A ampliação do grupo BRICS, artigo de José Eustáquio Diniz Alves
*A expansão do BRICS vai trazer “novo vigor” aos países em desenvolvimento concorrentes dos países capitalistas avançados. Novas adesões devem ocorrer nos próximos anos.
O termo BRIC foi inventado pelo economista Jim O’ Neill, do banco de investimento Goldman Sachs, em 2001, com o objetivo de orientar as empresas e os investidores mundiais no sentido de obter lucro com os grandes países “emergentes” do mundo: Brasil, Rússia, Índia, China. Estes quatro países estão entre aqueles da comunidade internacional com maior território ou maior população. O termo fez grande sucesso, especialmente no período do superciclo das commodities. A primeira cúpula do BRIC aconteceu em 2009, na cidade de Ekaterinburgo, na Rússia.
Mas no acrônimo original não havia nenhum país da África, o que era politicamente incorreto e deixava todo um continente de fora. Então foi incluída a África do Sul (South África) e o termo BRIC ganhou uma letra a mais, se transformando em BRICS. Assim, dois anos depois, durante a terceira cúpula, em Sanya (China), a África do Sul passou a fazer parte do bloco. Os cinco países do grupo BRICS são muito heterogêneos e não tinham muitos pontos de unidade, além de já fazerem parte do G20 (vinte maiores economias do mundo). Portanto, havia dúvidas sobre a viabilidade e o espaço de consolidação do BRICS na governança global.
O G20 foi fundado em 1999, após a crise financeira asiática, como um fórum para os Ministros das Finanças e Governadores dos Bancos Centrais discutirem questões econômico e financeiras globais. A partir de 2008, após a crise econômica internacional iniciada com a quebra do banco Lehman Brothers, as Cúpulas do G20 passaram a ser compostas pelos Chefes de Estado e o bloco passou a ser o principal fórum para a cooperação econômica internacional.
O G20 é composto por 19 países (Argentina, África do Sul, Austrália, Arábia Saudita, Brasil, Canadá, China, Coreia do Sul, França, Alemanha, Índia, Indonésia, Itália, Japão, México, Rússia, Reino Unido, Estados Unidos e Turquia) mais a União Europeia. Os membros do G20 representam cerca de 85% do PIB global, mais de 75% do comércio global e cerca de dois terços da população mundial.
Mas, no contexto da crescente rivalidade entre a China e os EUA e após a ocupação da Península da Crimeia pela Rússia, em 2014, o grupo BRICS passou a ser visto por muitos analistas como uma sigla geopolítica em contraponto à hegemonia do G7 – o grupo dos 7 maiores países capitalistas (EUA, Japão, Alemanha, Reino Unido, França, Itália e Canadá). Todos os países do G7 também participam do G20.
Em termos de tamanho populacional, o BRICS sempre foi muito maior do que o G7 e, nos últimos anos, já havia ultrapassado também em tamanho do Produto Interno Bruto (PIB). O gráfico abaixo, com dados do FMI, em poder de paridade de compra, mostra que, na década de 1980, o G7 representava mais de 50% do PIB global e o grupo BRICS representava pouco mais de 10% (não havia dados da Rússia). Nas décadas seguintes, o G7 encolheu e o BRICS se ampliou. Em 2020, cada um dos grupos tinha cerca de 30% do PIB global. A perspectiva para o final da atual década é o G7 com menos de 30% do PIB global e o BRICS com mais de 33%.
Na 15ª cúpula do grupo BRICS, que aconteceu em Joanesburgo, de 21 a 23 de agosto de 2023, o presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa, anunciou a entrada de 6 novos membros. Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Argentina, Egito, Irã e Etiópia foram convidados a entrar no grupo como membros plenos a partir de 1º de janeiro de 2024. Com isso, o grupo passa a ter 11 membros, com maior presença do Oriente Médio, da África e da América Latina.
O gráfico abaixo mostra a participação dos 11 países do BRICS ampliado no PIB global e a mesma comparação anterior com o grupo G7. Nota-se que o tamanho econômico dos países “emergentes” sobre os países ricos se amplia. Em 2023, o PIB do BRICS 11 representa 36,7% do PIB global, enquanto o G7 representa 29,9%. Em 2028, deve ficar em 38,3% contra 27,8%.
Evidentemente, a ampliação do grupo fortalece o BRICS em relação ao G7 e mesmo em relação ao G20. Ficou de fora a Indonésia que é o 4º maior país do mundo em termos demográficos. Mas houve a inclusão de países que não pertencem ao G20, como Emirados Árabes Unidos, Egito, Etiópia e Irã. Destes, a inclusão do Irã no mesmo grupo que participa a Arábia Saudita é uma novidade. Recentemente, com a intermediação da diplomacia chinesa, o Irã e a Arábia Saudita, os dois grandes produtores de petróleo e rivais políticos no Oriente Médio, concordaram em restabelecer relações e reabrir suas respectivas embaixadas. A presença do Irã no BRICS 11 fortalece a China e enfraquece os EUA e o G7.
Existe muito debate quanto à ampliação do BRICS e o que isto representa para a correlação de forças internacionais. Alguns analistas dizem que a ampliação do BRICS vai fortalecer o multilateralismo e garantir maior direito de voz aos países em desenvolvimento. O bloco ampliado com 11 países, apelidado de Brics Plus, poderia alcançar 42% da economia global antes de 2040, o dobro dos 21% do G7. Sem dúvida, a liderança Ocidental sairia enfraquecida.
Outros analistas consideram que a expansão do BRICS se encaixa na disputa entre o “Consenso de Washington” versus o “Consenso de Beijing” (Alves, 2010). Ou seja, os países do G7 seriam mais orientados pelo livre mercado e pelas instituições da democracia burguesa e os países do BRICS 11 (liderados pela China) seriam mais orientados pela intervenção estatal e pelas instituições iliberais.
Indubitavelmente, a expansão do BRICS vai trazer “novo vigor” aos países em desenvolvimento concorrentes dos países capitalistas avançados. Novas adesões devem ocorrer nos próximos anos. Com efeito, o “Sul Global” sai fortalecido. Mas não será simples coordenar as ações do BRICS, especialmente porque os dois grandes países, em termos populacionais e econômicos – a China e a Índia – não se entendem em vários assuntos e possuem estratégias geopolíticas diferenciadas.
Decerto, não há um denominador comum entre os 11 países do BRICS plus. Nem há uma transparente formulação quanto aos objetivos a serem alcançados. Muita coisa ainda vai ser definida nos próximos anos.
A única certeza é que não chegamos ao fim da história e que não existe um regime político único que irá prevalecer nas próximas décadas do século XXI.
José Eustáquio Diniz Alves
Doutor em demografia, link do CV Lattes:
http://lattes.cnpq.br/2003298427606382
Referências:
ALVES, JED. O Consenso de Beijing e a mudança de hegemonia, Ecodebate, 16/03/2010
http://www.ecodebate.com.br/2010/03/16/o-consenso-de-beijing-e-a-mudanca-de-hegemonia-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/
ALVES, JED. A ascensão da China, a disputa pela Eurásia e a Armadilha de Tucídides. Entrevista especial com José Eustáquio Diniz Alves, IHU, Patrícia Fachin, 21 Junho 2018
http://www.ihu.unisinos.br/159-noticias/entrevistas/580107-a-ascensao-da-china-a-disputa-pela-eurasia-e-a-armadilha-de-tucidides-entrevista-especial-com-jose-eustaquio-diniz-alves
[ Se você gostou desse artigo, deixe um comentário. Além disso, compartilhe esse post em suas redes sociais, assim você ajuda a socializar a informação socioambiental ]
in EcoDebate, ISSN 2446-9394
Nenhum comentário:
Postar um comentário