quarta-feira, 10 de outubro de 2012

METRÓPOLES ATUAIS

As Metrópoles no Censo 2010: novas tendências?1
 

 Os primeiros resultados do Censo 2010  já permitem algumas reflexões sobre mudanças e permanências da  posição  das metrópoles  na rede urbana brasileira, ao menos em termos demográficos.  É  preciso lembrar o conceito de  metrópole  que temos utilizado nos vários trabalhos  da Rede  Observatório  das Metrópoles. Ele  não  se confunde com o de  Região Metropolitana, como veremos mais adiante. 
Com efeito, as primeiras regiões metropolitanas no Brasil foram criadas em 1973, através da Lei Complementar 14 que, por sua vez, obedecia a Constituição de 1967. A partir da Constituição de 1988 a responsabilidade pela criação e organização das regiões metropolitanas foi transferida do governo federal para os estados, de acordo com o § 3º do Artigo 25.1. Ao longo dos anos, o quadro metropolitano oficial sofre alterações, tanto na composição interna das RMs com a inclusão e exclusão de municípios, quanto na criação de novas RMs. O Observatório das  Metrópoles, nesse sentido, vem realizando o monitoramento do quadro institucional das RMs brasileiras, procurando acompanhar  suas mudanças.  Através de um sistemático estudo sobre  o universo metropolitano oficial, ou seja, as regiões cuja existência está definida por lei federal ou estadual. Até 31 de março de 2010, constatamos que o Brasil conta  com 35 regiões metropolitanas (RMs) e 3 regiões integradas de desenvolvimento econômico (RIDE’s). Algumas RMs contam ainda com colares metropolitanos, áreas de expansão metropolitana e entorno metropolitano definidos em lei. No caso das RIDE’s, vale lembrar ainda, que na sua composição inclui municípios de diferentes unidades de federação.
As 38 RMs/RIDEs comportam 444 municípios e estão distribuídas por 22 unidades da federação nas cinco grandes regiões. Há que se mencionar, também, os 154 municípios dos Colares Metropolitanos das RMs de Belo Horizonte (MG) e Vale do Aço, das Áreas de Expansão Metropolitana das RMs Carbonífera (SC), de Chapecó (SC), Norte/Nord. Catarinense (SC), Florianópolis (SC), Foz do Rio Itajaí (SC), Lages (SC) e Vale do Rio Itajaí (SC) e dos municípios do Entorno Metropolitano da RMs do Vale do Rio Cuiabá (MT). No quadro 1, apresentamos as RMs e RIDEs segundo as grandes regiões geográficas do Brasil.

                                                          
1 Colaboraram na elaboração deste documento:  Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro,  Juciano Martins Rodrigues,
Érica Tavares da Silva e Marcelo Gomes Ribeiro. Além de Lygia Costa, Caio Victer e Tamara Grisolia.
   
 


 Por outro lado, sabemos que essas regiões metropolitanas, criadas por diferentes legislações, se configuram  em unidades regionais bastante distintas. Além disso, a criação de regiões metropolitanas, na maioria das vezes, não obedece a critérios claros, objetivos e consistentes, tanto na sua institucionalização, quanto na definição dos municípios que as compõem.  Por este motivo, o Observatório das Metrópoles realizou um trabalho que identificou aquelas que se constituem como “metropolitanas”, por meio  da avaliação da capacidade destes aglomerados urbanos polarizarem o território brasileiro nas escalas nacional,
regional e local, além de hierarquizar os municípios abarcados pelas RM´s segundo o grau de integração com a dinâmica metropolitana (OBSERVATÓRIO, 2009). A partir deste estudo foram identificados 15 espaços urbanos metropolitanos: São Paulo, Rio de Janeiro,  Belo Horizonte, Porto Alegre, Brasília, Curitiba, Salvador, Recife, Fortaleza, Campinas, Manaus, Vitória, Goiânia, Belém e Florianópolis (ver Mapa 2). Vale lembrar que os 15 espaços considerados metropolitanos têm enorme importância na concentração das forças produtivas nacionais. Eles centralizam 62% da capacidade tecnológica do país, medida pelo número de patentes, artigos científicos, população com mais de 12 anos de estudos e valor bruto da transformação industrial (VTI) das empresas que inovam em produtos e processos. Nestas 15 metrópoles estão concentrados também 55% do valor de transformação industrial das empresas que exportam.

 Utilizando este conceito examinamos os  primeiros resultados do Censo 2010  frente  a algumas tendências da metropolização do país identificadas nos últimos 30 anos.  Os dados revelam certamente a confirmação de muitas tendências de mudanças  já observadas e que já
têm sido objeto de intensos debates, entretanto, é preciso ter cuidado para não encobrir as muitas permanências que ainda se observam no território urbano brasileiro, especialmente o metropolitano. Chama-nos a atenção que nesse momento a imprensa volta a divulgar análises supostamente bem fundamentadas sobre o esvaziamento econômico e demográfico das metrópoles brasileiras.  Munidos de números aparentemente  válidos, jornalistas e  alguns
acadêmicos têm destacado que a riqueza está se deslocando para o interior do Brasil, e com ela parte da população concentrada nas grandes cidades. Muitas das conclusões veiculadas estão fundadas em imprecisões estatísticas e conceituais, sobretudo aquelas que insistem em dizer que os municípios agrupados na simplória faixa de população entre 100 e 500 mil habitantes foram os que mais cresceram. É necessário, no entanto, mergulhar na complexidade do sistema urbano brasileiro para que as  definições do que são atualmente “espaços metropolitanos” e “não-metropolitanos”, assim como cidades médias, não sejam utilizadas de maneira equivocada  frente à importância dessas categorias e aos limites do simples “corte populacional”.
 Por exemplo, numa leitura mais atenta,  cidades como  Holambra, na região metropolitana de Campinas, Águas Lindas de Goiás, na Região Integrada de Desenvolvimento Econômica do Distrito Federal, Aparecida de Goiânia, na região metropolitana de Goiânia ou Ananindeua na região metropolitana de Belém, não podem de forma alguma ser caracterizadas
como cidades médias simplesmente por estarem na faixa entre 100 mil a 500 mil habitantes.
São de fato cidades organizadas por dinâmicas metropolitanas, não podendo ser evidentemente consideradas como realidades urbanas  isoladas.  Incluir cidades,  que  embora pertençam à mesma faixa populacional, sem considerar o contexto espacial, é ignorar o empenho empreendido em anos de pesquisa sobre as transformações territoriais no Brasil, sobretudo dos Geógrafos que vêm dedicando seus esforços ao desenvolvimento do conceito e na caracterização da rede urbana brasileira.  Para se falar em aumento da participação das cidades médias  e esvaziamento econômico e populacional das metrópoles é  preciso, primeiramente, considerar  a  rede urbana brasileira  que é, por sua vez,  hierarquizada e complexa. Para uma análise da distribuição da população brasileira revelada pelo Censo 2010 que leve em consideração as peculiaridades do sistema urbano brasileiro, dividimos os municípios nas seguintes categorias:  
a) Metropolitanos (inclui-se todos os municípios das 15 metrópoles identificadas através do estudo mencionado acima, independente do seu porte populacional);
b) Municípios com mais de 500 mil habitantes (exceto os metropolitanos);  
c) Municípios com população entre 100 mil a 500 mil habitantes (exceto os metropolitanos);  
d) Municípios com população entre 50 mil e 100 mil habitantes (exceto os metropolitanos);  
e) Municípios com população entre 20 mil e 50mil habitantes (exceto os metropolitanos) e, 
f) Municípios com população até 20 mil habitantes (exceto os metropolitanos). 
Ao analisarmos os dados com base nessa divisão, percebemos que as metrópoles não perdem população e o quadro da distribuição da população brasileira é um pouco diferente daquele veiculado através das recentes notícias nos diversos meio de  comunicação.
Levantamentos baseados na comparação entre os Censos Demográficos de 1991, 2000 e 2010 nos mostram um cenário diferente do que vem sendo exposto. Desde 1991 as 15 metrópoles têm  aumentado sua participação no total da população brasileira. Neste ano as metrópoles representavam 34,9% da população do país. Esse percentual aumentou para 36% em 2000 e 36,2% em 2010. Algumas metrópoles, porém, tem perdido participação na população do país, como são os casos de São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre e Recife. No entanto, a maioria delas mantém sua participação ou tem o percentual de participação alargado. 
 Municípios com população entre 100 mil e 500 mil habitantes e cidades municípios com população acima de 500 mil também aumentam sua participação no total da população brasileira. O primeiro conjunto passa de 15%, em 1991, para 15,9% em 2010. Enquanto o segundo conjunto passa de 5% para 5,6% nesse mesmo período. Por outro lado, o conjunto de municípios agrupados nas faixas que vão até 100 mil perde participação nos últimos 20 anos.  





É fato que  parte do chamado  interior do Brasil tem apresentado crescimento populacional, assim como as cidades médias continuam apresentando considerável crescimento. Reconhecemos também as mudanças nos fluxos migratórios e a  emigração de alguns centros metropolitanos, porém é importante pensar também em outros olhares sobre esses processos. Em termos populacionais, não é somente as chamadas cidades médias que  crescem no Brasil. É preciso considerar que a população metropolitana experimentou um crescimento absoluto de aproximadamente 7,9 milhões de habitantes, o que representa 37,8% do crescimento do país, enquanto o incremento do restante do país foi pouco mais de 13  milhões de habitantes.  Embora  municípios  de 100 mil a 500 mil habitantes e municípios  com mais 500 mil estejam experimentando taxas de crescimento mais elevadas (1,7% a.a e 1,8% a.a, respectivamente), as metrópoles continuam crescendo em ritmo superior a média nacional  (ver gráfico  acima).  É preciso também ressaltar que  são nas metrópoles e cidades médias  onde se concentra a maior parte da  riqueza nacional.  Enquanto as 15 metrópoles são  responsáveis pela produção  de 50,3% do PIB brasileiro,  as cidades com população entre 100 mil e 500 mil habitantes detêm  17,8%  do produto  nacional.  Estes dois grupos de cidades são  os únicos  que não perdem participação no total do PIB entre 2004 e 2008, ao contrário do que vem sendo  reproduzido pela mídia. São,  portanto,  infundadas as afirmações de que cidades médias ganham participação em detrimento das Metrópoles.
Analisar a distribuição populacional com base na complexidade da  rede urbana brasileira é fundamental para a elaboração de políticas sociais e econômicas no país, principalmente pensadas numa perspectiva regional. Sob esse aspecto importa, sobretudo, compreender o lugar das metrópoles na rede urbana tendo em vista que esses espaços necessitam de políticas que sejam pensadas no seu conjunto. Daí a diferença entre um município que possui entre 100 mil e 500 mil habitantes  integrados a  um contexto metropolitano de outro que esteja fora desse contexto. As políticas de saúde,  transporte (mobilidade), saneamento, dentre outras, requerem articulações entre os entes federativos inseridos nas metrópoles, pois qualquer ação isolada de um desses entes federados, principalmente, os municípios, poderá haver consequências indesejadas para todo o território metropolitano.
Além disso, é importantíssimo considerar também que as metrópoles são as iniciais de apresentação das alterações demográficas em nosso país. Se pensarmos na redução das taxas de fecundidade, por exemplo, este foi um processo que se iniciou em espaços metropolitanos, de onde as mudanças geralmente se expandem devido ao acesso ao mercado de trabalho, maior escolarização, empregos mais qualificados, maior proporção de ocupados com alto rendimento, participação feminina no mundo do trabalho e no acesso à educação superior, entre outros processos, justamente pelas metrópoles serem espaços mais afeitos às mudanças sócio-culturais. Tudo isso está diretamente ligado às mudanças populacionais nas metrópoles, que não se resumem apenas à saída de pessoas, até porque boa parte da emigração dos núcleos metropolitanos ocorre para municípios da própria periferia metropolitana, ou para municípios que apresentam forte relação com a dinâmica metropolitana. Nesse sentido, não se deve pensar apenas em termos quantitativos, é preciso avaliar também as mudanças qualitativas que vêm ocorrendo no interior das áreas metropolitanas.
Portanto,  a metropolização pode ser pensada também em termos de difusão do fenômeno metropolitano, que passa não apenas por contigüidade territorial, mas também por conectividade na economia em rede  e  por polarização econômica. Além disso, devemos destacar o surgimento e o crescimento de novos espaços metropolitanos, que, embora longe do litoral, não devem ser  considerados  simplesmente  como interior, como tem ocorrido. Por fim, os estudos urbano/metropolitanos ainda têm muito a avançar a fim de contemplar as transformações que ocorrem nas  grandes  áreas metropolitanas,  considerando seu enorme porte populacional, seus  conflitos  e seus  problemas, como  a  precariedade habitacional,  o acesso ao mercado formal de trabalho, os limites e possibilidades de deslocamento cotidiano, entre outros.
Referências Bibliográficas

OBSERVATÓRIO das Metrópoles. Hierarquização e identificação dos espaços urbanos. Rio de
Janeiro: Letra Capital/Observatório das Metrópoles, 2009 
FONTE: Observatório das Metrópoles/Instituto Nacional de Ciências e Tecnologia

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