Cresce movimento global contra a exploração não convencional de petróleo e gás por fraturamento hidráulico (fracking)
Países, estados, províncias e municípios mundo afora têm se mobilizado para banir a prática, que contamina águas rasas e subterrâneas, impacta a produção e a saúde da população, além de intensificar as mudanças climáticas
O movimento contra o fracking, técnica para exploração não convencional de petróleo e gás, principalmente de xisto, tem ganhado força em diversas regiões do planeta. Recentemente, mais um país da União Europeia baniu definitivamente o método. Em uma conquista emblemática, a Irlanda se juntou à França, Alemanha e Bulgária na vanguarda climática, aprovando uma lei que proíbe o fraturamento hidráulico em terra. A onda anti-fracking também tem crescido na América Latina. Somente no Brasil, mais de 350 cidades já aprovaram leis que proíbem a prática, protegendo o subsolo, a água e a saúde de suas populações.
Graças à campanha Não Fracking Brasil, coordenada pela 350.org Brasil e pela COESUS – Coalizão Não Fracking Brasil pelo Clima, Água e Vida, prefeitos, vereadores, voluntários e lideranças de entidades e movimentos sociais de diversos municípios estão mobilizados e tem ajudado a disseminar as informações sobre essa tecnologia altamente poluente, que utiliza mais de 600 substâncias químicas, cancerígenas e até radioativas misturadas a água para extrair o gás do folhelho de xisto de grandes profundidades.
“A campanha teve início em 2013, quando a Agência Nacional de Petróleo e Gás (ANP) leiloou os primeiros blocos para exploração não convencional pelo método do fracking. Desde então, realizamos centenas de audiências públicas, seminários, palestras e encontros para informar sobre os riscos e perigos do fracking, e a importância de nos mobilizarmos para impedir que essa prática, que já devastou outros países como os Estados Unidos e a Argentina, avance em nosso país”, afirmou Juliano Bueno de Araujo, coordenador de Campanhas Climáticas de 350.org e um dos fundadores da COESUS.
Dos 15 estados brasileiros na rota do fracking, o Paraná é o que concentra o maior número de áreas mapeadas e em fase de pesquisa sísmica para exploração não convencional. Dos 339 municípios, 122 entraram na 12ª Rodada de Licitações realizada em 2013, e outros 154 estão na lista para os próximos leilões. “Conseguimos mobilizar a população e sensibilizar o Ministério Público Federal, que obteve em 2014 liminar cancelando o leilão. Com essa medida mais de 5 milhões de paranaenses ficaram protegidos”, lembrou Juliano.
Há ainda a Lei Estadual 18.947/2016, que comprova o pioneirismo do Paraná. Aprovada pela Assembleia Legislativa do Estado após intensa articulação da COESUS e 350.org Brasil junto aos parlamentares, ela suspende por 10 anos o licenciamento para operações de fracking.
“A proibição no estado do Paraná foi uma grande conquista, mas ainda precisamos expandir essa lei para o restante do país, e de forma permanente. O Brasil tem retrocedido em termos de emissões no setor energético e de florestas – mesmo o governo tendo prometido nacional e internacionalmente combater o aquecimento global de forma ‘inadiável’. Enquanto isso, outros países mundo afora avançam. Estamos perdendo uma grande oportunidade de liderar esse processo, apostando em energias alternativas e migrando para uma economia de baixo carbono”, declarou Nicole Figueiredo de Oliveira, diretora da 350.org Brasil e América Latina.
Diante dos efeitos comprovadamente irreversíveis à saúde da população e do ambiente, o fracking está sendo banido em diversos países e em outros a legislação está sendo revista. Estudos já comprovaram que o fraturamento hidráulico causa terremotos, elimina a biodiversidade, causa doenças como câncer, provoca infertilidade nas mulheres, aumenta a mortalidade infantil, além de intensificar as mudanças climáticas.
“O governo brasileiro está na contramão da história ao insistir em leiloar novos poços para fracking no país, o que certamente prejudicará a agricultura, as florestas, os rios e todos os ecossistemas. O Brasil não precisa do fracking. Há recursos naturais suficientes para a geração de energia limpa e renovável, como a solar e eólica, para ser exemplo para o mundo no desinvestimento em combustíveis fósseis”, frisou Nicole.
Avanço na América Latina
Outros países da América Latina também têm sido alvo da indústria do fracking. Já foram mapeadas áreas para exploração na Bolívia, Chile, Colômbia, Venezuela, Paraguai, Uruguai, Argentina e México, sendo estes dois últimos, junto com o Brasil, os que contam com as maiores reservas de gás de xisto no continente.
Nos países onde já está sendo desenvolvido, o fracking tem avançado sobre comunidades indígenas, ribeirinhas, camponesas, bairros urbanos e áreas protegidas. Isso resulta no deslocamento de pessoas e no impacto direto a atividades produtivas, como pecuária e agricultura. As comunidades afetadas não têm respeitados os seus direitos humanos mais fundamentais, tais como a consulta e o consentimento livre, prévio e informado; o direito à participação social, à informação e o direito a um ambiente saudável e equilibrado.
Em paralelo, não são raras as reclamações sobre danos causados por incêndios, vazamentos, explosões, poluição da água, do ar e do solo por resíduos tóxicos, descarte de substâncias radioativas nos poços e nas reservas de água subterrâneas.
Uma das maiores ameaças na América do Sul hoje é a fronteira de Entre Ríos, na Argentina, e o Uruguai, na região do Chaco Paranaense. Nesta região fica o Aquífero Guarani, a terceira maior reserva subterrânea de água doce do mundo e a principal da América do Sul, que abastece cerca de 55 milhões de pessoas.
Pensando em proteger essa rica fonte de água doce e as populações que dela dependem, a iniciativa de parceria contra o fracking que tem trazido bons resultados ao Brasil foi expandida também para países vizinhos como Uruguai e Argentina, onde foi criada a Coalizão Latino-americana contra o Fracking pela Água, Clima e Agricultura Sustentável.
No Uruguai, cinco províncias já aprovaram leis para banir a técnica – Paysandú, Tacuarembo, Salto, Rocha e Artigas –, além da província de Maldonado, onde a proposta já está em tramitação. Na Argentina, a província de Entre Ríos foi a primeira a aprovar a proibição.
Do 350.org Brasil e pela COESUS, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 01/08/2017
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