A concentração de CO2 é a mais alta em milhões de anos, artigo de José Eustáquio Diniz Alves
“Eu juro, é pior do que você pensa”
David Wallace-Wells no livro “A Terra inabitável”
A concentração de CO2 na atmosfera está chegando ao nível equivalente ao que existia há 15 milhões de anos e continua crescendo de maneira sem precedentes, a despeito da covid-19 e da recessão econômica ocorrida em 2020.
A desaceleração industrial devido à pandemia não reduziu os níveis recordes de gases de efeito estufa que estão prendendo o calor na atmosfera, aumentando as temperaturas, elevando o clima aos extremos, derretimento do gelo, aumento do nível do mar e acidificação dos oceanos, de acordo com a NOAA (Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos EUA).
O aumento em 2020 foi de 2,31 partes por milhão (ppm), atingindo o valor de 414,24 ppm em 2020, ou seja, em cada um milhão de moléculas de ar no planeta, havia 414,24 do principal gás de efeito estufa. O nível minimamente seguro, para evitar um colapso climático de grandes proporções, é de 350 ppm.
Nos 800 mil anos antes da revolução industrial, a concentração de CO2 na atmosfera ficou abaixo de 280 ppm. As medições com base no estudo do gelo, mostram que em 1860 a concentração atingiu 290 ppm. Em 1900 estava em 295 ppm. Chegou a 300 ppm em 1920 e atingiu 310 ppm em 1950. A partir do início do Antropoceno (1950), o efeito estufa se acelerou. Em 1958, Charles Keeling, instalou no alto do vulcão Mauna Loa o primeiro equipamento para medir as concentrações de CO2 na atmosfera. Isto possibilitou que a partir de uma série histórica de dados houvesse a possibilidade de acompanhar a poluição recente. A série de Keeling mostra que a concentração de CO2 na atmosfera, na média mensal, chegou a 399,76 partes por milhão (ppm) em maio de 2013 e só ultrapassou a barreira de 400 ppm no ano seguinte. E continua crescendo.
A previsão de aumento do dióxido de carbono para 2021 da NOAA (Mauna Loa) é de 2,29 (mais ou menos 0,55) ppm, o que implica uma concentração de 419,3 (+ ou – 0,6) ppm, o que significa que o CO2 atmosférico atingirá níveis 50% maiores do que as concentrações pré-industriais em 2021, conforme o gráfico abaixo. Desta forma, o dióxido de carbono continuará a se acumular na atmosfera em 2021 devido às emissões contínuas da queima de combustível fóssil, mudança no uso da terra e produção de cimento. Prevê-se que o aumento anual deste ano seja menor do que nos anos mais recentes, devido a um fortalecimento temporário do sumidouro de carbono da terra associado às atuais condições do La Niña.
Artigo de Ayesha Tandon, no Carbon Brief (08/03/2021), mostra que os “sistemas alimentares” foram responsáveis por 34% de todas as emissões de gases de efeito estufa causadas pelo ser humano em 2015, de acordo com uma nova pesquisa. O estudo, publicado na revista Nature Food, desenvolve o primeiro banco de dados a decompor as emissões de cada etapa da cadeia alimentar para todos os anos de 1990 a 2015. O banco de dados também descompacta as emissões por setor, gás de efeito estufa e país. De acordo com o estudo, 71% das emissões de alimentos em 2015 vieram da agricultura e “uso do solo associado e atividades de mudança no uso do solo”. O restante foi proveniente de varejo, transporte, consumo, produção de combustível, gestão de resíduos, processos industriais e embalagem. O estudo constata que o CO2 é responsável por cerca de metade das emissões relacionadas com alimentos, enquanto o metano (CH4) representa 35% – principalmente da produção animal, agricultura e tratamento de resíduos. As emissões do setor de varejo estão aumentando, conclui o estudo, e aumentaram 3 a 4 vezes na Europa e nos EUA entre 1990 e 2015.
O documento “World Scientists’ Warning of a Climate Emergency” (BioScience, 05/11/2019) afirma que: “O crescimento econômico e populacional está entre os mais importantes fatores do aumento das emissões de CO2 em decorrência da combustão de combustíveis fósseis”. Em consequência, diz o seguinte sobre a questão demográfica: “Ainda crescendo em torno de 80 milhões pessoas por ano, ou mais de 200.000 por dia, a população mundial precisa ser estabilizada – e, idealmente, reduzida gradualmente – dentro de uma estrutura que garante a integridade social” (Bongaarts e O’Neill 2018)”.
Portanto, o mundo está percorrendo uma rota perigosa. O aumento da concentração de CO2 na atmosfera contribuiu para o fato de termos 7 anos seguidos (2014 a 2020) de recordes de temperatura. O efeito estufa trará custos enormes e as sociedades podem não estar preparadas para pagar o alto preço de limpar no futuro a sujeira feita no passado e no presente. O mais grave é que nem as metas modestas do Acordo de Paris, de dezembro de 2015, estão sendo respeitadas.
As emissões de gases de efeito estufa (GEE) deveriam estar diminuindo, mas, ao contrário, o mundo continua emitindo grande quantidade de GEE. Assim, o mundo pode caminhar para uma situação de “Terra Estufa” e várias partes do Planeta podem ficar inabitáveis.
José Eustáquio Diniz Alves
Colunista do EcoDebate.
Doutor em demografia, link do CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/2003298427606382
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