quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

GRANDE DOMÍNIO DAS CORPORAÇÕES DE AGROTÓXICOS.

Atuação das grandes corporações de agrotóxicos, artigo de Roberto Naime

Publicado em janeiro 20, 2016 


Imagem: ENSP

[EcoDebate] Reportagem de Jorge Américo revela que para manter o nível de consumo, os fabricantes e fornecedores de agrotóxicos estão financiando a produção agrícola. Este incentivo consiste em fornecer, aos produtores insumos, as sementes, adubos, fertilizantes e pesticidas, além de assistência técnica. O pagamento é efetuado após a colheita, que recebe parte da produção.
Com isto, os produtores ficam reféns destas empresas. Um exemplo está na região do Vale do Rio Pardo, no Rio Grande do Sul, conhecida pela forte presença da indústria fumageira. A integrante do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), Rosiele Cristiane, denuncia a exploração dos produtores de fumo, que por meio de contratos, tiram o controle do agricultor sobre a sua produção.
“Antes de iniciar a safra, o orientador agrícola da empresa que presta a assistência técnica, que vai à casa das pessoas, faz o contrato com as famílias. Vê quantos pés de fumo eles querem plantar. Os agricultores assinam esse contrato sem ler, há várias promissórias, em branco também. E este contrato está dizendo que o agricultor não é dono do produto. Ele é o fiel depositário”.
Ela prossegue “isto dá à empresa o direito de buscar o fumo, se o agricultor não entregar. Nos últimos anos, os agricultores estão esperando o melhor preço. Então, no início da comercialização, eles não estão entregando o fumo. Eles esperam até maio, junho, que é a melhor época para vender. Quando o fumo não é entregue para a empresa, e existem contratos a honrar no exterior, se usa dessas artimanhas para buscar o fumo em casa”
A partir deste modelo de financiamento, a venda de defensivos agrícolas, no Brasil, pode crescer de US$ 6,6 bilhões para US$ 8,5 bilhões em cinco anos. Segundo o engenheiro agrônomo Horácio Martins, as plantas deixaram de ser espécies vegetais para se tornarem unidades de produção de moléculas.
“A maior parte das moléculas, que são desenvolvidas, não está na natureza. Elas são criadas em laboratórios, e o custo de uma nova molécula, hoje, gira em torno de US$ 250 milhões. Aquele novo germoplasma, o material genético da semente, traz características e propriedades que outras sementes não têm. Ele é inovador e permite então ser patenteado.”
A biotecnologia está nas mãos de empresas que controlam quatro áreas, sementes, agroquímicos, farmacêutica e veterinária. Existem cerca de mil princípios ativos de agrotóxicos, que combinados criam mais de dez mil formulações. Cada uma dessas formulações gera lucro para as empresas. Horácio Martins explica que as empresas exercem forte pressão sobre o poder público para viabilizar suas atuações na cadeia produtiva.
“Eles têm a patente dos seus produtos, dos princípios ativos que depois são combinados para gerar substâncias comerciais. A partir daí, pressionam os governos para que façam legislação, normas internas e um marco regulatório que vai controlar o uso daquela patente, daquele princípio ativo que ela mesma fabricou. Enfim, fabrica o produto e cria regulamentação para controlar o seu uso.”

“Num contexto em que estas substâncias provocam danos ao meio ambiente, danos à saúde da população, o Estado barateia o custo destes produtos, incentivando o uso de modo que os custos sociais são “externados” pelo sistema público de saúde e pelo sistema público da previdência. Por exemplo, quando o Estado aplica uma política de taxação do cigarro e do álcool, para inibir o uso destas substâncias, porque são consideradas agressivas e para poder adquirir recursos para financiar o sistema público, uma vez que vai cuidar dos danos, esta lógica não se aplica para os agrotóxicos”.
As populações do entorno destes empreendimentos acabam ficando muito vulneráveis, porque elas encontram um Estado que não tem capacidade de fiscalizar. A partir disto, a gente percebe que o embate não é só com as empresas. Existe também um embate que precisa ser feito com estas políticas públicas que beneficiam este tipo de modelo de desenvolvimento.
O impacto na saúde e no meio ambiente é instantâneo. Existe uma portaria do Ministério da Saúde, que estabelece valores máximos permitidos de venenos em águas consideradas próprias para consumo humano. Então, a água que as pessoas bebem pode ter veneno. O próprio Estado estabelece isto.
Referência:

Dr. Roberto Naime, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em Geologia Ambiental. Integrante do corpo Docente do Mestrado e Doutorado em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale.
Sugestão de leitura: Celebração da vida [EBook Kindle], por Roberto Naime, na Amazon.

in EcoDebate, 20/01/2016

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