segunda-feira, 4 de agosto de 2014

ENGENHO DA GALILÉIA.


A terra como instrumento de poder e a formação dos sindicatos rurais (as ligas camponesas)
O Brasil entrou no século no século XX com uma economia calcada no modelo agroexportador e sem alterar sua estrutura fundiária.
O acesso à terra continuou sendo um grande problema para as massas despossuídas da sociedade brasileira. Com a proclamação da República, em 1889, que defendia a autonomia dos Estados, as terras devolutas e as questões relativas à terra em cada unidade da Federação brasileira passaram para o âmbito dos governos estaduais. Com isso o uso da propriedade da terra como instrumento de poder tornou-se mais generalizado: as oligarquias empossadas nas administrações estaduais podiam distribuir as terras públicas segundo seus interesses e conveniências, inclusive com fins políticos. Os “coronéis” (no caso, os donos de vastas propriedades), em termos locais e regionais, possuíam até mesmo forças repressivas privadas (tropas de jagunços ou capangas) prontas para sufocar qualquer ameaça ao status quo ( estados atual). Como eram eles que davam sustentação política ao governo federal, este, em troca, tolerava seus mandonismos locais e regionais.
Ao longo de nossa história verificam-se diversas manifestações, movimentos, revoltas e pressões de trabalhadores rurais pelo acesso à terra. Todavia, durante muito tempo a história oficial, escrita pelos dominadores, procurou mostrar um país sem lutas, sem conflitos, sem contradições, caracterizando ou rotulando as lutas sociais no campo como movimentos messiânicos, de origem religiosa, quando não, restringindo-se ao cangaço, visto este como banditismo.
Com a Revolução de 1930, a oligarquia rural ficou politicamente enfraquecida, situação que foi altamente favorável à organização e à articulação dos movimentos sociais no campo ou para as lutas políticas dos trabalhadores rurais.
No decorrer dessa década, o baixo preço do açúcar no mercado externo levou muitos proprietários de engenho do Nordeste a forar suas terras e viver de sua renda. Mas, no período que se seguiu ao fim da Segunda Guerra Mundial (1945), o preço do açúcar subiu e os antigos banguês (engenhos ou engenhocas) sofreram transformações técnicas, dando origem às usinas de açúcar. Para que o usineiro alargasse o plantio e a produção de cana-de-açúcar, muitos foreiros foram expulsos dos sítios que tinham formado havia dezenas de anos. A crise social, que no Nordeste já era grande, aprofundou-se ainda mais, gerando em consequência conflitos.
Alguns foreiros recorreram à Justiça. Um caso que muito repercutiu foi o dos foreiros do Engenho Galiléia, em Pernambuco, sob a orientação do próprio feitor, chamado de Zezé da Galiléia, que resistiram em sair da terra. O proprietário do engenho entrou com uma ação de despejo na Justiça. Para defenderem seus direitos, os foreiros procuraram o advogado Francisco Julião, que na época era deputado estadual pelo Partido Socialista. Este assumiu a causa e, em janeiro de 1955, legalizou a Sociedade Agrícola e Pecuária dos Plantadores de Pernambuco, fundada pelos foreiros do Engenho Galiléia, entidade cujo objetivo , por estranho que possa parecer, era possuir recursos financeiros para adquirir caixões mortuários.
Essa sociedade passou a ser conhecida em todo o Brasil – e no exterior – com o nome de “liga camponesa”, usado pela classe dominante com o intuito de dar-lhe uma conotação de movimento social e político suspeito, pois, no passado, trabalhadores dos canaviais de outros pontos do Nordeste haviam tentado organizar sindicatos rurais para reivindicar seus direitos com esse nome (provavelmente por inspiração nos movimentos sociais da Idade Média, quando parte do campesinato europeu se organizou para lutar contra a exploração dos senhores feudais).
Francisco Julião conseguiu aprovar um projeto de lei que desapropriava o Engenho Galiléia e o transformava num núcleo de colonização. Numa Assembléia Estadual dominada pelos representantes dos interesses do grande proprietário de terras, a aprovação do projeto de lei foi uma grande vitória dos trabalhadores rurais. A partir daí os movimentos sociais no campo se alastraram. Em 1960, as ligas camponesas já possuíam associados em 26 municípios do Estado de Pernambuco e tinham se espalhado pelos demais estados do nordeste. Formavam grupos de pressão e de luta contra o monopólio da terra e a exploração de sua força de trabalho.
Fonte : Melhen Adas e Sergio Adas

Um comentário:

Paulo disse...

Excelente artigo. é bom ver novas gerações de brasileiros resgatando o passado. Que continua presente.