segunda-feira, 10 de dezembro de 2018

A AGRICULTURA PODE NÃO ATENDER A DEMANDA DE ALIMENTOS NAS PRÓXIMAS DÉCADAS.

A agricultura pode não atender a demanda de alimentos nas próximas décadas, artigo de José Eustáquio Diniz Alves


the global agricultural productivity gap index
[EcoDebate] Existe um mito de que a Terra tem amplas condições de atender a demanda mundial por alimentos até 2050. Mas a realidade mostra que o quadro alimentar no mundo é mais complexo e há dificuldades crescentes para produzir comida de forma sustentável.
Artigo de Chris Clayton (17/10/2018) utilizando o Índice de Produtividade Agrícola Global (GAP, em inglês) – compilado pela Global Harvest Initiative – mostra que a produção de alimentos não está crescendo rápido o suficiente para atender a demanda de comida da população mundial de forma sustentável.
O problema é mais grave em países de baixa renda onde o crescimento da produção tem ficado, persistentemente, abaixo da demanda. O relatório mostra que 2018 é o quinto ano consecutivo de desequilíbrio entre a oferta e a demanda. Desta forma, se esta tendência não for revertida, o mundo pode não ser capaz de fornecer os alimentos, rações, fibras e biocombustíveis necessários para uma população global em crescimento.
A “Produtividade Total dos Fatores” (TFP, em inglês) nos países de baixa renda está crescendo em 0,96% ao ano, o que está abaixo do crescimento projetado nos últimos dois anos. Isso fica bem abaixo da taxa de crescimento necessária para atingir as metas de sustentabilidade de dobrar a produtividade dos alimentos nos países de baixa renda e alcançar a “fome zero” até 2030 ou mesmo até 2050.
Para atender à demanda projetada de cerca de 10 bilhões de pessoas na década de 2050, o relatório afirma que a produtividade agrícola global deve aumentar em 1,75% ao ano. Esse crescimento é necessário, mesmo que os cientistas do clima avisem que a produção das colheitas diminuirá, especialmente em ambientes tropicais nas próximas décadas, devido às temperaturas mais altas e padrões climáticos mais voláteis.
Até o momento, o Índice de Preços da FAO (gráfico abaixo) não tem apresentado uma tendência de subida muito forte. O Índice atingiu o seu valor máximo (em termos reais) no auge da crise de petróleo de 1973 e 1974. Depois, iniciou uma trajetória de queda, apresentando os valores mais baixos na virada do milênio. Nos primeiros anos do terceiro milênio o índice subiu até 2008, caiu com a recessão de 2009 e voltou a subir até 2011 e 2012, quando os preços dos combustíveis fósseis estavam muito elevados. Entre 2013 e 2018, o Índice diminuiu, com a queda do preço do petróleo, mas está em um patamar mais alto do que nas décadas de 1980 e 1990.
FAO food price index
O relatório do GAP considerou o impacto da mudança climática sobre a produção e os preços dos alimentos, adotando 10 modelos diferentes, sugerindo que a mudança climática gerará preços mais altos para commodities agrícolas em geral e particularmente para as culturas de subsistência. O impacto do aquecimento global ter um efeito negativo na oferta de bens essenciais.
O relatório também concluiu que a média da Produtividade Total dos Fatos não cresceu de 2006 a 2015 tão rapidamente quanto nas décadas anteriores. A Produtividade Total dos Fatores considera os aumentos na produção agrícola, mas também os custos para os agricultores produzirem alimentos, perdas e desperdícios na cadeia de fornecimento e custos para os consumidores.
A fome global, impulsionada por secas e conflitos, aumentou no ano passado, atingindo 821 milhões de pessoas que foram consideradas cronicamente famintas pelas Nações Unidas. Cerca de 124 milhões de pessoas enfrentaram desnutrição aguda e fome.
A Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) lançou a campanha “Um mundo #fomezero para 2030 é possível” nas comemorações do Dia Mundial da Alimentação de 2018. Mas esta meta pode ficar somente no papel se não houver aumento da produtividade e redução do ritmo de crescimento demográfico.
O fato é que a população mundial continua crescendo e a biocapacidade do Planeta continua diminuindo. A Pegada Ecológica, em 2014, estava 70% acima da biocapacidade da Terra. O modelo de produção e consumo global é insustentável e o tripé da sustentabilidade virou um trilema (Martine e Alves, 2015).
No longo prazo, só o decrescimento demoeconômico pode garantir o equilíbrio entre as demandas humanas e a saúde dos ecossistemas.
José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br
Referência:
MARTINE, G. ALVES, JED. Economia, sociedade e meio ambiente no século 21: tripé ou trilema da sustentabilidade? R. bras. Est. Pop. Rebep, n. 32, v. 3, Rio de Janeiro, 2015 (em português e em inglês) http://www.scielo.br/pdf/rbepop/2015nahead/0102-3098-rbepop-S0102-3098201500000027P.pdf
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 07/12/2018

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