O consumo supérfluo da água engarrafada é um desastre ambiental, por Henrique Cortez
[EcoDebate] A indústria da água engarrafada é uma das atividades que mais crescem no mundo, mesmo diante de uma grande crise financeira global. O competente marketing da indústria fixou no inconsciente das pessoas o mito de que a água engarrafada é mais segura e saudável.
Mas, se ignorarmos o mito, veremos que consumir água engarrafada, onde a água da rede é tratada e potável, é uma injustificável insanidade ambiental.
No Brasil, é um mercado de 9 bilhões de litros ao ano, com um crescimento anual de 10%. Em termos mundiais, em 2017, foram consumidos 329 bilhões de litros de água engarrafada.
Não existe consumo sem impacto ambiental e com a água engarrafada não é diferente. O consumo responsável e o consumismo alienado podem ser diferenciados pelo impacto do consumo e pela sua sustentabilidade. A água engarrafada é, essencialmente, ambientalmente insustentável.
Bem, o mito, já incorporado ao inconsciente coletivo, diz que a água mineral natural é mais segura e saudável do que a água tratada de torneira. Será?
A água tratada de torneira é captada em águas superficiais, recebendo tratamento de filtragem e adição de cloro, o que a faz potável. O tratamento, no entanto, não elimina eventuais contaminações por metais pesados e agrotóxicos, por exemplo.
Ao longo do sistema de distribuição pode ser contaminada pela má qualidade das adutoras/tubulação ou nas caixas d’água.
A água mineral natural é captada em fontes subterrâneas e não recebe qualquer tipo de filtragem ou tratamento. Em geral contem mais sais minerais do que a água tratada.
Em termos reais, esta é a única vantagem da água mineral sobre a tratada.
As fontes subterrâneas e os aquíferos também podem e frequentemente são contaminados por metais pesados e agrotóxicos. Além disto, não recebendo tratamento e adição de cloro, a água mineral natural pode ser contaminada por bactérias.
A potabilidade da água tratada distribuída pelas concessionárias é rigorosamente acompanhada pelos órgãos ambientais. O mesmo já não é necessariamente verdade em relação às centenas de engarrafadoras.
Não são raras as notícias de que fontes e engarrafadoras de água mineral são interditadas em razão da contaminação por bactérias.
Existem muitos problemas de qualidade, tais como cor e sabor, na água tratada, mas pelo simples fato de que ela é tratada já a faz mais segura do que a natural engarrafada.
Isto sem falar que, em termos de R$/Litro, a água tratada chega às nossas casas por menos de R$ 0,05 por litro.
Em outra perspectiva a água engarrafada possui impactos ambientais muito maiores do que a tratada.
Segundo a Universidade de Queensland, os efeitos ambientais do uso de água engarrafada são extensos. Embora a maioria das garrafas possa ser reutilizada ou reciclada, a maioria das garrafas de plástico atualmente produzidas é fabricada com tereftalato de polietileno virgem (PET). O plástico é composto de combustíveis fósseis não renováveis, que são um recurso finito, e o uso deste produto incentiva a mineração que tem impactos ambientais associados. Há um grande consumo de energia na captação, transporte da água e também no tratamento da água na fábrica de engarrafamento. O consumo de energia adicional ocorre na produção da garrafa e na limpeza, enchimento, vedação, rotulagem e refrigeração das garrafas. Por fim, é necessária energia para transportar a garrafa para os varejistas e depois para o consumidor. A energia total necessária na produção de água engarrafada é de 5,6 a 10,2 MJ por litro, comparativamente à água da torneira, que normalmente requer 0,005 MJ por litro no tratamento e distribuição.
É relevante o impacto óbvio, mas desprezado pelos consumidores, que é a própria garrafa PET como resíduo. No Brasil, pouco mais de 55% das garrafas PET são destinadas à reciclagem, o que significa dizer que bilhões de garrafas entupirão nossos rios e mananciais, ou sobrecarregarão os aterros sanitários.
Enfim, a água engarrafada não é, de fato, mais segura ou saudável, é muito mais cara do que a água tratada e seus impactos ambientais são significativos.
Então, consumir por que mesmo?
Henrique Cortez, editor da revista eletrônica EcoDebate, é jornalista e consultor especializado em meio ambiente
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 05/12/2019
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 05/12/2019
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