sexta-feira, 16 de junho de 2017

INFOENEM :Análise do Tema da Redação do Vestibular UNESP 2017/2

Análise do Tema da Redação do Vestibular UNESP 2017/2

No último final de semana foi aplicada a segunda fase do vestibular de meio de ano de 2017 da UNESP – Universidade Estadual Paulista e, no domingo, dia 11 de junho, juntamente com as provas de Português e de Inglês foi aplicada a de Redação, cuja proposta analisaremos no texto de hoje.
prova de Linguagens e Códigos dos vestibulares da UNESP contém doze questões discursivas de Português (interpretação de texto, análise linguística e literatura) e de Inglês e uma proposta de redação cujo objetivo é a produção de uma dissertação. O tema da prova de redação do vestibular de meio de ano – ou de inverno – deste ano de 2017 foi “Prisão especial para portadores de diploma: afronta à Constituição?“.
A coletânea de textos desta proposta apresenta quatro excertos. O primeiro é o quinto artigo da Constituição de 1988, aquele que afirma que todos os cidadãos são iguais perante a lei, sem nenhuma distinção, e que todos têm direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança, à propriedade dentre outras coisas.
O segundo texto da coletânea, por sua vez, também é da esfera legislativa, mas do Código de Processo Penal, mais especificamente o artigo número 295 que dispõe acerca das condições a respeito da prisão em cela especial. Algumas pessoas, se preencherem determinados pré-requisitos, têm direito a aguardar o julgamento em celas especiais, separados dos demais detentos; são elas:
  1. os ministros de Estado;
  2. os governadores ou interventores de Estados ou Territórios, o prefeito do Distrito Federal, seus respectivos secretários, os prefeitos municipais, os vereadores e os chefes de Polícia;
  3. os membros do Parlamento Nacional, do Conselho de Economia Nacional e das Assembleias Legislativas dos Estados;
  4. os cidadãos inscritos no “Livro de Mérito”;
  5. os oficiais das Forças Armadas e os militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios;
  6. os magistrados;
  7. os diplomados por qualquer das faculdades superiores da República;
  8. os ministros de confissão religiosa;
  9. os ministros do Tribunal de Contas;
  10. os cidadãos que já tiverem exercido efetivamente a função de jurado […];
  11. os delegados de polícia e os guardas-civis dos Estados e Territórios, ativos e inativos.
É justamente neste artigo do Código de Processo Penal que há a menção de que as pessoas que possuem diplomas em qualquer curso de graduação, seja um bacharelado ou uma licenciatura, em qualquer instituição de ensino superior reconhecida, têm direito a aguardar o julgamento em cela especial.
Charge sobre cela especial para graduados.
Há, inclusive, um engano sobre isso que circula entre as pessoas que não têm conhecimento acerca da esfera legislativa, mais especificamente sobre o Direito Penal brasileiro: há quem acredite e afirme que apenas os diplomados nos cursos de Direito e Medicina têm o direito à prisão especial. Ao lermos o artigo acima, podemos comprovar que isso é mentira.
Antes de prosseguirmos na coletânea, podemos notar que entre os dois primeiros textos há uma certa incoerência, pois se todos são iguais perante a lei brasileira, segundo a Constituição, por que um grupo seleto de pessoas tem direito a uma cela especial antes do julgamento?
Em certos casos, como os dos delegados de polícia e os policiais civis, até podemos inferir que seria prejudicial à integridade física destes serem presos juntamente com as pessoas que um dia eles talvez trabalharam para prender, o mesmo risco talvez também exista para membros do alto escalão dos governos Federal, estaduais e municipais, principalmente atualmente, com tantas denúncias envolvendo políticos e corrupção.
Neste ponto, o candidato já poderia pensar se uma pessoa diplomada seria, no seu ponto de vista, superior a outra que não cursou uma faculdade e, por isso, não possui um diploma de ensino superior. E esta reflexão é fundamental, já que o tema desta proposta de redação questiona se o direito à prisão especial é uma afronta à Constituição e esta pergunta deve ser respondida, de maneira embasada, pelo candidato.
Voltando à coletânea textual, o terceiro texto, de autoria de Valquíria Padilha e Flávio Antonio Lazzarotto, esclarece que o direito à cela especial é concedido às pessoas diplomadas no ensino superior apenas antes do julgamento definitivo e se este resultar em condenação, o réu é enviado para uma cela comum, algo que é polêmico entre juristas, políticos e civis, ou seja, os cidadãos.
Os autores mostram duas opiniões favoráveis à prisão especial; a primeira a do jurista Basileu Garcia, ex-professor de Direito da Universidade de São Paulo (USP). Ele ainda afirma que as pessoas que possuem diploma de nível superior merecem uma “maior consideração pública pela sua educação”.
A segunda opinião é a do ex-procurador Arthur Cogan e este afirma que tal direito
[…] não é uma afronta à Constituição, já que a todos os cidadãos estão abertos os caminhos que conduzem à conquista das posições que dão aos seus integrantes a regalia de um tratamento sem o rigor carcerário.
Ou seja, para ele, todos os brasileiros teriam oportunidade de cursar uma faculdade, o que nós sabemos que, no Brasil, não é verdade, a não ser que o candidato acredite piamente em meritocracia.
quarto e último texto da coletânea é do jornalista e professor Leonardo Sakamoto. Para o autor, o direito à cela especial é mais uma faceta da desigualdade social e ele confronta o tema justamente com o quinto artigo da Constituição Federal de 1988, como fizemos anteriormente neste texto. Segundo Sakamoto, a prisão especial para portadores de diploma do ensino superior não faz nenhum sentido.
O autor lembra que muitas pessoas não chegam a se formar nem no ensino básico por conta da necessidade de trabalhar, outras precisam abandonar a faculdade por dificuldades em pagá-la e outras ainda decidiram não cursar uma graduação.
Nesse sentido, o educador português Tadeu Pacheco, inclusive, questiona a nomenclatura “ensino superior”, questionando que a faculdade seria superior à educação básica quando, na verdade, sem esta não haveria a primeira.
De acordo com a nossa leitura, o recorte temático desta proposta de redação, segundo os textos da coletânea textual, é o de que o direito à cela especial é uma afronta sim à Constituição, pois pode ser considerado algo discriminatório, já que viola o princípio de que todos somos iguais perante a lei.
Até a próxima semana!


*CAMILA DALLA POZZA PEREIRA é graduada e mestranda em Letras/Português pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). Atualmente trabalha na área da Educação exercendo funções relacionadas ao ensino de Língua Portuguesa, Literatura e Redação. Foi corretora de redação em importantes universidades públicas. Além disso, também participou de avaliações e produções de vários materiais didáticos, inclusive prestando serviço ao Ministério da Educação (MEC).
 
**Camila é colunista semanal sobre redação do nosso portal. Seus textos são publicados todas as quintas!

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