As cores da população idosa no Brasil, artigo de José Eustáquio Diniz Alves
A população brasileira tem se percebido de maneira mais miscigenada e menos predominantemente branca, embora haja diferenças entre os diversos grupos etários.
A proporção de pessoas que se autoidentificam com a cor branca tem diminuído nos anos 2000 em todas as idades. Para o conjunto da população, o número de indivíduos que se autodeclaram pardos ultrapassou aqueles que se autodeclaram brancos. Mas entre os idosos, a autodeclaração de brancos ainda abarca a maioria dos habitantes com 60 anos e mais de idade, como mostrou o censo 2022.
O IBGE investiga o quesito cor ou raça da população brasileira a partir do critério de autoidentificação. São apresentadas 5 categorias de escolha: Branca – para a pessoa que se declara branca; Preta – para a pessoa que se declara preta; Amarela – para a pessoa de origem do leste asiático (japonesa, chinesa, coreana, etc.); Parda – para a pessoa que se identifica com a mistura ou miscigenação de duas ou mais opções de cor ou raça; Indígena – para a pessoa que se declara indígena, morando ou não em terras indígenas.
Dentro de cada domicílio visitado pelo IBGE, o informante responde não só a sua percepção sobre a sua cor ou raça, como também responde para os outros membros da moradia. A escolha é subjetiva, pois não existe um critério biológico ou uma palheta de cores pré-definidas. Segundo o manual do censo demográfico, existirem vários critérios que podem ser usados pelo informante para a classificação (origem familiar, cor da pele, traços físicos, etnia, pertencimento comunitário, entre outros). Desta forma, as cinco categorias estabelecidas na investigação (branca, preta, amarela, parda e indígena) podem ser entendidas pelo informante de forma variável no tempo e no espaço e de acordo com as opções individuais.
O gráfico abaixo mostra que, para o total da população brasileira, a percentagem de pessoas que se autodeclaravam brancas era de 53,7% no ano 2000, caiu para 47,7% em 2010 e diminuiu ainda mais em 2022, para 43,5%. A percentagem de pardos subiu de 38,5% em 2000, para 43,1% em 2010 e 45,3% em 2022. Portanto, a autodeclaração de pardos superou a autodeclaração de brancos no último censo. O Brasil tem se enxergado mais miscigenado.
Os dados acima evidenciam que, até o ano 2000, a maior parte da população brasileira se autodeclarava branca. Mas este quadro mudou no século XXI, principalmente depois da Conferência Mundial das Nações Unidas contra o Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e a Intolerância. A Conferência de Durban, de 2001, impulsionou a criação de políticas públicas para o enfrentamento ao racismo. Houve uma grande mobilização da sociedade brasileira e das políticas públicas no país no sentido de valorizar os direitos da população preta, parda e indígena. Houve uma mobilização pelo orgulho negro (população negra = preta + parda), pelos direitos dos povos originários e uma valorização do processo de miscigenação.
Desta forma, muitas pessoas que se autodeclaravam brancas passaram a se declarar pardas e muitas pessoas que se declaravam pardas passaram a se declarar pretas. Houve um processo de “desbranqueamento” do Brasil. Os habitantes do país passaram a enxergar a cor/raça de um espectro diferente, valorizando mais a miscigenação e a variedade dos tons não brancos.
Assim, o percentual de pessoas que se autodeclaram pretas passou de 6,2% no ano 2000, para 7,6% em 2010 e para 10,2% em 2022. Enquanto, a população total cresceu 6,5% entre 2010 e 2022, a população que se autodeclara preta cresceu 42,3% no mesmo período. A população que se autodeclara amarela (de origem oriental) ficou em torno de 0,4% entre 2000 e 2022. A população indígena que estava em torno de 0,4% na primeira década do século XXI, passou para 0,6% em 2022, sendo o grupo que apresentou o maior crescimento absoluto entre 2010 e 2022 (mais de 50% de aumento absoluto).
O gráfico abaixo mostra os mesmos dados do gráfico anterior, mas para a população de 60 anos e mais de idade. A percentagem de idosos que se autodeclaravam brancos era de 60,7% no ano 2000, caiu para 55,9% em 2010 e chegou a 51,7% em 2022. Portanto, a autodeclaração de brancos continua majoritária no topo da pirâmide etária.
A percentagem de idosos que se autodeclaram pardos subiu de 30,4% em 2000, para 34,6% em 2010 e 37,3% em 2022. A presença de pardos entre os idosos é menor do que na população total. O percentual de idosos que se autodeclaram pretos passou de 7,0% no ano 2000, para 7,8% em 2010 e para 9,9% em 2022. A presença de pretos entre os idosos é semelhante ao que ocorre na população total. O percentual de idosos que se autodeclaram amarelos ficou em torno de 0,8% e o percentual de indígenas entre os idosos ficou em 0,4%. Isto indica que a população amarela (de origem do leste asiático) possui uma estrutura etária mais envelhecida e a população indígena possui uma estrutura etária mais rejuvenescida.
Há, pelo menos, duas possíveis explicações para a maior proporção de autodeclaração de brancos na população idosa, quando comparada com a população de 15 a 59 anos. A primeira, diz respeito às políticas de ação afirmativa que são mais voltadas para a população adolescente e adulta, especialmente nas áreas de educação e mercado de trabalho.
A segunda explicação tem a ver com a questão especificamente da cor, pois, em um país tropical, com o avanço da idade as pessoas tendem a ficarem menos expostas ao sol e com cabelos mais prateados, o que pode aumentar, proporcionalmente, a autodeclaração de brancos.
Sem dúvida, a forma como as pessoas vivenciam suas percepções de etnia e cor varia com a região, a interação social, os gêneros e as gerações. Todas as cores importam. Nas últimas duas décadas, o orgulho da pluralidade da cor da pele está aumentando e os preconceitos estão diminuindo. O Brasil está ficando mais multifacetado na declaração de cor e com maior reconhecimento do processo de miscigenação que faz parte da história do país.
O fundamental é que haja respeito e uma convivência fraternal e pacífica entre todas as pessoas na construção de um país sem discriminações e segregações, com liberdade para que cada habitante se expresse na sua singularidade, em meio à saudável unidade da diversidade.
José Eustáquio Diniz Alves
Doutor em demografia, link do CV Lattes:
http://lattes.cnpq.br/2003298427606382
Referências:
ALVES, JED. Demografia e Economia nos 200 anos da Independência do Brasil e cenários para o século XXI (com a colaboração de GALIZA, F), ENS, maio de 2022
https://ens.edu.br:81/arquivos/Livro%20Demografia%20e%20Economia_digital_2.pdf
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in EcoDebate, ISSN 2446-9394
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