Após morte de cinegrafista, Senado tenta acelerar "lei antiterror"
Com o apoio de petistas, o projeto de lei prevê reclusão de até 30 anos para quem "provocar o pânico generalizado" em eventos como a Copa.
A reportagem é de Paloma Rodrigues e publicada por Carta Capital, 12-02-2014.
Tramita no Senado uma proposta para tipificar o crime de terrorismo no Brasil. O Projeto de Lei 499, de 2013, que deve ser tratado como prioridade depois da morte do cinegrafista Santiago Andrade, aponta como crime inafiançável “provocar ou infundir terror generalizado”, “terrorismo contra coisa”, e estabelece como grupo terrorista a reunião de três ou mais pessoas “com o fim de praticar o terrorismo”.
Em entrevista a CartaCapital, o senador Jorge Viana (PT-AC), um dos defensores do projeto, diz que, com a aproximação de eventos do porte da Copa do Mundo e das Olimpíadas de 2016, é "imprescindível" a aprovação de uma lei antiterrorismo no Brasil. “A lei hoje permite que o cidadão exploda primeiro, atinja a cabeça de alguém, solte um rojão e depois é que nós vamos ver o que fazer com ele. Não dá para ter uma ação preventiva de impedir que ele carregue aquele material que coloca em risco os manifestantes, a estrutura do Estado e a própria União?”, questiona o senador. “Estamos tendo 50 mil assassinados por ano no Brasil. Até quando a sociedade vai ser tolerante com a violência, inclusive nas próprias manifestações?”
Segundo Viana, apesar de o Brasil já ter tipificado em outras leis crimes como homicídio e formação de quadrilha, uma legislação que consolide todas essas ações é necessária. “Uma coisa que não funciona é lei demais e desorganizada, é preciso que haja consolidação. A lei hoje não funciona, porque são elementos que já foram presos uma, duas vezes e continuam lá”.
A lei antiterrorismo prevê penas de 8 a 20 anos para quem promover o "terror" em estações de trem, instituições de ensino e prédios do Poder Executivo, além de outros serviços essenciais. Em caso de incitar o terrorismo, a pena é de 3 a 8 anos e, para quem provocar ou difundir o terrorismo de alguma forma, a pena pode ser de 15 a 30 anos de reclusão. Em caso de morte, a pena vai de 24 a 30 anos.
Entre os beneficiados pela nova lei, segundo o senador, estariam os manifestantes e as próprias manifestações, que poderão acontecer sem ataques à imprensa e à sociedade. "A imprensa desde o ano passado vê elementos que dizem 'não queremos imprensa aqui'. E a imprensa protege, ela representa os olhos da sociedade, ela vê o policial e o manifestante”, diz Viana.
O texto do projeto de lei não explicita quais os elementos são necessários para que se identifique quem está provocando ou infundindo terror generalizado. Há temores de que a subjetividade de interpretação poderia por em risco movimentos sociais, habituados a expor suas pautas nas ruas, mas Viana rejeita essa possibilidade. “A lei está sendo debatida dentro do Congresso e de uma maneira que não pode permitir, nem de longe, a restrição aos movimentos sociais e a manifestações políticas. Ao contrário, se tiver esse risco é melhor não ter lei”.
Para o senador Paulo Paim (PT-RS), que defende a urgência da votação (sem análise das comissões especiais), não há motivos para o temor da criminalização da livre manifestação. "Casos menos graves não poderão ser tipificados como terrorismo, o pessoal está extrapolando. Essa é uma intenção apenas de proteger. Por exemplo, se você está com uma bomba de dinamite dentro de um estádio algo precisa ser feito", diz. "Eu percebo que há uma certa discordância em relação a debater esse tema, dentro e fora do Senado. A ampla maioria é favorável, 99% acha que deve ser feito, mas sempre tem alguém que acredita que não, mas eu acredito que ninguém deve impedir esse debate de acontecer."
"Eu, em plena ditadura, participei de dezenas de manifestações e não havia nenhum tipo de agressão. Eu saí de Canoas com cinco mil pessoas e chegamos a Porto Alegre com 30 mil pessoas, ninguém foi agredido e nenhuma janela foi quebrada", diz Paim. "Por que a máscara? Eu enfrentava a ditadura e nunca tapei o rosto. Quem defende causas e não coisas e não está ali para fazer o mal não tem que ter medo", completou ele.
Na prática, o senador afirma que será considerado terrorista aquele que extrapolar os limites da manifestação, portando armas de fogo e explosivos, que ameacem a vida coletiva. Segundo ele, a grande discussão é como "garantir o movimento pleno de pressão e ao mesmo tempo garantir a segurança das manifestações".
O senador Jorge Viana concorda e diz acreditar que a lei não pode ser subjetiva. "Não se pode por em risco os direitos de manifestação. Se isso for ficar ameaçado, então é melhor não ter [a lei], mas eu estou me referindo às pessoas que vão às manifestações com rojões, foguetes e estilingues. Essas pessoas que estão mascaradas já foram presas uma, duas, três vezes." O procedimento seria "isolar os indivíduos" que geram risco à população por meio de uma segurança preventiva.
Essa prevenção, diz Viana, não ficaria a cargo das Forças Armadas, mas de forças de segurança especializadas no trato dos manifestantes. Uma logística clara para a ação não foi exposta pelo senador, mas ele afirma que esta é uma das maiores preocupações das discussões dentro do Senado. “Acho que precisamos ter um foco, que é livrar a sociedade dessa ameaça que são os indivíduos infiltrados nas manifestações, encontrar a dose certa da estrutura de segurança que possa garantir a segurança de todas as pessoas.”
Em entrevista coletiva, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), afirmou que “terrorismo não tem absolutamente nada a ver com isso que está acontecendo”. Ele defendeu, no entanto, o agravamento das punições aos envolvidos em crimes em manifestações. “Nós precisamos agravar as penas, punir exemplarmente, esclarecer e votar a legislação.”
Além de Paim e Viana, fizeram parte da comissão mista que desenvolveu o projeto os senadores Romero Jucá (PMDB-RR), Vital do Rego (PMDB-PB), Pedro Taques (PDT-MT), Aloysio Nunes (PSDB-SP), Antonio Carlos Rodrigues (PR-SP), Ana Amélia (PP-RS), Kátia Abreu (PSD-TO) e Waldemir Moka (PMDB-MS) e os deputados Candido Vaccarezza (PT-SP), Edinho Araújo (PMDB-SP), Eduardo Barbosa (PSDB-MG), Sergio Zveiter (PSD-RJ), Arnaldo Jardim (PPS-SP), Miro Teixeira (PROS-RJ), João Maia (PR-RN), Reinaldo Azambuja (PSDB-MS) e Moreira Mendes (PSD-RO).
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