Artigo de José Eustáquio Diniz Alves
A população brasileira cresceu 5 vezes no século XIX e cerca de 10 vezes no século XX. Em 200 anos, o número de habitantes cresceu quase 50 vezes. Mas a transição demográfica (redução das taxas de mortalidade e natalidade) alterou a dinâmica populacional tradicional. As principais características do século XXI serão o envelhecimento da estrutura etária (que começou por volta de 1970) e o decrescimento populacional, que terá início a partir de 2042.
Portanto, o Brasil está passando por um rápido e profundo processo de mudança da estrutura etária, pois a população de crianças e jovens está diminuindo e a população de idosos está crescendo.
O gráfico abaixo, com dados da Divisão de População da ONU, mostra que a população brasileira de 0-4 anos era de 9,2 milhões de crianças em 1950, atingiu o pico de 18,5 milhões em 1986 e deve cair para 6,5 milhões de crianças em 2100. A população de 0-14 anos era de 22,7 milhões de jovens em 1950, atingiu o pico de 53,3 milhões em 1993 e deve cair para 20,2 milhões de jovens em 2100. Portanto, no final do século XXI o número de crianças e jovens será menor do que em 1950.
Enquanto diminui a proporção de crianças e jovens, cresce a proporção de pessoas no topo da pirâmide populacional. A população de 50 anos e mais de idade era de 4,8 milhões de pessoas em 1950, passou o número de crianças de 0-4 anos em 1989 e passou o número de jovens de 0-14 anos em 2015. A população de 60 anos e mais de idade era de 2,2 milhões de pessoas em 1950, passou o número de crianças de 0-4 anos em 2006 e vai passar o número de jovens de 0-14 anos em 2029. A população de 80 anos e mais de idade era de 184 mil pessoas em 1950, deve passar número de crianças de 0-4 anos em 2044 e deve passar o número de jovens de 0-14 anos em 2084. Ou seja, a população da quarta idade (80+) será maior do que a população de jovens abaixo de 15 anos.
O principal fator da mudança da estrutura etária é a queda da fecundidade, mas, evidentemente, o aumento do tempo médio de vida das pessoas também contribui para o aumento da proporção de idosos. A expectativa de vida ao nascer no Brasil era de 48,5 anos em 1950, chegou a 76 anos em 2024 e deve atingir 87 anos em 2100. Por conseguinte, o peso da população idosa vai crescer substancialmente no país e a população de 50 anos e mais de idade será maioria no último quartel do século XXI.
Desta forma, ganha relevância o incremento da longevidade saudável, ativa e colaborativa. A longevidade sadia refere-se a um conceito que vai além da expectativa de vida, focando na qualidade de vida à medida que as pessoas envelhecem. Esse conceito pode ser explicado em três dimensões.
A longevidade saudável envolve o prolongamento da vida com qualidade, onde o envelhecimento ocorre de forma que as pessoas mantenham sua saúde física, mental e emocional. Isso inclui práticas preventivas, como: a) Alimentação balanceada: consumo de nutrientes adequados; b) Exercício físico: atividades regulares que fortalecem o corpo e a mente; c) Cuidados médicos preventivos: check-ups regulares e gestão de doenças crônicas e d) Saúde mental: práticas que garantem bem-estar emocional, como meditação, socialização e terapia, quando necessário.
A longevidade ativa refere-se à capacidade de continuar realizando atividades que são significativas e produtivas, como trabalho, hobbies, voluntariado ou atividades educacionais. Envolvendo: a) Manutenção da mobilidade: exercícios físicos regulares para preservar a independência; b) Aprendizado contínuo: manter o cérebro ativo por meio de novos conhecimentos e habilidades, como aulas ou desafios mentais e c) Participação social: manter-se envolvido em atividades comunitárias e de apoio social.
A Longevidade Colaborativa diz respeito à importância da colaboração entre gerações e a contribuição do idoso para a sociedade.
Uma longevidade colaborativa implica: a) Interação intergeracional: troca de experiências entre diferentes faixas etárias, o que promove aprendizado mútuo; b) Trabalho voluntário ou mentoria: aproveitamento da experiência acumulada para orientar os mais jovens e contribuir para a sociedade e c) Projetos comunitários: engajamento em ações que promovam o bem-estar coletivo, como jardinagem comunitária, atividades de artesanato ou programas educacionais.
Todavia, por mais que se cuide da longevidade saudável, ativa e colaborativa, a morbidade tende a crescer com a idade e uma alta percentagem de idosos sofrem com diversas doenças nos anos finais de vida. Nestes casos, a compressão da morbidade é um conceito que considera que o período de tempo em que uma pessoa sofre de doenças ou incapacidades graves pode ser reduzido e “comprimido” para o final da vida. Ou seja, mesmo que as pessoas vivam mais, o tempo em que enfrentam problemas de saúde graves seria reduzido, levando a mais anos de vida ativa e saudável, com reforço das conexões sociais.
A compressão da morbidade implica que: a) As pessoas vivam mais anos sem doenças debilitantes, adiando o início de problemas graves para uma idade mais avançada; b) A duração das doenças crônicas e suas complicações seja encurtada, fazendo com que o impacto dessas condições seja menor ao longo da vida e c) Os custos de saúde e cuidados a longo prazo sejam potencialmente reduzidos, uma vez que as pessoas vivam mais tempo sem necessitar de cuidados intensivos e caros por longos períodos.
O envelhecimento populacional é inexorável e o aumento da longevidade é uma conquista civilizatória. O Brasil venceu a mortalidade precoce e agora tem o desafio de aumentar a longevidade sadia. A mudança da estrutura etária é fruto de uma revolução demográfica que transformou o cenário populacional brasileiro, sendo que o aumento da proporção de idosos pode se tornar uma onda de transformação social e de renovação das relações intergeracionais. O envelhecimento não pode ser motivo de isolamento e segregação, mas uma oportunidade para a superação.
A economia prateada é uma consequência natural do aumento da idade mediana da força de trabalho e do deslocamento da dinâmica econômica para os degraus superiores da pirâmide etária. A população de 50 anos e mais de idade não deve ser vista como um obstáculo para o avanço social, mas sim como um sustentáculo para a prosperidade. Um bônus ao invés de um ônus. Uma geração de idosos protagonistas e não coadjuvantes.
As políticas públicas devem garantir que as pessoas idosas sejam tratadas com justiça e igualdade, combatendo o etarismo e eliminando todos os tipos de discriminação e violência, inclusive no mercado de trabalho e nas atividades de geração de renda. As políticas educacionais de aprendizado contínuo e de requalificação profissional ajudam a manter os idosos ativos economicamente e socialmente, além de melhorar a qualidade de vida, estimulando a saúde mental e física.
A economia política clássica ensina que o trabalho é a fonte da riqueza. Desta forma, a longevidade no mercado de trabalho é uma forma de articular um envelhecimento saudável e ativo, com geração de renda e inserção social. As políticas públicas podem ajudar combatendo o etarismo e facilitando a adaptação às mudanças entre as novas etapas do ciclo de vida e novas configurações do mundo do trabalho. Entre as estratégias possíveis estão:
Aperfeiçoamento contínuo: Investir em educação e capacitação, com cursos, treinamentos e certificações que ajudam a manter as habilidades atualizadas.
Adaptação à tecnologia: Com a rápida evolução tecnológica, é importante estar confortável com novas ferramentas e plataformas digitais. Isso demonstra flexibilidade e disposição para o aprendizado, características valorizadas por empregadores e empreendedores.
Networking constante: Construir uma rede de contatos profissionais diversificada ajuda a encontrar novas oportunidades e se manter relevante. Participar de eventos, webinars e grupos de interesse facilita a criação e manutenção de relacionamentos.
Inteligência emocional: Em ambientes de trabalho, ter inteligência emocional é essencial para lidar com conflitos, colaborar e manter um clima positivo. Autoconsciência, empatia e resiliência são habilidades que podem ser desenvolvidas e ajudam a lidar melhor com o estresse.
Equilíbrio entre vida pessoal e profissional: Evitar o burnout é crucial para uma carreira duradoura, garantindo os cuidados com a saúde mental.
Saúde física e mental: Manter uma rotina de exercícios, boa alimentação e sono adequado sustenta o desempenho no trabalho a longo prazo e a criatividade dentro e fora do mercado de trabalho.
Resiliência e adaptabilidade: Como o mercado de trabalho está sempre mudando, a capacidade de se adaptar e abraçar novas funções ou projetos torna-se uma necessidade. A resiliência é a capacidade de se recuperar e se superar diante dos novos desafios.
Desenvolvimento de habilidades interpessoais: Colaborar bem com diferentes tipos de pessoas e saber comunicar-se de forma clara são habilidades cruciais. Soft skills, como empatia, trabalho em equipe e liderança, ajudam a construir uma boa reputação no mercado.
Planejamento financeiro: Manter uma boa gestão financeira pessoal ajuda a ter mais liberdade para tomar decisões profissionais a longo prazo. Isso evita que o foco na estabilidade financeira limite as opções de crescimento ou de mudança de carreira.
Seguir essas práticas permite uma carreira mais longa, diversificada e relevante, favorecendo a longevidade profissional em um mercado competitivo e em constante evolução.
Nas fases finais do ciclo de vida, as pessoas ativas, criativas, produtivas, autônomas, independentes, empoderadas e colaborativas podem ser uma fonte inesgotável de inspiração para as novas gerações e para a construção de uma sociedade mais sustentável, inclusiva e próspera.
José Eustáquio Diniz Alves
Doutor em demografia, link do CV Lattes:
http://lattes.cnpq.br/2003298427606382
Referências:
ALVES, JED. Brasil 2042: Enfrentando a Nova Revolução Demográfica, Ecodebate, 23/08/2024
https://www.ecodebate.com.br/2024/08/23/brasil-2042-enfrentando-a-nova-revolucao-demografica/
ALVES, JED. Demografia e Economia nos 200 anos da Independência do Brasil e cenários para o século XXI (com a colaboração de GALIZA, F), ENS, maio de 2022
https://prdapi.ens.edu.br/media/downloads/Livro_Demografia_e_Economia_digital_2.pdf
in EcoDebate, ISSN 2446-9394
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