Brasil e África do Sul são coadjuvantes no grupo B-RIC-S e na nova ordem mundial, artigo de José Eustáquio Diniz Alves
[EcoDebate] A 10ª Cúpula do BRICS, grupo que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, acontecerá entre os dias 25 e 27 de julho de 2018, no Centro de Convenções de Joanesburgo, na África do Sul, com a presença dos cinco chefes de Estado do bloco. Foram convidados também para a reunião, os governantes de nove nações africanas e chefes de Estado e de governo de países de outras regiões.
A primeira reunião formal do grupo BRICS aconteceu em 2009, na Cúpula de Ecaterimburgo, na Rússia. Mas o termo BRIC foi inventado, em 2001, pelo economista Jim O’ Neill, do banco de investimento Goldman Sachs, com o objetivo de orientar as empresas e os investidores mundiais como ganhar dinheiro com os grandes países “emergentes” do mundo: Brasil, Rússia, Índia, China. O termo fez grande sucesso, mas no acrônimo original não havia nenhum país da África, o que foi corrigido incluindo a maior economia do continente que é a África do Sul (South África). Assim, o termo BRIC ganhou uma letra a mais, se transformando em BRICS.
O gráfico acima mostra que havia certa proximidade na participação do PIB de cada país do BRICS no PIB mundial, na virada do milênio. Em 2001, o PIB da China representava 7,8% do PIB global, o da Índia representava 4,3%, da Rússia 3,4%, Brasil 3,1% e África do Sul 0,7%, segundo dados do FMI, de abril de 2018, em poder de paridade de compra (ppp, na sigla em inglês). Mas as diferenças aumentaram nos anos seguintes. Em 2018, O PIB da China passou para 18,7% do PIB mundial, a Índia passou para 7,7%, a Rússia caiu para 3,1%, o Brasil caiu para 2,5% e a África do Sul caiu para 0,6%. O PIB conjunto do BRICS subiu de 19,3% do PIB global em 2001 para 32,6% em 2018, sendo que o PIB do RIC passou de 15,5% para 29,5%, no mesmo período. Ou seja, enquanto o RIC quase dobrou de tamanho, a soma de Brasil e África do Sul caiu de 3,8% em 2001, para 3,1% em 2018.
Em termos de renda per capita (em ppp), a Rússia sempre apresentou os maiores valores, em segundo lugar vinha o Brasil, depois a África do Sul, seguido da Índia e a China com a menor renda per capita durante toda a década de 1980. Em 2018, a Rússia continuava com a maior renda per capita, mas a China assumiu o segundo lugar, deixando Brasil e África do Sul para o terceiro e quarto lugar. A Índia está em quinto lugar, mas apresenta o crescimento mais acelerado da renda per capita em todo o período e pode ultrapassar o Brasil e a África do Sul na década de 2020.
Portanto, pelo tamanho do PIB e pelo desempenho econômico dos últimos anos, o Brasil e a África do Sul são coadjuvantes no BRICS, pois o protagonismo tem sido assumido pelo RIC (Rússia, Índia e China). Este subgrupo central do BRICS forma o que se convencionou chamar de “Triângulo estratégico”, que busca unificar a Eurásia em um grande bloco econômico e político que pode deslocar a hegemonia global do Ocidente para o Oriente.
O Brasil e a África do Sul também são coadjuvantes no G20 que inclui o G7 (Estados Unidos, Japão, Alemanha, Reino Unido, França, Itália e Canadá) e mais 12 países ditos “emergentes”: China, Índia, Rússia, Indonésia, Brasil, México, Turquia, Coréia do Sul, Arábia Saudita, Austrália, Argentina e África do Sul (além da União Europeia). A próxima reunião do G20 será na Argentina, entre 30 de novembro e 01 de dezembro de 2018.
Em reunião ministerial do G20, em Buenos Aires, dia 21/07, Christine Lagarde, diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional, alertou para a possibilidade de uma redução do crescimento ou recessão global, no máximo em 2020, devido ao crescente protecionismo, com efeitos mais drásticos nos chamados países frágeis, que inclui Brasil e África do Sul. Na reunião, os ministros das Finanças do G-20 evitaram palavras mais fortes, mas ficou clara a tensão entre EUA, China e União Europeia. O secretário do Tesouro norte-americano, Steven Mnuchin, disse que seu país espera “que a China avance no sentido de um comércio mais equilibrado”. Realmente o alto endividamento público e privado e os desequilíbrios comerciais ameaçam a estabilidade internacional e o próximo encontro do G20, daqui 4 meses, não será nada fácil.
Neste contexto global, se destaca o grupo RIC – o triângulo estratégico – que faz parte do BRICS e do G20. Mas o RIC também é o núcleo central da Organização de Cooperação de Xangai (OCX), composta por oito membros plenos, que são China, Rússia, Cazaquistão, Quirguistão, Tadjiquistão, Uzbequistão, Índia e Paquistão. Do ponto de vista global e de influência na Eurásia, a OCX é maior e mais dinâmica do que o BRICS. Na 18ª cúpula da OCX, ocorrida nos dias 9 e 10 de junho de 2018, na cidade de Qingdao, o presidente Xi Jinping disse: “A cúpula de Qingdao é um novo ponto de partida para nós. Juntos, vamos içar a vela do Espírito de Xangai, quebrar ondas e iniciar uma nova viagem para nossa organização”.
No mês de julho de 2018, a Rússia deu dois passos para aumentar a sua influência internacional. O primeiro foi a realização da Copa do Mundo de Futebol que foi bem organizada e atraiu a atenção global para as riquezas das culturas russa e eslava. O segundo passo foi a realização da Cúpula entre Vladimir Putin e Donald Trump, em Helsinque, no dia 16 de julho. Se os finalistas da Copa do Mundo tivessem sido Rússia e Estados Unidos, Putin teria não só vencido a disputa, mas teria sido escolhido a revelação do torneio, o craque da Copa e o goleador do campeonato mundial. Enquanto Putin saia do isolamento ocidental e era reconhecido como estadista pela maior “Potência Ocidental” e pelo “País líder do mundo livre”, Trump chegou na Finlândia depois ter feito críticas duras à OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte) e ter deixado perplexo seus aliados históricos e líderes da Ocidentalização.
Evidentemente, a Rússia sozinha não tem tanto poder de fogo na economia internacional. Mas junto com a China, o país mais extenso do mundo se torna uma grande potência e a China não está mais escondendo o seu jogo. Por exemplo, o presidente chinês, antes da reunião do BRICS em Joanesburgo, realizou um giro pela África para consolidar o papel da China como um dos aliados econômicos e diplomáticos mais próximos do continente. Depois de uma breve parada no Golfo Pérsico, o itinerário de Xi – sua primeira viagem ao exterior desde o início de seu segundo mandato como líder máximo – abarca o Senegal, Ruanda, África do Sul e Maurício, abrangendo quase todos os cantos da África Subsaariana, mostrando que a influência econômica chinesa e as suas ambições estratégicas estão crescendo a cada ano.
O valor das transações bilaterais entre China e África somam mais de US$ 250 bilhões, valor superior a toda a pauta de exportações brasileiras com o mundo. A nova visão estratégica da China passa pela crescente presença mundial por meio do investimento em infraestrutura, compra de empresas e terras nos diversos países, conquista no acesso às matérias-primas, exportação de capitais e exportação de mercadorias, com fortalecimento de políticas mercantilistas.
Reportagem da rede CNN, em 21 de julho de 2018, repercute o pensamento de Michael Collins, oficial da CIA, que em fala no Fórum de Segurança de Aspen, durante uma sessão sobre a ascensão da China, disse que o presidente chinês Xi Jinping e seu regime estão travando uma “guerra fria” contra os EUA e que o objetivo das operações de influência da China em todo o mundo é substituir os Estados Unidos como a principal superpotência do mundo.
Estas afirmações de um diretor da CIA, que, sem dúvida, são reais, são também preocupantes, pois reforçam a guerra comercial que já avança de vento em popa entre EUA e China e, ao mesmo tempo, caminham no sentido de aumentar as possibilidades de um conflito bélico entre as duas grandes potências, como formulado na abordagem da “Armadilha de Tucídides”.
Desta forma, não só no BRICS, mas também neste novo cenário geopolítico global, a China se torna a nação protagonista e a Rússia e a Índia se tornam aliados do protagonismo triangular do grupo RIC. Consequentemente, Brasil e África do Sul são apenas coadjuvantes, o que não quer dizer que serão necessariamente fantoches e que não possam ter papel importante para defender uma ordem global justa, democrática, pacífica e com prosperidade social e ambiental.
José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 25/07/2018
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