em manejo de resíduos sólidos tinham coleta seletiva, enquanto 56,7% implementaram instrumentos legais que tratam sobre coleta seletiva, indicando que há uma aproximação entre a legislação e a prática em pouco mais da metade dos municípios brasileiros.
  • Dos 5.557 municípios com serviço de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos, 4.093 (73,7%) indicaram presença de catadores informais. Já as entidades de catadores que atuaram na coleta seletiva estavam presentes em 1.498 (27,0%) municípios.
  • A existência de algum dispositivo de drenagem e manejo de águas pluviais foi informada em 5.348 (96,0%) municípios, em 2023. A Região Sudeste apresentou o maior percentual de municípios com o serviço (99,6%) e o Nordeste, o menor (89,3%).
  • No Brasil, 24,5% dos municípios informaram ter soluções baseadas na natureza como estratégias de drenagem sustentáveis, enquanto 57,5% não tinham e 18,0% não souberam informar.
  • A falta de incentivos financeiros/fiscais e/ou previsão orçamentária foi a maior dificuldade relatada para a implementação da drenagem sustentável, informada por 2.872 municípios.
  • Em 2023, 3.112 municípios (55,9%) informaram contar com Política Municipal de Saneamento Básico finalizada, número significativamente superior aos 2.126 (38,2%) com a mesma informação em 2017. Já 833 municipalidades (15,0%) declararam estar em processo de elaboração de sua respectiva Política. Em 2017, esses eram 1.342 (24,1%).

Após 14 anos da promulgação da Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei 12.305, de 02/08/2010), que em seu artigo 54 estabelece prazos para a implementação da disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos, 31,9% dos municípios brasileiros ainda utilizam lixões como unidade de disposição final de resíduos sólidos, considerada a forma menos adequada de destinação final do resíduo. Em 28,6%, a disposição final era feita em aterros sanitários, enquanto aterros controlados eram utilizados em 18,7%, sendo que um município pode possuir mais de uma forma de destinação de resíduos sólidos.

Entre as grandes regiões, os lixões ainda eram utilizados em 73,8% dos municípios na Região Norte, 51,6% no Nordeste, 52,9% no Centro-Oeste, 12,1% no Sudeste e 5,7% no Sul. Os dados são do Suplemento de Saneamento da Pesquisa de Informações Básicas Municipais (MUNIC) 2023 e foram divulgados hoje (28) pelo IBGE.

“O lixão e o aterro controlado são muito semelhantes, mas ambos se diferenciam do aterro sanitário. O lixão não possui nenhum tipo de controle, enquanto o aterro controlado, como o nome sugere, apresenta algum nível de gestão, porém sem garantir total adequação ambiental. Já o aterro sanitário foi construído para isso, portanto possui toda a estrutura necessária, como o tratamento do chorume, por exemplo”, explica a gerente da Pesquisa Nacional de Saneamento Básico, Fernanda Malta.

lixões em áreas alagadas ou alagáveis

O Art. 54 da Política Nacional de Resíduos Sólidos estabelece prazos para a implementação da disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos, ou seja, fim dos lixões:

• Até 2/08/2021, para capitais e municípios em Regiões Metropolitanas ou Regiões Integradas de Desenvolvimento – RIDE;

• Até 2/08/2022, para municípios com população superior a 100.000 habitantes ou que estão a menos de 20 km da fronteira com países limítrofes;

• Até 2/08/2023, para municípios com população entre 50.000 e 100.000 habitantes; e

• Até 2/08/2024, para municípios com população inferior a 50.000 habitantes

Levando em consideração o período da coleta da pesquisa (setembro de 2023 a março de 2024), os municípios com população superior a 50.001 habitantes deveriam implementar disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos e dar fim aos lixões. Entretanto, 21,5% desses municípios ainda contava com lixões como unidade de disposição final dos resíduos sólidos.

Entre as grandes regiões, a situação dos municípios com mais de 50.000 habitantes é distinta. Na Região Norte, 57,7% desses municípios contavam com lixão como unidade de disposição final dos resíduos sólidos. A proporção cai para 38,3% no Nordeste e 29,5% no Centro-Oeste e se aproxima da meta no Sudeste (7,0%) e no Sul (1,8%).

Coleta seletiva estava presente em 60,5% dos municípios brasileiros

No Brasil, 3.364 (60,5%) dos municípios com algum serviço em manejo de resíduos sólidos tinham coleta seletiva, enquanto 56,7% implementaram instrumentos legais que tratam sobre coleta seletiva, indicando que há uma aproximação entre a legislação e a prática em pouco mais da metade dos municípios brasileiros

Regionalmente, houve uma grande variação. A Região Sul liderou em ambas as categorias, com 81,9% dos municípios possuindo coleta seletiva e 74,5% com legislação específica. Em contraste, a Região Norte apresentou os menores valores, com 33,5% e 42,2%, respectivamente, destacando a necessidade de expandir a cobertura do serviço, uma vez que os instrumentos legais estão mais presentes do que a implementação do serviço.

No Nordeste, também houve uma diferença entre municípios com instrumentos legais e com a oferta do serviço de coleta seletiva, 38,2% e 33,5%, respectivamente, sugerindo que ainda há um esforço necessário para implementar as políticas públicas de coleta seletiva.

Três em cada quatro municípios com serviço de limpeza tinham catadores informais de material reciclável

Dos 5.557 municípios com serviço de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos, 4.093 (73,7%) indicaram presença de catadores informais. Já as entidades de catadores que atuaram na coleta seletiva estavam presentes em 1.498 (27,0%) municípios.

Na Região Norte, 72,5% dos municípios contaram com catadores informais e 16,7% tinham entidades de catadores atuando na coleta seletiva. No Nordeste, 71,8% e 18,7%, respectivamente. O Sudeste, que foi a região com maior percentual de municípios com catadores informais (78,0%), liderou em termos de entidades de catadores, prestando serviço de coleta seletiva em 33,5% dos municípios. O Sul tinha 70,2% e 35,5%, respectivamente, e o Centro-Oeste, 75,3% e 23,2%.

96,0% dos municípios tinham algum dispositivo de drenagem

A existência de algum dispositivo de drenagem e manejo de águas pluviais foi informada em 5.348 (96,0%) municípios em 2023. A Região Sudeste apresentou o maior percentual de municípios com o serviço (99,6%) e o Nordeste, o menor (89,3%).

O baixo percentual de municípios com serviço de drenagem no Piauí (47,8%) influenciou o total da região Nordeste. Chama a atenção que, do total de municípios piauienses, 50,4% estão inseridos na área do Polígono das Secas, no Semiárido brasileiro. Ampliando essa observação para toda a Região Nordeste, tem-se que, dos 191 municípios nordestinos sem o serviço de drenagem, 174 fazem parte do Polígono das Secas.

“A drenagem se divide em dois tipos: microdrenagem e macrodrenagem. Microdrenagem disciplina a água das chuvas na área urbana através dos pavimentos das ruas, guias e sarjetas, bocas de lobo, poços de visita etc. Já a macrodrenagem é compreendida por canais que recebem as águas da microdrenagem e são responsáveis pelo escoamento final das águas através dos canais naturais ou artificiais, galerias pluviais, igarapés, córregos, rios e grandes dispositivos de drenagem”, salienta Fernanda.

Soluções baseadas na natureza para drenagem e manejo de águas eram adotadas em 24,5% dos municípios

No Brasil, 24,5% dos municípios informaram ter soluções baseadas na natureza como estratégias de drenagem sustentáveis, enquanto 57,5% não tinham e 18,0% não souberam informar.

“Soluções baseadas na natureza são abordagens para resolver desafios sociais, econômicos e ambientais usando processos e elementos naturais de forma sustentável. Como essa pergunta é uma inovação na pesquisa, também foi importante a opção ‘Não sabe’, pois a desinformação também é informação nesse caso, as vezes nem se sabe que uma estrutura dessa é um equipamento de drenagem sustentável”, destaca a gerente da pesquisa.

Com o objetivo de mapear as ações de manejo de águas pluviais voltadas para a drenagem sustentável, foi questionado ao informante se adotava alguma das Soluções Baseadas na Natureza: alagados construídos (wetlands); corredores verdes urbanos (greenways); ruas verdes (green streets); canteiros pluviais; jardins de chuva; bioengenharia de solos ou engenharia natural; parques lineares urbanos; e valas de infiltração.

Os tipos de infraestruturas verdes que predominaram no país em 2023, segundo informações dos órgãos gestores do serviço de manejo de águas pluviais, foram as valas de infiltração (40,8%), seguidas pelos parques urbanos (35,3%). Os municípios podem informar a adoção demais de uma solução baseada na natureza.

tipos de infraestruturas verdes na disposição de resíduos sólidos

Falta de incentivos financeiros e áreas construídas consolidadas são os principais entraves para a implementação da drenagem sustentável

A pesquisa também investigou possíveis motivos e dificuldades que os municípios estariam enfrentando para implementar as Soluções Baseadas na Natureza, sendo que os informantes puderam registrar mais de uma resposta.

A falta de incentivos financeiros/fiscais e/ou previsão orçamentária foi a maior dificuldade relatada, informada por 2.872 municípios. Áreas construídas consolidadas (áreas urbanizadas densas ou ocupadas há mais de 10 anos) foram relatadas por 2.296 municípios, ocupando o segundo lugar em dificuldades para expansão ou implementação de drenagem sustentável. Falta de pessoal qualificado (2.162) e ausência de legislação (2.152) seguem a lista.

Proporção de municípios com Política de Saneamento Básico cresce de 38,2% em 2017 para 55,9% em 2023

Em 2023, 3.112 municípios (55,9%) informaram contar com Política Municipal de Saneamento Básico finalizada, número significativamente superior aos 2.126 (38,2%) com a mesma informação em 2017. Já 833 municipalidades (15,0%) declararam estar em processo de elaboração de sua respectiva política. Em 2017, esses eram 1.342 (24,1%).

Em todas as classes de tamanho da população dos municípios, mais da metade informou ter concluído a elaboração desta política. Os 1 370 municípios com mais de 10 000 a 20.000 habitantes teve o menor percentual dos com Política (51,1%) e o maior dos com a política em elaboração (17,3%).

“Para efeito de se obter percentuais mais substantivos e garantir maior base à análise foram combinados os números de municípios com política existente e em elaboração e, na comparação dos períodos, é possível concluir que os municípios brasileiros foram capazes de seguir produzindo suas Políticas Municipais de Saneamento Básico em bases regulares de 2017 até 2023”, complementa a gerente.

municípios com políticas de saneamento básico

69,1% dos municípios forneciam acesso à informação e participação dos usuários no serviço de saneamento básico

Em relação ao acesso à informação e participação do usuário, a pesquisa contou com três perguntas no questionário: se tinha sistema público de informação sobre os serviços de saneamento; se tinha ouvidoria; e se tinha central de atendimento ao cidadão para o recebimento de reclamações ou manifestações sobre os serviços de saneamento. Em 69,1% dos municípios brasileiros, o gestor informou a existência de pelo menos um dos três serviços citados.

30,8% das municipalidades tinham Política Municipal de Educação Ambiental

Em relação à Política Municipal de Educação Ambiental, observou-se que essa política enfrentou uma significativa falta de representação nos municípios, pois a pesquisa registrou que, em 2023, havia 1.120 municípios com ela em vigor, 597 com a mesma em elaboração e 3.848 cidades não a possuíam e tampouco a estavam construindo. Portanto, apenas 30,8% das administrações municipais brasileiras afirmaram ter concluído o processo para emissão desse documento ou estar com ele em elaboração.

Entre as regiões, é interessante observar que no somatório de municípios com Política Municipal de Educação Ambiental existente e em elaboração, o menor percentual se localizou no Sul do país (20,9%), sendo ainda menor naqueles com até 5.000 habitantes (13,8%), que representam a maior parcela de localidades da região, 37,0% do total.

A Região Nordeste tinha a segunda menor prevalência desta política nas circunstâncias conjuntas (29,0%). O Centro-Oeste se destacou com 38,1% dos seus municípios com Política Municipal de Educação Ambiental, seja com a existência da Política, ou com ela ainda em elaboração.

Mais sobre a pesquisa

O Suplemento de Saneamento da Pesquisa de Informações Básicas Municipais (MUNIC) 2023 apresenta informações sobre a gestão dos serviços de limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos e drenagem e manejo de águas pluviais dos 5.570 municípios do Brasil.

Traz também informações sobre a caracterização e infraestrutura do órgão gestor do serviço de saneamento, legislação e instrumentos de gestão, soluções baseadas na natureza, coleta seletiva e catadores, logística reversa, regionalização, educação ambiental e cobrança.

Fonte: IBGE

 

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Quatro bacias da Amazônia podem estar contaminadas por mercúrio .

 Rios na Amazônia têm risco muito alto de contaminação por mercúrio

Rios na Amazônia têm risco muito alto de contaminação por mercúrio

Por Rita Silva e Sandra Miyashiro

A partir de uma modelagem que projeta a distribuição e bioacumulação de mercúrio nos rios, estudiosos apontam que sub-bacias dos Rios Tapajós, Xingu, Mucajaí e Uraricoera, que abrigam territórios indígenas sob ameaça do garimpo ilegal, apresentam um grande risco de contaminação por mercúrio acima dos níveis considerados seguros.

As concentrações de mercúrio seriam mais baixas nas cabeceiras e aumentariam progressivamente ao longo do curso dos rios.

Em todas as bacias analisadas, os principais cursos d’água e os rios mais longos possuem um maior potencial de bioacumulação de mercúrio.

O estudo de modelagem foi realizado para os rios da bacia Tapajós – que abrangem os estados do Pará, Mato Grosso e Amazonas; bacia do Xingu, que banha os estados do Pará e Mato Grosso; e a bacia do Mucajaí e Uraricoera, presente no estado de Roraima, utilizando um modelo probabilístico desenvolvido pela Agência Ambiental Americana (US EPA). A análise das sub-bacias em relação aos limites máximos de mercúrio estabelecidos pela legislação brasileira revelou a probabilidade de uma alta taxa de não conformidade. Os resultados destacam um risco extremamente alto de contaminação para homens e mulheres em mais de 50% das sub-bacias analisadas e números alarmantes para as populações indígenas e ribeirinhas, que estão mais próximas dos focos de contaminação.

Das 3.791 sub-bacias do Tapajós, por exemplo, mais da metade (51,77%) não estaria em conformidade com a legislação ambiental brasileira. Uma análise mais detalhada revela uma maior inadequação nas subunidades da Bacia do Baixo Teles Pires, Rio Apiacás e Alto e Médio Teles Pires, todas com porcentagens acima de 59%. Como homens tendem a consumir mais peixes do que mulheres, as áreas de risco são muito altas para eles (49,4%), bem maior que a taxa para mulheres (45,1%). Esse percentual é ainda maior para populações indígenas, que têm nos peixes a principal fonte de ingestão de proteína: para eles, 49,6% das sub-bacias são consideradas territórios de risco muito alto.

Para Vitor Domingues, analista ambiental e um dos pesquisadores responsáveis pelo estudo, “um dos grandes desafios de se estudar a Amazônia é a escassez de dados amostrais. O estudo de modelagem ajuda a enfrentar esse desafio, contribuindo com o entendimento da dinâmica do mercúrio em um bioma tão complexo e sensível através de outras fontes de informação.”

A análise foi publicada na revista científica Toxics, em agosto deste ano, e oferece bases científicas para planejar e implementar intervenções eficazes nas regiões afetadas pela contaminação. “A pesquisa ressalta a importância de uma abordagem integrada para monitorar e mitigar os impactos do garimpo de ouro e de outras atividades que afetam a qualidade da água na Amazônia. É essencial considerar as complexidades dos ecossistemas e das populações locais e avaliar cuidadosamente as implicações ambientais e sociais desses projetos, especialmente em regiões já afetadas pela poluição por mercúrio”, afirma Marcelo Oliveira, especialista em Conservação do WWF-Brasil.

“O estudo evidencia como a poluição por mercúrio está intrinsecamente ligada tanto às atividades de mineração quanto às características dos ecossistemas aquáticos. As áreas alagáveis e outros elementos desempenham papéis cruciais na ampliação dos níveis de metilmercúrio. Assim, a crescente construção de infraestruturas, como reservatórios para hidrelétricas, pode potencialmente intensificar o problema, uma vez que essas estruturas podem aumentar a área de ambientes favoráveis à metilação do mercúrio”, completa.

Bacia do Tapajós

Apresenta valores de contaminação acima de 0,36 µg g-1 para peixes não-piscívoros e 6,46 µg g-1 para peixes piscívoros em várias sub-bacias. De acordo com a Resolução RDC Anvisa 42, de 29 de agosto de 2013, os limites máximos de mercúrio em peixes não piscívoros é de 0,5 mg kg-1, enquanto para peixes predadores, o limite é de 1,0 mg kg-1.

O sudoeste da Macrobacia do Juruena, que inclui o Rio Camararé e seus afluentes, apresenta muitas sub-bacias com projeções elevadas de contaminação, o que pode ser explicado pela presença de áreas alagadiças que estão associadas a um maior potencial de bioacumulação de mercúrio, mesmo em áreas com presença limitada de garimpos, como o Alto Juruena.

Já as melhores condições foram projetadas na montante da Bacia do Alto Tapajós, onde há presença predominante de cursos hídricos de menor ordem.

Bacias do Uraricoera e Mucajaí

Apresentam valores acima de 0,31 µg g-1 para peixes não-piscívoros e 1,79 µg g-1 para peixes piscívoros em várias sub-bacias. Além dos rios principais, destacam-se os Rios Parima, Uraricaá e Amajari, e afluentes como Auaris, Trairão e Ereu na bacia do Rio Uraricoera.Na bacia do Rio Mucajaí, além do Rio Apiaú, o Rio Couto de Magalhães também demonstra alto potencial de bioacumulação. Na Bacia do Rio Uraricoera, os resultados ressaltam a importância das áreas alagáveis nos processos de metilação de mercúrio e na sua bioacumulação em peixes. A dinâmica de transformação, especialmente na área alagável conhecida como Lavrado, pode ter influenciado fortemente as projeções de contaminação no nordeste da bacia.

Das 540 sub-bacias analisadas, uma média de 56,7% não atenderia aos padrões estabelecidos na legislação ambiental brasileira. Na bacia do Uraricoera, esse número chegou a 57,87%, enquanto na do Mucajaí foi de 53,94%. Esses resultados indicam uma preocupante prevalência de contaminação por mercúrio, com implicações diretas para as comunidades que dependem da pesca como fonte de subsistência. Para as populações ribeirinhas, todas as sub-bacias representam alto risco para as mulheres. Já 50,2% das unidades representam risco muito alto para homens. Os resultados também são alarmantes para populações indígenas, com 51,1% das sub-bacias classificadas como risco muito alto para mulheres e 53,7% para homens.

Bacia do Xingu

Apesar de uma menor presença de garimpo, a bacia do Xingu também apresenta níveis preocupantes de bioacumulação de mercúrio em peixes. A emissão de vapores metálicos pode ser um fator importante na dinâmica da contaminação. Nesta bacia, os valores de contaminação estão acima de 0,092 µg g-1 para peixes não-piscívoros e 0,7017 µg g-1 para peixes piscívoros em várias sub-bacias.

As sub-bacias na Macrobacia do Rio Fresco e Macrobacia do Rio Iriri destacam-se por suas projeções significativas de concentração de mercúrio em peixes. Os resultados podem estar associados à maior atividade garimpeira na região. Já, o sul da Bacia do Xingu, que inclui as Macrobacias do Rio Ronuro e Nascentes do Xingu, apresenta projeções expressivas mesmo em cursos hídricos de menor ordem. Na Macrobacia do Rio Iriri, mesmo as projeções dos afluentes Curuá, Carajari e Novo se destacam. As melhores condições foram modeladas na Macrobacia do Baixo Xingu, em cursos hídricos de menor ordem.

As áreas alagadiças estão associadas a projeções elevadas de concentrações de mercúrio em peixes, mesmo em áreas com presença limitada de garimpos. É importante salientar que as nascentes do Rio Xingu, o Alto Xingu e as Bacias do Rio Ronuro e do Rio Suiá-Miçu são repletas de planícies de inundação de importância ecológica. Outra região repleta de áreas úmidas é a Volta Grande do Xingu, na Macrobacia do Baixo Xingu, nas redondezas da UHE Belo Monte.

Embora a bacia do Xingu apresente uma média de conformidade com os parâmetros legais, a bacia não está isenta de preocupações. Apesar de os resultados médios de concentração de mercúrio em peixes não ultrapassarem os limites regulatórios, as projeções causam apreensão.

O estudo traz várias recomendações, dentre elas, a implementação de um programa de monitoramento de contaminação amplo, adaptado às condições das diferentes sub-regiões; o aprimoramento da legislação brasileira, substituindo os limites fixos atualmente estabelecidos por parâmetros baseados em análise de risco que considerem o alto consumo de peixe na região; a criação de um sistema padronizado de informações e complementação das bases de dados existentes, como o Observatório do Mercúrio, para apoiar o planejamento governamental e guiar a tomada de decisões.

Sobre a Nota Técnica – Dinâmica do Mercúrio e Avaliação dos seus Riscos: O Impacto da Contaminação nos Rios da Amazônia Brasileira
O estudo empregou o modelo SERAFM (spreadsheet-based ecological risk assessment for the fate of mercury), desenvolvido pela U.S. EPA, para avaliar o risco ecológico a partir do destino ambiental do mercúrio. A concentração do metal em peixes e humanos foi analisada com base nos dados do Observatório do Mercúrio, uma plataforma desenvolvida pelo WWF-Brasil em parceria com outras instituições, que foram fundamentais no ajuste dos resultados e na sua comparação.

 

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