As diferenças no jeito de ser, artigo de Montserrat Martins
Acho fascinante ver como as pessoas percebem diferente, interpretam diferente e tem reações diferentes diante dos mesmos fatos.
Não existe uma “realidade objetiva” na vida que seja observada por todos, os seres humanos se caracterizam pela subjetividade. Isso é importante, porque muitas discussões seriam evitadas com o respeito às diferenças, já que não existem duas pessoas iguais, nem mesmo gêmeos idênticos tem a mesma personalidade. Muito raro se chegar a consenso em discussão de casal, ou entre pais e filhos, ou mesmo no ambiente de trabalho ou em brincadeiras de amigos, no fim cada um tira suas próprias conclusões.
Agora imagine se você fosse japonês, ou chinês, ou alemão, ou russo, ou tivesse nascido num país muçulmano, sua forma de perceber e pensar seria muito diferente do que é, fortemente influenciada pela sua cultura, pela criação. Dentro do próprio Brasil existem diferenças imensas, há no mínimo cinco “jeitos de ser” regionais dentro desse imenso país-continente, que Darcy Ribeiro classificou como o Brasil sertanejo (do interior nordestino), o caboclo (amazônico), o crioulo (do litoral do nordeste e sudeste), o caipira (do interior do sudeste e do centro-oeste) e o sulino. Mas ele não foi o primeiro, foi José de Alencar o escritor pioneiro em descrever os tipos psicológicos “geográficos”, que dedicou romances a cada tipo regional.
“O Gaúcho” é um livro fascinante de José de Alencar, surpreendente por ele ser um cearense e desvendar tão profundamente a psicologia sulista, mostrando a amizade do protagonista com o cavalo, a personalidade forte e individualista, os brios e o senso de dever e de honra, a seriedade, o espírito aventureiro, num tom intimista que é basicamente um livro sobre a psicologia do gaúcho, em especial o do interior do estado. Sim, porque já é bem diferente o jeito de ser nas regiões metropolitanas – e mesmo de uma região do interior do estado para outra. Não há como resumir aqui a psicologia intimista do gaúcho no literatura de Alencar, mas vale o registro da excelência da obra. Um romance que, em profundidade, lembra Shakespeare.
A psicologia de cada região está nos livros de José de Alencar, em “O Sertanejo” mostra o nordestino, em “O Guarani” o indígena, em “O Tronco do Ipê” a vida na zona da mata fluminense, em “Senhora” a crescente vida urbana do Rio, em “Til” a vida no interior paulista.
“Aprenda com os outros, pois a vida é muito curta para consertar todos os erros que você pode cometer” é um bom lema para ser feliz. A Literatura ajuda, quando aprendemos com as histórias e personagens dos livros. Nessa Era Rasa, de fotos no Instagram e 280 caracteres no twitter, Literatura é uma terapia profunda.
Montserrat Martins é Psiquiatra
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 30/09/2021
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