domingo, 5 de maio de 2013

MÃO-DE-OBRA QUALIFICADA

A RIQUEZA DA CRISE
Formar um engenheiro custa 2 milhões e leva tempo. Na Europa, essa mão de obra qualificada está disponível
por Delfim Netto — publicado 26/04/2013 14:00, última modificação 26/04/2013 14:18
Carta Capital

A grande riqueza disponível hoje no mundo, por conta dessa crise fantástica produzida pelo setor financeiro, é a disponibilidade de mão de obra de alta qualidade. O processo civilizatório que acontece no Brasil nos coloca em condições privilegiadas para atrair uma parcela desse capital humano. As medidas tomadas no campo da educação para acelerar a preparação de mão de obra entre nós são de suma importância para atender às novas demandas do mercado e melhorar as condições dos brasileiros na competição pelos postos de trabalho.

Persistem dificuldades, contudo, para contratações em diversos níveis da atividade: hoje temos falta de engenheiros em quase todas as especialidades, enquanto é uma enormidade o número de profissionais de muito boa qualidade que está sobrando na Europa. O custo para formar um engenheiro, físico, matemático, geólogo e afins é de cerca de 2 milhões de reais. E espera de 25 anos. Em razão do prolongamento da crise financeira mundial e do horizonte sem fim do desemprego, essa mão de obra de boa qualidade, formada na Europa, está disponível para emigrar, e o Brasil é um destino atraente.

Com um sistema adequado, em 24 horas pode-se trazer um profissional em falta desse nível. Em 48 horas ele estará trabalhando. E não serão apenas engenheiros: químicos, físicos, matemáticos, mecânicos, mestres de obra, seja qual for a especialidade necessária. Há demanda no Brasil para profissionais nos setores da construção civil e existe disponibilidade desses trabalhadores portugueses, franceses, espanhóis, italianos, com tradição em obras nas áreas de infraestrutura, habitacional e de transportes.

É uma mão de obra preparada, que só viria nos ajudar a crescer em produtividade. Não vejo argumentos para se opor a essa imigração, a não ser de parte das “corporações de ofício” que usam os benefícios do monopólio concedido.

Continuamos a ser um país que acolhe bem os imigrantes.  Meus avós e muitos dos avós dos caros leitores de Carta Capital vieram com certeza de algum lugar da Itália, Portugal, Espanha, Grécia, Polônia ou da antiga Tcheco-Eslováquia. Isso nos dá todas as condições de acolher a grande riqueza disponível hoje no mundo, como sempre acolhemos em outras ocasiões dramáticas que castigaram tantas sociedades do “Velho” Mundo.

Precisamos acelerar o nosso processo educativo para acomodar a relação de oferta e procura de mão de obra. E corrigir alguns desequilíbrios importantes em nosso mercado de trabalho.

Em dias recentes acompanhamos a iniciativa do Banco Central na tentativa de controlar as expectativas de crescimento da inflação. Elevou-se em 0,25 ponto porcentual a Selic, na suposição de uma alta do juro real produzir um “pequeno desemprego” e aliviar as tensões no mercado de trabalho.

Tanto o governo quanto o Banco Central sabem: não é apenas com a Selic que se pode lidar com a inflação. O controle do ritmo dos preços está ligado a fatores muito mais complexos, como a persistência dos aumentos do salário nominal muito acima do aumento da produtividade do trabalho. Por essa razão o governo procura caminhos para tornar mais flexíveis os ajustes entre oferta e demanda no setor trabalho. É uma questão de aritmética, não de economia: quando o salário nominal cresce mais do que a produtividade do trabalho, há pressão inflacionária.

Não precisamos de uma inflação de 6% ou 7% ao ano para voltar a crescer a taxas robustas. Uma taxa alta de inflação só pode prejudicar o crescimento da economia. Se olharmos para as políticas postas em prática no governo Dilma, verificaremos que todas elas, no longo prazo, buscam melhorar a produtividade. Geram às vezes muito ruído, muita discussão no curto prazo, mas em dois ou três anos elas amadurecerão e produzirão bons resultados.

Deve ser esse o objetivo de um programa de imigração capaz de ajudar a flexibilizar os mercados e permitir aumentar a produtividade do trabalho. Foi assim com a desoneração dos impostos na contratação de mão de obra, na redução da taxa de juros, no enfrentamento das tarifas de energia elétrica e na questão dos portos.

Temos de reconhecer que estamos diante de mudanças estruturais profundas. O governo tem a tendência de fazer as coisas com certa dureza, algum excesso de ruído, mas estão todas na direção correta.

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