Dia da Sobrecarga da Terra (Earth Overshoot Day): 01 de agosto de 2018, artigo de José Eustáquio Diniz Alves
“É triste pensar que a natureza fala e que a humanidade não a ouve”
Victor Hugo
[EcoDebate] A cada ano, a humanidade esgota mais cedo a cota apropriada da riqueza natural do planeta. Com base em estatísticas oficiais de 150 países, a Global Footprint Network registra que entre o dia primeiro de janeiro e primeiro de agosto de 2018, os humanos utilizaram toda a biocapacidade anual do Planeta. Ou seja, o dia 01 de agosto de 2018 é o Dia da Sobrecarga da Terra (Earth Overshoot Day), do corrente ano.
Este dia marca o momento em que o sistema de produção e consumo absorveu todos os insumos naturais oferecidos pelo planeta, previstos para os 12 meses do ano. Portanto, o dia 01 de agosto é o dia em que a civilização global sai do verde do superávit ambiental para entrar no vermelho do déficit ambiental.
No restante do ano, a civilização estará em déficit do cartão de crédito e terá de recorrer à herança deixada por milhões de anos de evolução da natureza. Significa que as atuais gerações dilapidarão as condições de vidas das demais espécies vivas da Terra e comprometendo o futuro das próximas gerações de humanos.
O cálculo da Sobrecarga é feito a partir de duas medidas realizadas para se avaliar o impacto humano sobre o meio ambiente e a disponibilidade de “capital natural” do mundo. A Pegada Ecológica é uma metodologia de contabilidade ambiental que permite avaliar a demanda humana por recursos naturais, com a capacidade regenerativa do planeta. A Pegada Ecológica de uma pessoa, cidade, país ou região corresponde ao tamanho das áreas produtivas de terra e mar necessárias para gerar produtos, bens e serviços que utilizamos. Ela mede a quantidade de recursos naturais biológicos renováveis (grãos, vegetais, carne, peixes, madeira e fibra, energia renovável entre outros) que estamos utilizando para manter o nosso estilo de vida.
O cálculo é feito somando as áreas necessárias para fornecer os recursos renováveis utilizados e para a absorção de resíduos. É utilizada uma unidade de medida, o hectare global (gha), que é a média mundial para terras e águas produtivas em um ano. A Pegada Ecológica serve para avaliar o impacto que o ser humano exerce sobre a biosfera. A Biocapacidade avalia o montante de terra e água, biologicamente produtivo, para prover bens e serviços do ecossistema à demanda humana por consumo, sendo equivalente à capacidade regenerativa da natureza.
O dia da Sobrecarga de um país é a data em que a Terra ultrapassaria a biocapacidade global se toda a humanidade consumisse como as pessoas neste determinado país. Por exemplo, a Pegada Ecológica per capita do Brasil é de 3,07 gha e a Biocapacidade da Terra é de 1,68 gha. Se toda a população mundial consumisse como o brasileiro médio daria (3,07/1,68) = 1,83 Terras. O Dia da Sobrecarga do Brasil seria 365 * (1,68/3,07) = 200º dia do ano. Isto corresponderia ao dia 19 de julho. O gráfico acima mostra os Dia da Sobrecarga conforme a Pegada Ecológica de cada país.
O fato é que a cada ano o mundo atinge mais cedo o ponto de Sobrecarga e passa mais tempo no déficit ambiental, como pode ser visto no gráfico abaixo. No início da década de 1970 existia equilíbrio entre a Pegada Ecológica e a Biocapacidade e a humanidade ficava dentro do orçamento de um Planeta. Mas em 1975 o dia da Sobrecarga chegou no dia 01 de dezembro. Na virada do milênio o dia da Sobrecarga estava ao redor do dia 01 de outubro e em 2018, o Dia da Sobrecarga da Terra será no dia 01 de agosto.
Portanto, a humanidade já ultrapassou a capacidade de carga da Terra e a cada ano esgota antecipadamente os recursos previstos para os doze meses do calendário. O Planeta, como astro físico, vai continuar por muito tempo girando ao redor do sol, mas boa parte da vida terrestre pode desaparecer precocemente em função do egoísmo, da avareza e da ambição humana que degrada os ecossistemas e reduz a biocapacidade da Terra. A “gula” humana tem crescido em função da “desnutrição” das demais espécies vivas do Planeta.
Enriquecer a dieta e o consumo antrópico às custas da perda da biodiversidade e da capacidade de regeneração do meio ambiente é uma maneira insustentável de se relacionar com a natureza. Este desequilíbrio pode gerar um colapso geral de grandes proporções, provocando a extinção em massa das espécies e o fim da civilização, pois o ecocídio é também um suicídio.
José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 04/07/2018
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