Botando gasolina em vez de trilhos, artigo de Montserrat Martins
A questão dos combustíveis e dos transportes deveria ser vista como uma estratégia racional para o país, não nesse clima de paixões políticas
Fico feliz de ver um presidente dando exemplo de se vacinar, revogando um erro do presidente anterior, mas não fico feliz com a volta do imposto federal sobre a gasolina, o que vejo como revogar um acerto do governo anterior.
Só com essa frase já desagradei a dois tipos de pessoas, as que acham que o governo anterior estava certo em tudo e os que acham que o atual está certo em tudo, pois esse é o clima da política “generalizada” do momento, onde as pessoas tendem em aderir em bloco a um dos grupos políticos que disputam o poder.
A questão dos combustíveis e dos transportes deveria ser vista como uma estratégia racional para o país, não nesse clima de paixões políticas. Porque, para o bem de todos, para termos melhores alternativas de mobilidade e de logística, deveríamos ter em primeiro lugar um planejamento de longo prazo – coisa rara no Brasil – capaz de viabilizar o transporte ferroviário de cargas e de passageiros em todo o país.
Uma nova matriz de transportes não é uma pauta da direita nem da esquerda, está órfã de lideranças políticas que a promovam, pois de fato não faz parte da guerra ideológica, é uma questão de lógica e de civilização. Na Europa e nos Estados Unidos você pode ir a qualquer lugar de trem ou de metrô, as cargas também dispõe de uma ampla rede ferroviária.
Nossas vias urbanas, intermunicipais e interestaduais estão cada vez mais congestionadas, com carros, motos, ônibus e caminhões disputando espaço, num modelo poluidor e caro. Pagamos impostos federais, estaduais e ainda pedágios a concessionárias privadas.
Para onde vai o dinheiro do IPVA, por exemplo, que é bem caro? Os estados que se queixam da perda de arrecadação de impostos sobre combustíveis (outro acerto do governo anterior) não dão satisfação de onde gastam o dinheiro do IPVA, que teoricamente deveria dar conta da manutenção das estradas, só que essas cada vez são mais pedagiadas.
Nem o governo atual, nem o anterior, nem os anteriores, nem os de 50 anos atrás, nenhum governo investiu numa malha alternativa à rodoviária, porque é uma estratégia de longo prazo e os governos vivem de curto prazo, de uma eleição atrás da outra. Mas quando tivemos décadas de ditaduras (desde a de 30, até a de 64) também não foi planejado esse investimento, mesmo tendo os exemplos europeu e norte-americano.
Existem alternativas excelentes para as cidades, como o Aeromóvel, de tecnologia gaúcha, que já foi implantado em outros países, mas aqui se restringe ao Aeroporto Salgado Filho e agora ao de Guarulhos. Com tanta poluição, engarrafamento, impostos e pedágios, o que falta para se pensarem seriamente em outras alternativas?
Não conheço ninguém que diga o contrário, mas, não sendo uma pauta nem da direita nem da esquerda, será que as novas alternativas de transportes não poderiam fazer parte de um mínimo consenso nacional? Ou será que as coisas só vão receber atenção, aqui, quando forem polêmicas?
Montserrat Martins é Psiquiatra.
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in EcoDebate, ISSN 2446-9394
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