terça-feira, 30 de abril de 2019

PROJETO AQUAPOLO, PROJETO DE PRODUÇÃO DE ÁGUA DE REÚSO.

SP: Projeto Aquapolo, projeto de produção de água de reúso, transforma esgoto tratado em água industrial, por Paulo Afonso da Mata Machado


água
Foto: EBC
O Projeto Aquapolo é um marco na história do Saneamento brasileiro, onde a SABESP e a BRK Ambiental transformam o esgoto tratado em água industrial.
Esse projeto tem números impressionantes: a adutora que conduz o esgoto tratado ao Aquapolo tem 17 km de extensão; a área construída tem 15.000 metros quadrados; os dois tanques de armazenamento de água têm, em conjunto, capacidade para 70.000 litros; a rede de distribuição de água industrial tem 3,6 km e a capacidade de tratamento é de 1.000 litros por segundo. Tudo isso faz do Aquapolo o quinto maior empreendimento de produção de água industrial do planeta.
Ao entrar no Aquapolo, o esgoto tratado na ETE ABC passa por biodiscos, em que grande parte da matéria orgânica é oxidada a gás carbônico e água e a amônia é convertida a nitrato. Em seguida, o nitrato é removido no reator anóxico. Do reator anóxico, o líquido vai para o reator aeróbio, onde a maior parte da matéria orgânica remanescente é oxidada a gás carbônico e água. Após passar pelo reator aeróbio, o líquido é encaminhado ao biorreator de membranas (MBR), que reúne as funções de lodos ativados e de ultrafiltração. O efluente do biorreator recebe dióxido de cloro antes de ser armazenado no tanque 1.
O tanque 1 é dividido em dois módulos. O módulo 1 recebe o efluente do MBR e o distribui ao módulo 2, que abastece as indústrias do Polo Petroquímico do ABC e o tratamento por osmose reversa, destinado às empresas que necessitam de água desmineralizada.
É importante observar que um tratamento por osmose reversa faz com que apenas uma parcela do líquido que entra no tratamento – o permeado – possa ser aproveitado. No Projeto Aquapolo, no entanto, não há perda de água, pois a parcela rejeitada – o concentrado – é devolvida ao tanque 1, entrando diretamente no módulo 2, que abastece as empresas que não necessitam de água desmineralizada.
Para se ter ideia do tratamento realizado, aqui estão alguns números das análises físico-químicas da água contida no tanque 1 e a comparação com os limites respectivos estabelecidos pelo Anexo XX da Portaria de Consolidação 05/2017 do Ministério da Saúde (PRC 05), que trata dos requisitos indispensáveis para que a água possa ser considerada potável:
Parâmetro
Saída Aquapolo
Limites permitidos
Dispositivo PRC 05
Alumínio
0,2
0,2
Anexo 10
Cobre
0,1
2
Anexo 7
Ferro
0,3
0,3
Anexo 10
Manganês
0,2
0,1
Anexo 10
Amônia
1
1,5
Anexo 10
Surfactantes
1
0,5
Anexo 10
Dureza
100
500
Anexo 10
Sulfetos
0,1
0,1
Anexo 10
Turbidez
1
0,3
art. 31
pH
6,66
Entre 6,0 e 9,5
art. 39
Os responsáveis pelo Projeto Aquapolo não divulgam análises do líquido armazenado no tanque 2. Contudo, é de se esperar que atenda a todas as exigências da PRC 05, pois, na osmose reversa, as impurezas são retidas em poros diminutos para que a água se torne apta a ser usada em caldeiras, torres de resfriamento e onde mais for requerida água desmineralizada.
O grande gargalo do Projeto Aquapolo é sua capacidade ociosa. Atualmente, o Polo Petroquímico do ABC demanda apenas 650 L/s. Cerca de 350 L/s, que poderiam ser transformados em água potável, diminuindo o enorme déficit hídrico da região, não o são.
A título de comparação, a estação de reúso potável de Goreangab, na Namíbia, que transforma esgoto doméstico em água potável, foi inaugurada em 1968 e não tem, sequer, tratamento por osmose reversa. O efluente da estação, após clorado, é distribuído à população da capital e, até hoje, não se verificou qualquer tipo de doença vinculado à conversão do esgoto doméstico em água potável.
A conversão da capacidade ociosa do Projeto Aquapolo em água potável será muito mais fácil, devido ao tratamento por osmose reversa. A parcela do efluente tratado que não for destinada às empresas que requerem água desmineralizada deve ser encaminhada à ETA mais próxima, que tenha capacidade suficiente para receber essa vazão adicional.
A análise do efluente da osmose reversa é fundamental para se saber em que parte da ETA esse efluente será lançado. Caso atenda às exigências da PRC 05, poderá se unir à água tratada na ETA imediatamente a montante da cloração. A junção com a água tratada na ETA vai devolver ao efluente da osmose reversa os sais minerais indispensáveis à dieta humana. Ressalte-se que a PRC 05 não faz menção à existência de sais minerais na água de abastecimento público, que são indispensáveis ao consumo humano, daí a necessidade de se misturar a água que os contenha para que o efluente da osmose reversa seja remineralizado.
Efetuada a cloração e corrigido o pH da água, esta estará apta a ser fornecida como água potável. Contudo, se as análises da água do tanque 2 indicarem parâmetros da PRC 05 que não estejam sendo observados, o excedente do tratamento por osmose reversa deverá se juntar à água tratada na entrada da ETA. Dependendo do resultado das análises, pode ser indicado tratamento adicional antes de o líquido ser encaminhado à estação.
Efetuada a cloração, a vazão de água potável da ETA estará acrescida da atual capacidade ociosa do Aquapolo, ou seja, de cerca de 350 L/s ou 0,9 bilhões de litros por mês que, somados aos 1,7 bilhão de litros por mês que são economizados com a substituição de água potável por água de reúso, totalizarão uma economia de 2,6 bilhões de litros por mês de água oriunda de fontes que podem secar durante o período de estiagem.
Nos Estados Unidos, são várias as estações de reúso potável direto já existentes, como a Water Factory 21, que possui um local de degustação onde as pessoas podem beber água que foi esgoto, conforme o que se vê no vídeo:https://www.youtube.com/watch?v=CkTCXFC3s24.
Portanto, o Projeto Aquapolo, o maior projeto de produção de água de reúso da América Latina, poderá vir a ser, também, a primeira estação de reúso potável direto da América Latina, ombreando-nos não apenas com os Estados Unidos, mas com países da Europa, da Ásia, da Oceania e até da África.
Sugerimos que a SABESP e a BRK Ambiental não percam tempo, pois uma próxima estiagem já se anuncia na bacia do Cantareira, de onde é importada a água necessária a suprir o déficit hídrico da Região Metropolitana de São Paulo.
Paulo Afonso da Mata Machado é Engenheiro Civil e Sanitarista
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 25/04/2019

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