domingo, 5 de março de 2023

A "VENDA CASADA" NAS REDES SOCIAIS.

 artigo de opinião

A ‘venda casada’ nas redes sociais, artigo de Montserrat Martins

Vários autores já constataram (desde Freud em “Psicologia das Massas”) que o comportamento das pessoas em grupo tende a inibir a autocrítica individual

Venda casada” é o armazém lhe obrigar a comprar feijão junto, se você precisa de arroz, o que aconteceu durante o governo Sarney, quando produtos escasseavam, para aumentar os preços. Foi vedada a venda casada de produtos, mas ela segue existindo no campo das ideias,nas redes sociais: se você acredita em uma coisa é pressionado para “comprar” outras ideias pelos grupos que as difundem.

Se você é contra o governo da Venezuela, por exemplo, teria de ser a favor de uma ditadura militar no Brasil, sendo que, aliás, o que a Venezuela vive é uma espécie de ditadura militar. Se você é a favor das vacinas, tem de ser a favor da descriminalização da maconha? Se você defende mais policiamento nas ruas, porque temos sérios problemas de segurança, tem de negar que o racismo e a homofobia são problemas graves da nossa sociedade? Porque situações diferentes são colocadas em “pacotes ideológicos” para aderir, como uma venda casada de ideias?

As polêmicas sobre comportamento estão no auge, no Brasil, mas isso é relativamente recente aqui, cresceram nos últimos 20 anos, enquanto já são debatidas com veemência há uns 60 anos nos Estados Unidos e na Europa. Isso você pode constatar nos diálogos dos filmes, desde que eclodiram movimentos sociais como os “hippies” americanos ou o famoso “maio de 68” europeu.

Se for contra o aborto, você tem de ser a favor da pena de morte? Os debates vão às últimas consequências, você tem de ter opinião sobre tudo, tem de formar convicção não só sobre costumes, mas até situações de vida ou morte. Mas por que as pessoas teriam de “aderir em bloco” a esses conjuntos de pautas estabelecidos por ideologias políticas, porque não poderiam acreditar em algumas demandas de algum grupo e em outras de outros grupos? Por que a pressão pela adesão incondicional?

A resposta é que isso funciona, em grande parte, pela necessidade de pertencimento, já amplamente estudada por psiquiatras e psicólogos. Vários autores já constataram (desde Freud em “Psicologia das Massas”) que o comportamento das pessoas em grupo tende a inibir a autocrítica individual, o que é um perigo, por exemplo, nos estádios de futebol, ou na formação de grupos que marcam brigas pela internet.

Se cada assunto fosse debatido por si mesmo, sem a cobrança de adesão a pautas preestabelecidas, talvez fosse mais fácil evoluirmos, chegarmos a alguns consensos sociais mínimos. Mas temos de ser aceitos pelo nosso grupo, mesmo que essa necessidade seja inconsciente.

Montserrat Martins, Médico Psiquiatra

 

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in EcoDebate, ISSN 2446-9394

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