segunda-feira, 27 de julho de 2020

GEOQUÍMICA URBANA E USO DOS SOLOS.

Geoquímica Urbana e Uso dos Solos
Artigo de Carlos Augusto de Medeiros Filho
Berlim
Figura 1 – Berlim (fonte: Pixabay)
[EcoDebate] As Nações Unidas preveem que, em 2050, cerca de 6,3 bilhões de pessoas estarão vivendo em regiões urbanas (Nações Unidas, 2015). O grande crescimento populacional tem diretamente impactado a cobertura e o uso da terra e tem também modificado o ciclo biogeoquímico de muitos elementos.
Thornton (1992) assinalou que a geoquímica urbana se refere às complexas relações e interações entre elementos químicos e seus compostos no âmbito urbano; as influências, nesse ambiente, das atividades humanas atuais e pretéritas e os efeitos dos parâmetros geoquímicos, na área urbana, na saúde humana, dos animais e plantas.
A contaminação por longo tempo é comprovadamente prejudicial à saúde e, consequentemente, é de grande importância documentar o legado da contaminação no sentido de saber como neutralizar ou eliminar as substâncias deletérias.
Os solos em áreas residenciais e centros industriais mostram um forte impacto antropogênico. A corrosão de objetos metálicos e a lixiviação de materiais de construção aumentam a concentração de metais no ambiente urbano e podem representar um risco para saúde humana. Por exemplo, Zn e Pb são liberados de materiais presentes em exteriores de edifícios como tijolos, tintas, concretos e metias galvanizados. Contaminação de metais são especialmente pronunciadas próximo a rodovias que recebem contaminantes de descargas de veículos (Pb, Mn), desgastes de pneus (Zn, Cd), corrosão de chapas de metais soldadas (V, Ce, Ni, Cr) e a combustão de óleos lubrificantes ( Cd, Cu, V, Zn, Mo). Acrescenta-se a presença de elementos do grupo da platina, como Pd, Pt e Rh, associados com conversores catalíticos (Chambers et al., 2016).
Os vários estudos geoquímicos nas regiões metropolitanas podem fornecer conclusões gerais para a conservação da natureza e proteção do solo, declarações de impacto ambiental e estimativas de poluição. Somente considerando a situação de toda a região, com a multiplicidade de influências sobrepostas de várias fontes, é possível derivar métodos para estimar os perigos da complexa mistura de substâncias e determinar a sensibilidade das paisagens aos usos da terra (Birke & Rauch, 2000). Dessa forma, na caracterização ou mapeamento geoquímico de solos na região urbana e no entorno de uma cidade, é fundamental, para avaliações confiáveis, a constituição de uma base de dados representativa, detalhada e uniformemente determinada. Esse banco deve abranger, por exemplo, dados geológicos, regolíticos, geomorfológicos, de uso e ocupação do solo e caracterização das atividades antropogênicas atuantes e dominantes.
Valores de medianas de As, Cd, Cr, Cu, Pb e Zn em zonas de bosque
Figura 2 – Valores de medianas de As, Cd, Cr, Cu, Pb e Zn em zonas de bosque, de alta densidade residencial e industrial de Berlim (fonte Birke & Rauch, 2000). Linhas pontilhadas valores de background para cidade de Berlim de Birke & Rauch (1994).
Birke & Rauch (2000) discutiram dados de uma criteriosa pesquisa geoquímica do solo superficial desenvolvida na megacidade de Berlim-Alemanha. Foram coletadas cerca de 4000 amostras de solo (profundidade de 0 a 0,2 m) em áreas suburbanas com pouca ou nenhuma contaminação, bem como em áreas residenciais e industriais em Berlim e arredores. Os autores classificaram e trataram separadamente, por exemplos, zonas caracterizadas como área arborizada (bosque); área agrícola; área com baixa densidade residencial; área com alta densidade residencial; áreas de tratamento de esgoto e área industrial.
Os valores de mediana de Birke & Rauch (2000) para as zonas de bosque, de alta densidade residencial e industrial foram plotados em gráficos (figura 2) para os seguintes elementos potencialmente tóxicos (EPT): As, Cd, Cr, Cu, Pb e Zn. Essas informações foram comparadas com os valores de background da cidade de Berlim, calculados por Birke & Rauch (1994). O objetivo seria, entre outros, comparar resultados em sítio com menos (bosque) e mais (residencial e industrial) susceptibilidade de contaminação antropogênica. Foram tratados 614 casos da área bosque; 476 de zona com alta densidade residencial e 459 amostras de zonas industriais.
Os dados da figura 2 são relativamente similares para os seis EPT. As medianas do setor arborizado (bosque) estão sempre próximas aos valores de background e nitidamente inferiores aos setores de alta densidade residencial e da zona industrial.
Esse exercício simples reforça a importância do mapeamento de áreas com a caracterização das atividades antropogênicas atuantes e dominantes e também confirma a tendência geoquímica de contaminação de setores com maior participação humana. O exercício indica, ainda, a importância metodológica de comparar amostras obtidas em áreas preservadas com áreas antropizadas
Referências Bibliográficas
Birke, M and Rauch, U.: 1994, Geochemical investigations in the urban areas of Berlin, Mineral Magazine 58A, 95–96, London (Mineralogical Society).
Birke, M.; Rauch, U. 2000. Urban Geochemistry: Investigations in the Berlin Metropolitan Area. Environmental Geochemistry and Health 22: 233–248.
Chambers, L.G.; Chin, Y; Filippeli, G.M.; Gardner, C.B.; Herndon, E.M.; Long, D.T.; Macpherson, G.L.; McElmurry, S.P.; McLean, C.E.; Moore, J.; Moyer, R.P.; Neumann, K.; Nezat, C.A.; Soderberg, K.; Teutsch, N.; Widom, E. 2016. Developing the scientific framework for urban geochemistry. Applied Geochemistry 67 1-20.
Thornton, I. 1992. Environmental geochemistry and health in the 1990s: a global perspective. Appl. Geochem. 11 (2), 203 – 210.
Unites Nations, Departamento of Economic and Social Affairs, Population Division, 2015. World Urbanization Prospects; The 2014 Revision. (ST/ESA/SER.A/366).
Carlos Augusto de Medeiros Filho, geoquímico, graduado na faculdade de geologia da UFRN e com mestrado na UFPA. Trabalha há mais de 35 anos em Geoquímica em Pesquisa Mineral e Ambiental
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 22/07/2020

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