O encolhimento do mercado de trabalho em São Paulo e no Brasil, artigo de José Eustáquio Diniz Alves
Publicado em maio 6, 2016
[EcoDebate] O Brasil caminha para a sua mais longa e profunda recessão econômica da história. Do segundo trimestre de 2014 ao primeiro trimestre de 2016 já são 8 períodos recessivos consecutivos. Caiu o PIB e a renda per capita brasileira. Tudo indica que teremos recessão no restante do corrente ano, podendo até se prolongar para 2017. O impacto sobre o mercado de trabalho é descomunal. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC), do IBGE, tinha apontado que, em fevereiro de 2016, o número de desempregados no Brasil ultrapassou a barreira simbólica de 10 milhões de pessoas. Fora o incremento do desemprego oculto, do desalento e da “geração nem-nem-nem” (pessoas que nem estudam, nem trabalham e nem procuram emprego).
No dia 29/04, o IBGE divulgou os dados do primeiro trimestre. A taxa de desocupação no trimestre móvel encerrado em março de 2016 foi estimada em 10,9%, 1,9 ponto percentual acima da taxa do trimestre encerrado em dezembro de 2015 (9,0%) e 3,0 pontos percentuais a mais que no mesmo trimestre de 2015 (7,9%). A população desocupada (11,1 milhões de pessoas), 22,2% a mais (2,0 milhões de pessoas) que o contingente observado entre outubro e dezembro de 2015. No confronto com igual trimestre do ano passado, esta estimativa subiu 39,8%, significando um aumento de 3,2 milhões de pessoas desocupadas na força de trabalho. O quadro é grave.
A crise do mercado de trabalho é nacional, mas atinge de forma impactante a maior e mais dinâmica região metropolitana (RM) do país. A RM de São Paulo tem uma população de mais de 20 milhões de habitantes (equivale à população conjunta de Portugal e Grécia). Segundo dados da Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED), do Dieese e Seade, a População em Idade Ativa (PIA) era de 16,7 milhões de pessoas em março de 2009 e passou para 17,75 milhões em março de 2016. A População Ocupada (PO) era de 8,9 milhões de pessoas em março de 2009 e passou para 9,3 milhões em março de 2016. Assim, enquanto crescia o número de pessoas em idade de trabalhar, decrescia a quantidade de pessoas ocupadas. Como resultado, a taxa de ocupação (PO/PIA), que deveria crescer para aproveitar o bônus demográfico, infelizmente, caiu de 53,5% para 52,1% nos últimos sete anos.
Mas o pior foram as alterações de tendência. Entre março de 2009 e dezembro de 2010 a população ocupada (PO) na RMSP passou de 8,9 milhões para 9,7 milhões de trabalhadores e a taxa de ocupação passou de 53,5% para 57,2%. Portanto, crescia o número absoluto e relativo de pessoas com emprego.
Mas entre dezembro de 2010 e dezembro de 2014 houve uma estabilidade na PO (de 9,7 milhões para 9,8 milhões) e uma pequena queda na taxa de ocupação (de 57,2% para 55,5%). Esta estagnação do número de pessoas ocupadas, mas com aumento do número de pessoas não ocupadas é considerada uma das causas das grandes mobilizações de massa de junho de 2013, que foram lideradas pelos jovens, parte mais sensível das pessoas que sofrem com a menor oportunidade de meios para se ganhar a vida.
Mas a maior carga negativa veio depois das últimas eleições presidenciais de 2014. A tendência embicou para baixo. Entre dezembro de 2014 e março de 2016 a PO caiu de 9,8 milhões para 9,3 milhões de pessoas e a taxa de ocupação caiu de 55,5% para 52,1%. A taxa de ocupação atual é menor do que na grande recessão internacional de 2009. Neste ritmo, daqui a poucos meses, a RMSP terá mais gente em idade ativa sem trabalho do que com trabalho.
Mas o problema não se restringe somente à queda da população ocupada em termos absoluto e relativo. Caiu também o rendimento real das pessoas ocupadas. A PED mostra que o rendimento médio na RMSP era de R$ 2.160,00 em dezembro de 2010 e caiu para R$ 1.984,00 em fevereiro de 2016. Isto representou uma queda de cerca de 10% no poder de compra da população ocupada. No conjunto houve uma redução na massa salarial, reduzindo a demanda por consumo e acelerando a tendência à recessão.
A queda atual do mercado de trabalho na RMSP contrasta com o aumento que houve nas últimas décadas. A despeito das variações sazonais (queda nos primeiros meses do ano e aumento nos últimos meses) nota-se um aumento da PO de pouco mais de 6 milhões de pessoas para quase 10 milhões. Mas o teto ficou estável entre 2010 e 2014 e começou a cair rapidamente desde o início de 2015, aumentando a revolta da população com o governo e a situação do país. A atual queda do número de pessoas ocupadas na RMSP é a maior da história.
Se a população ocupada está caindo, a população ocupada com carteira de trabalho está caindo em ritmo maior, não só em São Paulo, mas em todo o Brasil. Os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED), do Ministério do Trabalho mostram que o Brasil perdeu 118.776 vagas com carteira assinada em março, mais do que havia perdido em fevereiro de 2016 (-104.582 vagas) e um grande retrocesso em relação a março de 2015, quando houve saldo positivo de 19,2 mil empregos. O número de empregos cortados é o saldo, ou seja, o total de demissões menos o de contratações no período. Em março, houve 1.374.485 admissões e 1.493.261 demissões. A redução é o pior resultado para março em 24 anos, desde 1992, quando a pesquisa começou a ser feita. A diminuição pode ser explicada pelo cenário de profunda retração econômica, com a crise política também contribuindo para minar a confiança de empresas e famílias, afetando decisões de investimento.
O colapso do emprego formal é assustador. Depois das últimas eleições presidenciais, entre dezembro de 2014 e março de 2016 foram fechadas 2,5 milhões de vagas com carteira assinada no Brasil. Nos últimos 12 meses foram 1,85 milhão de empregos formais perdidos. Isto dá uma média de 157 mil empregos perdidos por mês, ou 5.217 vagas com carteira de trabalho perdidas por dia, nos 16 meses em questão.
O emprego formal encolhe enquanto cresce a população em idade de trabalhar e que está engrossando as fileiras do desemprego aberto ou do desalento. E a situação está se agravando, pois, a perda de empregos no primeiro trimestre de 2016 foi de -323.052 vagas, muito maior do que as -64.907 vagas perdidas no primeiro trimestre de 2015. Há projeções que estimam uma perda de 2 milhões de empregos formais somente em 2016. Todo este processo vai atingir, em maior proporção, a população mais escolarizada, prejudicando o bônus demográfico e comprometendo o futuro do Brasil.
José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br
in EcoDebate, 06/05/2016
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