O fim fóssil do pacto político e econômico da Nova República, artigo de José Eustáquio Diniz Alves
“Todas as pessoas reconhecem o direito de revolução, isto é, o direito de
recusar lealdade ao governo, e opor-lhe resistência, quando sua
tirania ou sua ineficiência tornam-se insuportáveis”
Henry Thoreau (Desobediência Civil, 1849)
[EcoDebate] A Nova República (1985-2018) morreu. Ou melhor, o pacto político e econômico da Nova República está em coma irreversível, quase sem atividade cerebral e só continua respirando graças aos aparelhos (políticos partidários e corporativistas) e à inércia da sociedade civil que insiste em manter a vida cotidiana apesar de todos os percalços e à falta de esperança. A crise dos combustíveis fósseis é apenas a centelha que evidencia a insustentabilidade do modelo implantado após o fim do regime militar. Em pouco mais de 30 anos, a Nova República se tornou um regime fossilizado (em todos os sentidos).
Desde as descobertas das jazidas abissais do pré-sal, o Brasil apostou todas as suas fichas energéticas nos poluidores hidrocarbonetos. O sonho doce do etanol foi para a cucuia. Entre os anos de 2007 a 2010, 76 usinas de cana-de-açúcar foram construídas no Brasil e foi levantada a bandeira do etanol como uma commodity “made in Brazil”. Mas, em 2011 e 2012, 27 unidades produtoras fecharam as portas ou entraram em recuperação judicial. Estimativas atuais mostram que há 52 unidades em recuperação judicial e 27 em falência num total de 444 unidade no Brasil. Ou seja, o Brasil retrocedeu na produção de biocombustíveis, se absteve de produzir biodiesel e não avançou suficientemente rápido na produção de energias renováveis.
As manifestações de junho de 2013 – que de certa forma repetiram a espontaneidade de maio de 1968, mas que, ao fim e ao cabo, derrubaram os índices de aprovação da presidenta Dilma Rousseff e contribuíram para a sua queda – começaram contra um aumento de R$ 0,20 (vinte centavos) nas passagens de ônibus movidos à combustível fóssil. A greve dos caminhoneiros, de maio de 2018, também teve como fagulha do protesto o aumento do custo do diesel e a absurda política de preços da Petrobras, que promove aumentos diários dos combustíveis fósseis. Não há como transferir para a população os custos do desgoverno, do monopólio e da ineficiência da Petrobras. O povo brasileiro não tem como pagar os altos custos da energia fóssil, muito menos diante da possibilidade, cada vez mais presente, do “Pico do Petróleo”.
O que junho de 2013 e maio de 2018 tem em comum é a luta contra a carestia e a “rebelião tributária”, num quadro descontentamento sobre os rumos do país. A história está cheia de exemplos de governos ineficientes e corruptos que são derrubados por protestos contra o empobrecimento e o aumento de impostos. A Independência dos Estados Unidos, em 1776, começou com a “revolta do chá” contra os impostos cobrados pela Coroa Britânica. A Revolução Francesa, de 1789, começou quando o Rei convocou os Estados Gerais para aumentar os impostos e transferir para o conjunto da população francesa a redução do déficit fiscal e a conta dos gastos excessivos da Monarquia e das despesas de guerra. A Inconfidência Mineira, também de 1789, começou quando a Corte Portuguesa aplicou a Derrama (imposto), exigindo um quinto (20%) da produção de ouro.
A Nova República aumentou a carga tributária brasileira de cerca de 24% do Produto Interno Bruto (PIB), na década de 1980, para mais de 34% na atual década. Mas não contente com o aumento dos impostos escorchantes e dos serviços minguantes, o governo brasileiro tem um déficit público (nominal) de mais de 6% do PIB. Portanto, a sociedade tem que repassar cerca de 40% do PIB para as mãos egoístas e nada limpas do Estado. O cidadão brasileiro de 2018, paga, em média, duas vezes mais impostos do que o cidadão de Vila Rica (MG), no tempo de Tiradentes.
O pacto econômico da Nova República, configurado na “Constituição cidadã” de 1988, fez do Brasil um país submergente e só tem se sustentado, no decorrer destes 30 anos, devido ao aumento do gasto público com políticas sociais, como educação, saúde (SUS), programas de transferência de renda (PBF) e aposentadorias e pensões (incluindo Benefícios de Prestação Continuada, BPC, e aposentadoria rural). O problema é que o gasto social cresce, mas o investimento produtivo não cresce e a produtividade dos fatores de produção permanece estagnada nas últimas 3 décadas. É óbvio que existe um limite de tempo para o gasto social crescer mais do que o PIB, pois um dia a parte se tornaria maior do que o todo. Como já mostramos em outros artigos (Alves, 16/05/2018 e 23/05/2018), a economia brasileira tem crescido menos do que a economia internacional nas últimas 4 décadas e, atualmente (2011-20) vamos ter a segunda década perdida, com estagnação da renda per capita. Invariavelmente, quando o gasto social se torna competitivo com o investimento produtivo a economia não cresce e o déficit fiscal se agrava.
Como mostrou o economista Marcos Lisboa (atual presidente do Insper e ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda entre 2003 e 2005, no governo Lula), a Nova República tem um gigantesco problema fiscal pela frente:
“O Brasil tem hoje um problema contratado para o futuro e outro presente. O contratado para o futuro é a previdência. Os gastos vão crescer seis pontos do Produto Interno Bruto (PIB) nas próximas décadas, porque a população em idade de aposentadoria cresce 3,5% a 4% ao ano. Já a população que trabalha aumenta cerca de 0,8% e, daqui a pouco, esse número vai diminuir ainda mais. Se nada for feito, a despesa com a previdência vai passar de 13% do PIB a 19%. Esse aumento equivale a 350 bilhões de reais. A reforma é para evitar esse colapso. Para além disso, temos um déficit de 140 bilhões de reais, quando deveríamos ter um superávit, no mínimo, de 200 bilhões para não deixar a dívida crescer. Isso é, com os gastos públicos como estão, estamos numa trajetória de endividamento crescente que não é sustentável” (Lisboa, 23/07/2017).
Portanto, o pacto econômico da Nova República já chegou aos seus limites e é impossível manter o crescimento das despesas públicas num quadro de “armadilha do baixo crescimento”. Nos últimos 30 anos, o Brasil aumentou a carga tributária e elevou o gasto público, mas só resolveu parcialmente os problemas sociais. É certo que houve redução da pobreza, aumento das matrículas escolares, aumento da esperança de vida ao nascer, etc. Mas é impressionante o tanto que se deixou de cumprir.
Sucessivos governos fazem propaganda de suas políticas sociais, mas não há nada mais injusto e antissocial do que a existência de 27,7 milhões de trabalhadores desocupados e/ou desalentados, que não possuem o mais básico dos direitos humanos que é o direito ao trabalho e a ter um meio de vida próprio, sem depender das migalhas e da caridade estatal. O Brasil de 2018 tem cerca de 3 milhões de postos de trabalho com carteira assinada a menos do que na época das últimas eleições presidenciais (estelionato eleitoral) de 2014. O IBGE anunciou dia 29/05, que taxa de desemprego aberto no trimestre encerrado em abril deste ano, foi de 12,9%, atingindo 13,4 milhões de brasileiros e, provavelmente, vai aumentar em maio e junho com a paralisação do país. Cada vez mais os trabalhadores brasileiros estão dependentes das transferências estatais de renda. Como dizia Luiz Gonzaga: “Mas doutô uma esmola a um homem qui é são, Ou lhe mata de vergonha ou vicia o cidadão”.
O desemprego aberto entre os jovens já ultrapassou 30%. O Brasil tinha 48,5 milhões de pessoas com idade entre 15 e 29 anos e 11,1 milhões (jovens Nem-Nem) não trabalhavam e não estavam matriculadas em uma escola, faculdade, curso técnico de nível médio ou de qualificação profissional. Não se pode esperar muito de uma geração do futuro que está sendo excluída no presente! São exatamente os jovens pobres, negros e das periferias urbanas que são as principais vítimas dos mais de 60 mil homicídios anuais (ao contrário da noção do “brasileiro alegre e cordial”, o país é um dos lugares mais violentos do mundo). Além do alto número de estupros, também há a Exploração Sexual Infantil, sendo comum meninas de 12 anos de idade, frequentarem “fluxos” (bailes funk de rua) para sejam submetidas a maratonas de penetrações e abusos sexuais (com o consequente aumento da gravidez indesejada entre crianças e adolescentes).
Houve aumento da mortalidade infantil brasileira no período recente da recessão, crescimento das epidemias de febre amarela, dengue, zika e chicungunha e estagnação das taxas de analfabetismo (uma das mais altas do mundo entre países de renda média). Cerca de 50% dos domicílios brasileiros não tem acesso ao saneamento básico e a carência de moradia é um problema crônico, pois os trabalhadores são empurrados para as periferias das grandes metrópoles e sofrem com a falta de serviços públicos e a precariedade do transporte público, além de ter que enfrentar os enormes engarrafamentos e a poluição do ar provocada pela queima de combustíveis fósseis utilizados no transporte de gente e de carga.
O incêndio que levou ao desabamento do edifício Wilton Paes de Almeida, no largo do Paissandu (um prédio de 24 andares invadido no centro de São Paulo) mostra a precariedade da política habitacional na maior cidade do país e também mostra como os moradores pobres podem ser explorados por pretensos movimentos sociais, “nas barbas” da administração municipal.
A intervenção militar no Rio de Janeiro, além de muito cara e ineficiente, não evitou a morte de Marielle Franco e Anderson Gomes e nem colocou ordem na “Cidade Maravilhosa”. A crescente militarização da vida brasileira e os apelos para a volta dos militares (presentes inclusive em setores da greve dos caminhoneiros) é um saudosismo sem sentido, mas não ocorre no vácuo político, pois é o resultado da incapacidade da democracia brasileira de construir um projeto de país com mobilidade social ascendente e uma decente segurança pública. A democracia brasileira, assim como as forças armadas estão em frangalhos, com fraca capacidade operacional e parecem não estar à altura dos problemas brasileiros atuais.
Tudo isto mostra que o pacto social da Nova República está em dívida com boa parte do povo “pobre e oprimido” e que o alto volume de recursos gastos com a dita verba social favoreceu apenas uma pequena parte da população brasileira. O Brasil é um dos países mais desiguais do mundo (um dos maiores índices de Gini de concentração de renda). Os altos impostos não são direcionados para as parcelas desfavorecidas e nem para a melhoria da infraestrutura socioeconômica. O elevado desemprego, a renda per capita brasileira estagnada e a manutenção do privilégio de poucos, torna o conflito social parecido com um barril de pólvora. Surpreendentemente, só o governo desconhecia esta situação e foi atropelado pela greve dos caminhoneiros.
Mas não é somente o pacto econômico da Nova República que está moribundo, também o pacto político está em seus estertores. O arranjo institucional que foi concebido na Constituição de 1988 buscava o equilíbrio entre um Executivo ativo, um Congresso poderoso e um Judiciário com fortes prerrogativas. O Executivo, via Presidência da República eleita pelo voto direto seria a instância máxima a administrar o país, organizar a economia e até propor leis ordinárias. Mas a Presidência só se mantém viva pelo “presidencialismo de coalisão”, que na prática foi se transformando em presidencialismo de cooptação e de corrupção. Nos últimos 30 anos, dos quatro presidentes eleitos (Collor, FHC, Lula e Dilma) dois foram impedidos e um está preso. A Presidência da República virou uma ocupação forte por um lado e fraca por outro. A desvalorização ocorreu devido à maneira como pacto político tem sido rompido em relação aos outros dois poderes e à falta de legitimidade popular (em função do baixo desempenho econômico e da falta de solução para os problemas sociais).
Fica quase impossível sustentar o presidencialismo de coalizão quando a Presidência da República não tem uma base parlamentar sólida e fica refém de compromissos partidários que representam grupos específicos e privilegiados da sociedade. O Congresso Nacional virou a Casa da Mãe Joana. Com o aumento do número de partidos (atualmente, o Brasil tem 35 partidos registrados no TSE e mais 73 em formação) os governos precisam de mais agremiações para formar a maioria simples e a maioria de dois terços do parlamento. Quanto maior a base de alianças, menos política e ideologicamente ela é consistente. As alianças muito amplas abrem espaço para as negociatas e o aparelhamento partidário do Estado e das empresas públicas, via o fisiologismo e a divisão de cargos e recursos, distantes dos interesses republicanos. A hiperfragmentação partidária torna o processo legislativo um jogo de barganhas privadas que se distanciam cada vez mais do interesse público. Pesquisa realizada pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) mostra que somente 12% da população confia no Congresso Nacional e 6% nos partidos políticos.
O terceiro elemento do pacto político da Nova República é o Judiciário e, particularmente, o Supremo Tribunal Federal (STF), que teve suas prerrogativas fortalecidas pela Constituição de 1988 que ainda ampliou os poderes legitimados para propor ADINs, além de fortalecer o seu papel de corte revisora e de foro especial. O STF e o Judiciário saíram fortalecidos e passam a ter um ativismo judiciário inaceitável, mas que é cada vez mais forte na medida em que a Presidência da República e o Congresso Nacional não se entendem e se enfraquecem politicamente. O STF conseguiu aumentar as suas prerrogativas ao longo do período 1988-2018 preenchendo o vácuo político e, também, pelo estrelismo e personalismo de seus membros. Já houve brigas na Corte que viraram sensação nas rodas de fofoca nacionais. Em março de 2018, houve uma troca de acusações entre os ministros Luiz Roberto Barroso e Gilmar Mendes. O segundo disse: “Claro que continua a haver graves problemas. […] É preciso que a gente denuncie isso! Que a gente anteveja esse tipo de manobra. Porque não se pode fazer isso com o Supremo Tribunal Federal. ‘Ah, agora, eu vou dar uma de esperto e vou conseguir a decisão do aborto, de preferência na turma com três ministros. E aí a gente faz um 2 a 1”. Em seguida, Barroso se insurgiu contra o pronunciamento do colega: “Me deixa de fora desse seu mau sentimento, você é uma pessoa horrível, uma mistura do mal com atraso e pitadas de psicopatia. Isso não tem nada a ver com o que está sendo julgado. É um absurdo vossa excelência vir aqui fazer um comício cheio de ofensas, grosserias. Vossa excelência não consegue articular um argumento, fica procurando, já ofendeu a presidente, já ofendeu o ministro Fux, agora chegou a mim. A vida para vossa excelência é ofender as pessoas, não tem nenhuma ideia, nenhuma, nenhuma, só ofende as pessoas”. Esta é a Corte que pretende equilibrar e moderar as inconsistências dos dois outros poderes.
Enquanto os indivíduos “do andar de cima” brigam e não se entendem, os “do andar de baixo” tentam se organizar e se defender como podem. Atualmente, não existe nenhum projeto nacional, os partidos políticos tentam consolidar os seus feudos e a economia brasileira se afunda enquanto os países líderes avançam na 4ª Revolução Industrial e promovem a transição para uma matriz energética renovável, a informatização da sociedade do conhecimento (inclusive com Inteligência Artificial) e uma grande mudança do setor de transporte para o uso de veículos elétricos e o fim dos motores à combustão interna.
Na direção oposta, o Brasil do pré-sal e das tecnologias do século XX está cada vez mais atrasado em relação à nova configuração produtiva global do século XXI. A greve dos caminhoneiros – organizada a partir dos grupos do WhatsApp – lançou um alerta para a alta dependência do país dos combustíveis fósseis, a alta dependência do transporte rodoviário, a falta de investimentos na malha ferroviária, hidroviária e metroviária, a falta de apoio ao desenvolvimento local e à produção familiar de alimentos, a alta dependência ao agronegócio e ao sistema de concessões de rodovias, etc. Enfim, a greve mostrou as fragilidades da economia brasileira que passou pela mais longa e mais profunda recessão do período republicano e está vivendo a pior e mais lenta recuperação da história. As promessas de crescimento do PIB em 2018 já foram para o saco.
É significativo o fato de que a Petrobras, na primeira semana da greve dos caminhoneiros, tenha tido o seu valor de mercado reduzido em mais de R$ 120 bilhões e que tenha perdido o primeiro lugar no ranking das empresas mais valiosas da Bolsa de Valores para a AMBEV (valor de R$ 310 bilhões). O valor de mercado da Petrobras caiu para menos de R$ 250 bilhões no dia 28 de maio, o que equivale a cerca de US$ 70 bilhões. Enquanto isto, entre as 10 maiores empresas do mundo (Google, Apple, Amazon, Microsoft, Tencent, Facebook, Visa, McDonald’s, Alibaba e AT&T), todas valendo algumas centenas de bilhões de dólares, não existe nenhuma petroleira.
Enquanto os EUA e a China disputam pela liderança das megaempresas de tecnologia, a maior empresa brasileira da Nova República é uma fabricante de cerveja, que, inclusive, vai ter muito lucro com o megaevento midiático da Copa do Mundo da Rússia. Na Roma antiga, o povo era controlado com “pão e circo”. No Brasil atual, os governantes oferecem “churrasco, cerveja e futebol”, tudo isto energizado pelos combustíveis fósseis.
O ciclo se repete. Enquanto os governos passados promoviam a “Copa das Copas”, em 2014, e as “Olimpíadas do século”, em 2016, para manter as massas iludidas com uma suposta grandeza nacional (que se transformou em um triste legado de obras inconclusas e caras), na realidade a economia brasileira aprofundava a “especialização regressiva” e o processo de desindustrialização precoce, que fez o Brasil voltar a ser uma economia primário-exportadora altamente dependente da exportação de commodities e da exploração mineral e da produção do agronegócio tocado à base dos defensivos agrícolas e dos agrotóxicos. O Brasil perdeu competitividade internacional e não consegue ter uma economia capaz de responder aos anseios da população.
Não é a primeira vez que o país vive o desabastecimento e a falta de gêneros alimentícios. Isto também aconteceu pouco antes das eleições de 1986, no governo Sarney, do PMDB. O Plano Cruzado foi um grande estelionato eleitoral que possibilitou ao PMDB ganhar os governos de todos os Estados (menos Sergipe) e se tornar o maior partido da Nova República. Em 2018, com Michel Temer, a greve dos caminhoneiros confirmou que o PMDB não tem qualquer proposta coerente para administrar o país e o abastecimento atual é mais de governo e de políticas públicas. Os malfeitos de Temer está sendo pior do que os malfeitos do Sarney. A chamada “Bolsa Diesel” não elimina o déficit de credibilidade do governo, que ziguezagueou várias vezes, ficou sem rumo e foi derrotado pelos caminhoneiros. Um colapso eleitoral do PMDB, ou MDB, em outubro é uma condição para a renovação política nacional.
O fato é que, no geral, os partidos brasileiros não estiveram à altura do momento histórico nacional. Por exemplo, o PT, numa atitude completamente sem noção, fez o lançamento da candidatura Lula à Presidência da República, no dia 27 de maio, quando todo o país estava parado e com graves problemas de abastecimento. Demonstrando insensibilidade para a gravidade do momento, a senadora Gleisi Hoffmann, fez um balanço sobre os esvaziados lançamentos do domingo, 27 de maio no sítio digital do PT: “Os atos por Lula aconteceram em todo o Brasil. Isso mostra a vitalidade de nossa militância”. Mas não dá para ignorar a realidade e ter uma atitude de avestruz que não tem nada a ver com tudo isto que está aí. Seria hora dos partidos de esquerda mobilizarem a sociedade civil para criar alternativas ao desgoverno Temer. Todavia, só falta a extrema direita capitalizar os efeitos de uma greve geral que travou o país!
O certo é que a greve dos caminhoneiros parou tudo e deixou as forças políticas de direita, centro e esquerda perplexos e sem saber o que fazer. Não adianta culpar o locaute. Existe também a revolta do “precariado” e a revolta dos trabalhadores autônomos do transporte. Diante do movimento dos caminhoneiros, houve perplexidade tanto das instituições do Estado, quanto das lideranças dos três poderes. Na incapacidade governamental de oferecer uma rápida solução, os efeitos econômicos são devastadores, com destruição de alimentos, mais de 70 milhões de aves mortas na primeira semana da greve, o recuo na produção de proteína animal que vai aumentar os preços nos próximos meses, leite jogado fora, desaparecimento das hortaliças e piora da nutrição, aumento geral da inflação, paralisação de hospitais, escolas sem aulas, queda nas exportações, ameaça de uma nova recessão em 2018 e aumento do déficit público com agravamento da crise fiscal.
Assim, enquanto outros outubros não surgem e o Brasil segue a sua trajetória de declínio relativo, a Nova República está entre um estado vegetativo e um coma irreversível. Há falência múltipla dos órgãos. O pior é que as candidaturas para as eleições presidenciais de 2018, em miopia profunda, fingem não ver a condição do doente e ignoram a crise macroeconômica e microeconômica do país. Agem como o Barão de Münchausen que tentou sair do pântano puxando o próprio cabelo! Enquanto os partidos insistem em apresentar propostas milagrosas de retomada do crescimento econômico, para dar uma sobrevida ao pacto de 1988, os sinais de desagregação do tecido social brasileiro se avolumam. O país flerta com o caos. Talvez a próxima grande mobilização nacional seja pelo direito à eutanásia, não das pessoas, mas das instituições que estão apodrecendo e são verdadeiros mortos-vivos.
Para terminar com um toque final de esperança, vale lembrar as palavras de Steve Jobs: “A morte é muito provavelmente a principal invenção da vida. É o agente de mudança da vida. Ela limpa o velho para abrir caminho para o novo”.
Referências:
ALVES, JED. O déficit orçamentário e a dívida pública que o próximo governo (2019-2022) vai herdar, Ecodebate, 23/05/2018
https://www.ecodebate.com.br/2018/05/23/o-deficit-orcamentario-e-a-divida-publica-que-o-proximo-governo-2019-2022-vai-herdar-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/
https://www.ecodebate.com.br/2018/05/23/o-deficit-orcamentario-e-a-divida-publica-que-o-proximo-governo-2019-2022-vai-herdar-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/
ALVES, JED. Brasil: quatro décadas de baixo crescimento econômico, sendo duas décadas perdidas, Ecodebate, 16/05/2018
https://www.ecodebate.com.br/2018/05/16/brasil-quatro-decadas-de-baixo-crescimento-economico-sendo-duas-decadas-perdidas-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/
https://www.ecodebate.com.br/2018/05/16/brasil-quatro-decadas-de-baixo-crescimento-economico-sendo-duas-decadas-perdidas-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/
ALVES, JED. Brasil: país submergente, Ecodebate, 15/07/2015
http://www.ecodebate.com.br/2015/07/15/brasil-pais-submergente-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/
http://www.ecodebate.com.br/2015/07/15/brasil-pais-submergente-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/
Marcos Lisboa. Para resolver crise, teremos que rever direitos adquiridos. El País, 23/07/2017
https://www.insper.edu.br/noticias/marcos-lisboa-as-reformas-afetam-a-grupos-de-interesses-nao-a-sociedade-toda/
https://www.insper.edu.br/noticias/marcos-lisboa-as-reformas-afetam-a-grupos-de-interesses-nao-a-sociedade-toda/
José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 30/05/2018
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