OCDE e África: diferentes dinâmicas demográficas, econômicas e de emissão de CO2, artigo de José Eustáquio Diniz Alves
“Na África estamos sofrendo a crise climática agora”
Vanessa Nakate (12/12/2019)
[EcoDebate] No dia 22 de abril de 2020 o mundo comemora os 50 anos do Dia da Terra. Estavam programadas grandes manifestações de rua em todo o mundo, porém a pandemia de covid-19 impediu aglomerações, diante da emergência global de saúde pública. Contudo, a emergência climática e ambiental não passou e mesmo que a paralisação das atividades produtivas e a quarentena tenha reduzido as emissões de gases de efeito estufa o modelo de desenvolvimento continua intrinsecamente ligado ao consumo de combustíveis fósseis. Indubitavelmente, mesmo diante do isolamento social, devemos aproveitar o Dia da Terra para discutir a questão das mudanças climáticas.
A humanidade tem usado a atmosfera como uma lixeira onde despeja a poluição das suas atividades econômicas. As emissões globais de CO2 que estavam em 2 bilhões de toneladas em 1900, passaram para 6 bilhões de toneladas em 1950, chegaram a 25 bilhões de toneladas no ano 2000 e atingiram 36 bilhões de toneladas em 2017. Em consequência a concentração de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera aumentou de aproximadamente 277 partes por milhão (ppm) em 1750, para 300 ppm em 1920, 350 ppm em 1987, 400 ppm em 2015 e deve ultrapassar 410 ppm em 2019. Na primeira década do século XXI, a concentração de CO2 aumentava 2 ppm ao ano e passou a aumentar 2,5 ppm ao ano na atual década. O mundo caminha para uma situação inusitada e dramática, acelerando o processo de aquecimento global e suas consequências.
Os últimos 6 anos foram os mais quentes já registrados e a década 2011-20 é a mais quente da série histórica. O Planeta está com febre e não está apenas esquentando, mas aquece a taxas crescentes e num ritmo alucinado. Por isso, o aquecimento global não é um problema como outro qualquer, mas sim o evento que engloba e potencializa todos os demais e obriga a humanidade a repensar suas prioridades diante da possibilidade de um armagedon ecológico. Indubitavelmente, uma catástrofe ambiental será o prenúncio de uma catástrofe social. Se as temperaturas continuarem subindo de forma acelerada o mundo pode chegar à situação denominada “Terra Estufa”, onde diversas áreas do Planeta se tornariam inóspitas e inabitáveis.
As consequências devastadoras do aquecimento global deixaram de ser uma agrura prevista para o futuro e se transformaram em “emergência climática”, presente no cotidiano das atuais gerações. O desequilíbrio já assola o Planeta de Leste a Oeste e de Norte a Sul – em graus diferenciados – e causa danos crescentes, embora esteja apenas em seu começo. Seguindo as tendências das últimas décadas, a Terra caminha para um “ponto de inflexão global” (alguns dizem que já ultrapassou o ponto de não retorno) que pode ser o início de um efeito dominó – capaz de gerar uma série de acontecimentos desagradáveis em cascata. A catástrofe climática está no horizonte e só será evitada se forem adotadas ações concretas para reduzir e zerar as emissões de gases de efeito estufa.
Nos séculos XIX e XX, foram os países com economias fortes e ricas os principais responsáveis pelas emissões de gases de efeito estufa (GEE). Mas no século XXI, são os países em desenvolvimento (principalmente China e Índia) que mais emitem GEE. Os países em desenvolvimento também apresentam as maiores taxas de crescimento populacional e econômico.
O gráfico acima sintetiza o comportamento da população, do Produto Interno Bruto (PIB) e das emissões de CO2 em dois períodos selecionados: os últimos 40 anos do século XX (1959-99) e os primeiros 16 anos do século XXI (2000-16) para a OCDE (grupo de países majoritariamente de alta renda) e da África (majoritariamente países de renda baixa). As emissões per capita foram de 9,8 toneladas na OCDE e de 1,1 toneladas na África. Mas os dois grupos de países possuem diferentes dinâmicas demográficas, econômicas e de emissão de CO2.
Na África, tanto o crescimento populacional, quanto econômico e quanto das emissões foi maior nos dois períodos. Entre 1959 e 1999, a população da África cresceu a uma taxa de 2,6% ao ano, o PIB cresceu 4,1% ao ano e as emissões cresceram 4,4% ao ano. No período seguinte, entre 2000 e 2016, houve uma pequena redução do ritmo demográfico para 2,4% ao ano, mas houve aumento do crescimento da economia para 4,5% ao ano. As emissões de CO2 cresceram 2,5 ao ano.
Já na OCDE, tanto a população, quanto o PIB, reduziram o ritmo de crescimento entre os dois períodos e houve decrescimento das emissões de CO2 entre os anos 2000 e 2016, em função de mudanças na população (envelhecimento, urbanização, etc.) e mudanças tecnológicas no padrão de produção e consumo e na matriz energética.
É claro que a OCDE continua emitindo muito mais CO2 do que a África. Em 2018, as emissões totais da OCDE foram de 12,7 bilhões de toneladas e da África foram de 1,4 bilhão de toneladas. Contudo, no século XXI, a OCDE está conseguindo reduzir as emissões em 0,4% ao ano, enquanto as emissões da África estão crescendo a 2,5% ao ano. Se o ritmo das emissões africanas continuarem no decorrer do atual século a África terá emissões totais de CO2 em 2100 maiores do que as emissões atuais da OCDE.
Os dados acima mostram a gravidade da situação ambiental e social. Evidentemente, a África precisa reduzir a pobreza e garantir uma melhor qualidade de vida para seus habitantes. Porém, precisam respeitar o meio ambiente e evitar um agravamento da situação climática. Assim, enfrentar a questão demográfica é fundamental e vale a pena levar em consideração o alerta dos entendidos na questão climática.
Mais de 11 mil cientistas de todo o mundo publicaram, no dia 05 de novembro de 2019, na Revista BioScience, um alerta sobre a ameaça de uma iminente catástrofe ambiental e declararam que o Planeta está enfrentando uma emergência climática. Entre os “sinais vitais” apresentados está a questão do crescimento demoeconômico.
O documento diz: “O crescimento econômico e populacional está entre os mais importantes fatores do aumento das emissões de CO2 em decorrência da combustão de combustíveis fósseis”. E afirmam: “Ainda crescendo em torno de 80 milhões pessoas por ano, ou mais de 200.000 por dia, a população mundial precisa ser estabilizada e, idealmente, reduzida gradualmente”.
José Eustáquio Diniz Alves
Colunista do EcoDebate.
Doutor em demografia, link do CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/2003298427606382
Colunista do EcoDebate.
Doutor em demografia, link do CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/2003298427606382
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