Pesquisa mostra desconhecimento na percepção pública da atuação dos direitos humanos
Cerca de um terço das pessoas aponta que quem mais se beneficia dos direitos humanos são “os bandidos”, e 40% acreditam que quem menos se beneficia são “os mais pobres”.
A ONU Mulheres, em parceria com o Instituto Ipsos, lançou a pesquisa “Percepção Social sobre Mulheres Defensoras de Direitos Humanos”, com o objetivo de compreender a percepção da população brasileira sobre os direitos humanos, as pessoas que os defendem e se a desigualdade de gênero afeta essa percepção.
A pesquisa foi realizada em 2021 em cinco regiões do Brasil e contou com 1,2 mil entrevistadas e entrevistados de diferentes religiões, idades, raças e classes sociais.
Cerca de um terço das pessoas respondentes aponta que quem mais se beneficia dos direitos humanos são “os bandidos”, e 40% acreditam que quem menos se beneficia são “os mais pobres”.
Estes números revelam um potencial desequilíbrio na percepção pública da atuação dos direitos humanos, que aparentam favorecer, segundo essa perspectiva, mais uma parte da sociedade do que outra.
Os números da pesquisa também variam entre os quesitos conhecimento, favorabilidade e imagem de quem defende direitos. A maioria (61%) declara conhecer pouca coisa, nada ou quase nada sobre os direitos humanos.
Apesar de 72 anos terem se passado desde a Declaração Universal dos Direitos Humanos e as centenas de convenções e normas internacionais que orientam a implementação desses direitos, ainda é difuso o conhecimento sobre eles no Brasil. Prova disso são os resultados da pesquisa lançada pela ONU Mulheres em parceria com o Instituto Ipsos nesta sexta-feira (9), que tem como objetivo compreender a percepção da população brasileira sobre os direitos humanos, as pessoas que os defendem e se a desigualdade de gênero afeta essa percepção.
Os dados levantados nas regiões Sudeste, Nordeste, Sul, Centro-Oeste e Norte entre fevereiro e março de 2021 apontam que apenas 7% das e dos respondentes conhecem “muito” sobre o assunto. No entanto, mesmo com o nível de conhecimento declarado baixo, o percentual de pessoas favoráveis ao conceito é alto em todos os grupos demográficos (86% de favorabilidade), mas especialmente alta entre jovens de 18 a 24 anos. Ou seja, apesar do desconhecimento de muitas brasileiras e brasileiros sobre o que são, de fato, direitos humanos, boa parte da população se diz favorável a eles.
Quando questionados e questionadas acerca do entendimento particular do assunto, as respostas apontam, principalmente, para o conceito da igualdade de direitos entre as pessoas. Outro conjunto de respostas são as associações de direitos humanos a serviços públicos básicos, como saúde e educação e a defesa das pessoas mais empobrecidas. Essa associação pode estar vinculada ao reconhecimento da falta de acesso a esses direitos básicos por parcela significativa da população.
Cerca de um terço das pessoas respondentes aponta que quem mais se beneficia dos direitos humanos são “os bandidos”, e 40% acreditam que quem menos se beneficia são “os mais pobres”.
Estes números revelam um potencial desequilíbrio na percepção pública da atuação dos direitos humanos, que aparentam favorecer, segundo essa perspectiva, mais uma parte da sociedade do que outra. Ao mesmo tempo, sugere a percepção da vulnerabilidade da parcela mais pobre da população, que, dentro do contexto atual, é vista como desprovida de quaisquer direitos.
Há uma forte compreensão da necessidade de universalidade dos direitos humanos, já que 94% concordam com a frase “todas as pessoas, sem distinção, devem ter seus direitos humanos garantidos”. Existe, contudo, a percepção que os direitos humanos não são aplicados de forma universal: metade da amostra não se sente defendida por esses direitos. Metade (50%) concorda que “os direitos humanos não defendem pessoas como eu”, contra 41% que discordam e 8% que não concordam nem discordam.
Defensores – Os números da pesquisa também variam entre os quesitos conhecimento, favorabilidade e imagem de quem defende direitos. A maioria (61%) declara conhecer pouca coisa, nada ou quase nada sobre os direitos humanos.
Este percentual está fortemente relacionado ao grau de instrução e classe social. O desconhecimento é maior nas classes C1 (43%) e C2 (49%) e entre as pessoas com ensino fundamental (41%) e ensino médio (48%). O levantamento também apresenta que a maioria (72%) tem uma visão positiva das pessoas que defendem esses direitos : grande parte dos entrevistados e entrevistadas concorda com a frase “Muitos avanços sociais só foram possíveis devido aos esforços de mulheres que lutam pelos Direitos Humanos (89%).
Mas, também, um terço das pessoas participantes concorda que a imagem associada a essas pessoas são as de mulheres radicais e intransigentes. Esse percentual é afetado por diferenças na faixa etária do respondente: quanto maior a faixa de idade, menor a proporção de respondentes que mantém uma imagem positiva. Neste sentido, a faixa etária da população mais jovem, de 18 a 24 anos, é desproporcionalmente mais propensa a ter uma imagem positiva dos defensores: 88% afirmaram que tem uma imagem mais positiva em relação às pessoas que defendem os direitos humanos ante 72% do total da amostra.
Segundo a ONU, defensora de direitos humanos é toda mulher que atua pela promoção ou proteção dos direitos humanos e toda pessoa que defende os direitos humanos das mulheres ou trabalha pela igualdade de gênero. Apesar de a contribuição dessas mulheres para a democracia e uma sociedade mais justa, a atuação de defensoras de direitos humanos no Brasil tem, desde sempre, sido confrontada pela violência. As causas estruturais dessa violência remontam não apenas aos interesses conflitantes em relação às mais diversas pautas em que atuam, mas também ao desvio em relação aos papéis e expectativas sociais tradicionalmente reservados às mulheres.
Os direitos humanos, por sua vez, são fundamentais para as sociedades democráticas e é dever do Estado não só garantir que estejam formalmente previstos nas leis, mas também criar condições para que toda a população possa ter acesso, de fato, a eles. Um aspecto positivo apontado pela pesquisa é a valorização da universalidade dos direitos humanos: 94% concordam com a frase “todas as pessoas, sem distinção, devem ter seus direitos humanos garantidos”. Essa concordância, contudo, apresenta algumas nuances importantes: enquanto o reconhecimento da igualdade se estende para a igualdade de gênero, isso não se confirma para a orientação sexual. 93% das pessoas concordam com a frase “Eu me considero uma pessoa que defende a igualdade de direitos e oportunidades para mulheres” atingiu 93% de concordância das opiniões, a frase “casais homossexuais devem ter os mesmos direitos que casais heterossexuais” obteve 76% de concordância total; 4% da amostra não concordam nem discordam, 19% discordam e 2% não souberam responder.
Direitos Humanos e Democracia – “A discussão sobre direitos humanos é uma pauta crescente no mundo e no Brasil. O debate é extenso, mas fundamental para fortalecer a democracia”, coloca a gerente de projeto na ONU Mulheres Brasil, Debora Albu. A fim de saber o que a população tem conhecimento em torno do assunto, foi aplicada uma sequência de perguntas que contrastavam duas ideias antagônicas, avaliando a inclinação da e do respondente quanto aos direitos humanos e democracia. Quase um terço das pessoas entrevistadas respondeu que “os direitos humanos enfraquecem a democracia no Brasil” (32%) ao invés de fortalecer. E 80% das pessoas entrevistadas responderam que “o governo brasileiro não garante integralmente os direitos humanos da população”. Os resultados indicam que há tanto uma percepção negativa da aplicação dos direitos humanos como uma baixa participação do Estado como garantidor desses direitos. Quando questionados sobre qual entidade é a mais responsável por garantir os direitos humanos, o “Estado brasileiro” aparece ocupando o 5º lugar entre seis, ficando à frente apenas das “empresas privadas”. O conjunto dos resultados indica que o Estado brasileiro não conserva o papel de guardião desses direitos.
A igualdade de gênero está na base da construção de uma sociedade livre de preconceitos e discriminações em que homens e mulheres devem ser livres para fazer as suas escolhas e desenvolver as suas capacidades pessoais sem a interferência ou limitação de estereótipos. Sobre ela, a pesquisa aponta um forte favorecimento. A igualdade de direitos entre homens e mulheres foi reconhecida na concordância com a frase “homens e mulheres devem ter salários iguais quando exercem as mesmas funções” (96%). O apoio à igualdade também foi manifestado por 83% que discordam da afirmativa “Prefiro que cargos políticos, como presidente, governador, prefeito, deputado, sejam comandados por homens” e por 82% que discordam da ideia de que “as mulheres não devem a mesma liberdade que os homens”. Não foram observadas diferenças significativas nos recortes demográficos, exceto para a essa última pergunta – sobre a liberdade das mulheres – em relação à qual houve maior concordância entre pessoas de 60 anos ou mais de idade (22%), classe DE (23%) e ensino fundamental (25%).
“A compreensão da sociedade acerca dos direitos humanos e da atuação das mulheres que trabalham para que eles sejam promovidos e garantidos a todas e a todos é fundamental para o enfrentamento de desigualdades estruturais, sobretudo no Brasil. Neste sentido, a pesquisa “Percepções Sociais Sobre Mulheres Defensoras de Direitos Humanos No Brasil” traz apontamentos valiosos para a atuação de defensoras e defensores de direitos humanos e de profissionais das mais diversas categorias que atuam em prol da garantia de direitos”, reforçou Debora.
A pesquisa foi realizada em parceria com o Instituto Ipsos no escopo projeto “Conectando Mulheres, Defendendo Direitos”, implementado pela ONU Mulheres em parceria com a União Europeia para apoiar as mulheres defensoras de direitos humanos no Brasil em seus esforços para promover e sustentar suas estratégias de prevenção e resposta a violações de direitos humanos e violências contra mulheres e meninas.
in EcoDebate, ISSN 2446-9394
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