A razão e a importância das Reservas Extrativistas, artigo de Roberto Naime
[Ecodebate] As reservas extrativistas são áreas utilizadas por populações que mantém vínculos tradicionais, mantendo estilo de vida e forma de sustentação embasada por ações extrativistas, e complementarmente em agricultura de subsistência e na criação de animais de pequeno porte. Os objetivos são de consolidar a proteção dos meios de vida e das tradições culturais destas populações e assegurar e garantir a utilização em condições de sustentabilidade e equilíbrio, dos recursos naturais do sítio.
Em reservas extrativistas, eventuais áreas privadas existentes no domínio do geobiossistema identificado, devem ser desapropriadas e incluídas na unidade proposta, para garantir as condições de integridade que se pretende institucionalizar no local. As normas e diretrizes que regem as reservas extrativistas estabelecem que as mesmas sejam geridas por conselhos deliberativos, que sejam representativos das realidades locais e presididos pelo órgão responsável pela administração local. Integram a formação do órgão deliberativo, representantes de órgãos públicos, de organizações da sociedade civil e das populações locais em toda a diversidade exibida.
No Brasil, as reservas extrativistas de natureza federal, são administradas pelo Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio). E as reservas extrativistas são uma boa apropriação da realidade. Em tese permitem garantir preservação ambiental, compatibilizada com viabilidade econômica, e institucionalizar novos geobiossistemas integradores sobre uso e ocupação de territórios.
Visitação pública nestas áreas é permitida, mas desde que compatibilizada com as características locais e com as disposições dos planos de manejo específicos das áreas. Da mesma forma execução de prospecções de natureza científica devem ser conciliadas com as possibilidades locais e se adequar às condições e restrições que porventura sejam estabelecidas pela administração da unidade. Extração ou explotação de recursos minerais de qualquer espécie e atividades de caça, sejam amadorísticas ou profissionais são vedadas.
A extração madeireira segue as normas de manejo que garantam sustentabilidade da floresta. Esta é a mesma regra aplicada a exploração de todos os outros bens gerados pelo ecossistema florestal local. Por isso, reservas extrativas podem ser tão adequadas. Populações locais, vinculadas culturalmente e afetivamente ao local, que se sustentam com atividades extrativistas, podem se tornar grandes aliadas em atividades de preservação do equilíbrio na florestal, pois se sustentam de bens produzidos pelo ecossistema. A sinergia decorre do fato que ao proteger as populações, as mesmas auxiliam muito a proteger a floresta, de onde advém seu sustento.
Por isso, podem ser mais eficientes que exércitos de fiscais ou guardas-florestais. Mas neste contexto mais do que nunca, é absolutamente necessário a gestão adequada, com influentes e decisivas ações de governança de toda natureza.
Governança transcende a assistencialismo social. Conceito transposto da área empresarial, neste contexto significa mediar de forma sistêmica, os interesses envolvidos de todas as partes interessadas, buscando a máxima satisfação possível com a conciliação das demandas emergentes.
Reservas extrativistas são unidades de conservação permanentes, pertencentes ao agrupamento de uso sustentável e são espaços territoriais protegidos. A consolidação das áreas, ocorre pela implementação dinâmica e interativa, de seu plano de manejo, seus planejamentos de utilização e pelo incremento dos Contratos de Concessão de Direito Real de Uso, nos quais devem estar estabelecidas todas as regras de ocupação, uso e manutenção da área.
Obviamente, estes instrumentos fundamentais de gestão, devem ser elaborados com a íntima participação e interação permanente de todas as partes interessadas, residentes na área, no entorno, ou participantes permanentes da paisagem social.
As reservas extrativistas foram modelos criados buscando dotar de alternativas, os crescentes desmatamentos que se impunham na região da Amazônia Legal, transformando áreas de florestas com exuberantes biodiversidades, em campos de pastagens para o modelo extensivo de criação de gado. Que hoje é um modelo amplamente condenado pelo mercado consumidor. E vai acabar sendo um dia severamente afetado pelas restrições de comercialização, nas cadeias formadas pelas redes setoriais, e também pela ânsia das populações em transformarem seus gestos de consumo com atitudes de engajamento que percebem alinhadas com ações que beneficiem cenários de sustentabilidade.
A implantação das reservas extrativistas no Brasil, sofrem dos mesmos problemas que as demais efemérides no país, em todas as áreas consideradas. Há um certo despreparo observado, das estruturas públicas para desempenharem adequadamente suas funções, além da eterna falta de recursos de toda natureza. Mas isto não invalida e nem desmerece a adequação da iniciativa e da concepção. E além de tudo é preciso ressaltar que a criação destas entidades ainda é muito recente.
Toda equação econômica que se descortina, legitima e suporta a concepção de parceria entre populações tradicionais que tem amplamente preservada a floresta da qual dependem para sua subsistência, e as proposições naturais e funcionais dos órgãos de preservação ambiental. O modelo traz benefícios para as populações tradicionais e para os órgãos ambientais por ser uma alternativa realista para a conservação ambiental e por propiciar atendimento das demandas socioeconômicas viáveis para a comunidade local.
A constatação de que existe grande incremento sinérgico envolvido na proposição, e o reconhecimento de que populações bem organizadas podem obter melhores resultados do seu trabalho, atuando de forma coletiva, induz de maneira definitiva a busca de governança permanente que muito auxilia na construção de cooperativas e no estabelecimento de rotinas adequadas.
Normalmente, os produtos extraídos e gerados por uma Reserva Extrativista são látex, manejo sustentável da castanha, sementes florestais, extração de óleos de copaíba e andiroba e plantas medicinais, além de extração de madeira por manejo florestal comunitário. Este modelo parece por demais interessante, e merece ser aprimorado.
E, principalmente, governança deve ser incluída, de forma mais ampla possível, atendendo as óbvias demandas sociológicas e antropológicas que emergem claramente das primeiras implantações.
Dr. Roberto Naime, Colunista do Portal EcoDebate, é Doutor em Geologia Ambiental. Aposentado do corpo Docente do Mestrado e Doutorado em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale.
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in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 29/08/2019
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