quinta-feira, 28 de novembro de 2024

A expectativa de vida ao nascer nos EUA e na China

 

No caso da China e dos EUA, as projeções da ONU indicam que a expectativa de vida ao nascer deve ficar abaixo de 90 anos em 2100

Artigo de José Eustáquio Diniz Alves

Os Estados Unidos da América (EUA) e a China são as duas maiores economias do mundo e estiveram em evidência durante a 19ª Cúpula de Líderes do G20, realizada nesta semana, no Rio de Janeiro. Apesar de ter uma renda per capita bem menor, a China possui uma maior expectativa de vida ao nascer.

As taxas de mortalidade sempre foram altas na maior parte da história humana. Mas isto começou a mudar no século XIX com o desenrolar da Revolução Industrial e Energética que possibilitou o crescimento na oferta de alimentos, a expansão da produção de bens e serviços, a melhora no sistema de transporte, saneamento básico e comunicações e o aumento da renda e do consumo da população mundial.

Por volta do ano 1800, a expectativa de vida ao nascer (Eo) da população mundial estava em torno de 25 anos. Subiu para algo em torno de 30 anos em 1900, para pouco menos de 50 anos em 1950 e está próxima de 75 anos atualmente. Ou seja, nos últimos 200 anos a Eo praticamente triplicou. Isto nunca tinha acontecido antes e nem acontecerá no futuro, pois existe um teto biológico para a longevidade.

A redução das taxas de mortalidade foi a maior conquista social (e de direitos humanos) da história da humanidade.

Uma vida mais longa é fundamental para a qualidade de vida das pessoas, para as famílias e também para o desenvolvimento social e econômico.

O gráfico abaixo, com dados da Divisão de População da ONU (revisão 2024), mostra que a expectativa de vida ao nascer (Eo) nos Estados Unidos da América (EUA) era de 68,1 anos em 1950, chegou a 78,7 anos em 2010, diminuiu para 77 anos em 2020 (em função dos efeitos da pandemia da covid-19) e deve apresentar um aumento contínuo até o final do atual século, mas em ritmo cada vez mais lento. Entre 2020 e 2030 o aumento da Eo deve ser de 4,2%, caindo para 1,8% na década seguinte e deve apresentar um crescimento de somente 1,2% na última década do século XXI.

expectativa de vida ao nascer dos EUA

 

A expectativa de vida ao nascer (Eo) na China era de apenas em 43,8 anos em 1950 e caiu para 33,4 anos em 1960 em decorrência da grande mortalidade provocada pelo fracasso da política do “Grande Salto para a Frente”, que provocou a morte de dezenas de milhões de chineses. A China tinha uma Eo menos da metade da alcançada pelos EUA em 1960.

Mas a Eo subiu para 56,8 anos em 1970, um avanço de 41,2% na década e subiu para 64,2 anos em 1980 (um avanço de 11,5% na década de 1970). Nas décadas seguintes a Eo continuou subindo, mesmo que em ritmo mais lento e chegou a 78 anos em 2020, superando a Eo dos EUA. Pelas projeções da Divisão de População da ONU, a Eo deve atingir 89,8 anos em 2100, com variações decenais cada vez menores. Entre 2020 e 2100 a China deve ter uma Eo um pouco superior do que a expectativa de vida dos EUA.

expectativa de vida ao nascer da China

 

Evidentemente, é difícil prever o futuro, mas a cada 2 anos as projeções são atualizadas e poderemos acompanhar até que ponto serão efetivos os avanços na queda das taxas de mortalidade e no aumento da longevidade chinesa.

Sem dúvida, a expectativa de vida ao nascer avançou muito nas últimas décadas, especialmente no caso da China. Mas, inquestionavelmente, o ritmo de avanço tem se desacelerado com o tempo, desmistificando a ideia de que a Eo poderia crescer indefinidamente (por exemplo, superando os 150 anos) e a imortalidade poderia ser alcançada.

No dia 07 de outubro de 2024, a revista Nature publicou um artigo “Implausibility of radical life extension in humans in the twenty-first century” (Olshansky et al. 2024) mostrando que a tendência mundial de aumento da expectativa de vida desacelerou e que será quase impossível que a maioria das pessoas passe a viver até os cem anos. De fato, os avanços no aumento da longevidade sofreram uma desaceleração considerável dos anos 1990 até 2019. (Evidentemente a pandemia da covid-19 reduziu a expectativa de vida global em 2020 e 2021, mas já recuperou o nível pré-pandêmico em 2024).

De acordo com o artigo da Nature, os dados indicam que, ao menos nos países com a expectativa de vida mais elevada do mundo hoje, uma espécie de “teto” biológico foi alcançado. No caso da China e dos EUA, as projeções da ONU indicam que a expectativa de vida ao nascer deve ficar abaixo de 90 anos em 2100.

Neste mês de novembro foi publicado o artigo “Progress Stalled? The Uncertain Future of Mortality in High-Income Countries” (Dowd, 2024), publicado na prestigiosa revista Population and Development Review, também mostrando que o ritmo de avanço da expectativa de vida nos países mais ricos está caminhando para a estabilidade.

Os autores dizem: “Embora os limites biológicos para o aumento da expectativa de vida possam eventualmente dominar as tendências de longo prazo, fatores sociais criados pelo ser humano estão atualmente impedindo muitos países de atingir as melhores práticas de expectativa de vida já alcançáveis ​​e serão essenciais para melhorias no curto prazo”.

De fato, os ganhos da expectativa de vida ao nascer nos últimos 200 anos foram excepcionais. O número absoluto de pessoas centenárias deve continuar aumentando, embora a proporção de pessoas com mais de 100 anos deva continuar baixa.

Desta forma, a longevidade não vai continuar crescendo indefinidamente. Por exemplo, o agravamento da crise climática deve aumentar as ondas letais de calor e os idosos serão as principais vítimas da aceleração do aquecimento global. Portanto, a longevidade está sujeita a limites biológicos, sociais e ambientais.

Ampliar o tempo de vida é uma conquista. Mas a busca por uma longevidade sem limites pode gerar ansiedade nas pessoas e provocar o aumento da morbidade. Desta forma, o importante é aproveitar a vida, pois o que conta é viver bem. Traz sofrimento buscar uma longevidade que vai além da conta.

José Eustáquio Diniz Alves
Doutor em demografia, link do CV Lattes:
http://lattes.cnpq.br/2003298427606382

Referências:

ALVES, JED. ‘A imortalidade é matematicamente impossível’, Ecodebate, 05/02/2018
https://www.ecodebate.com.br/2018/02/05/imortalidade-e-matematicamente-impossivel-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/

Xiao Dong, Brandon Milholland & Jan Vijg. Evidence for a limit to human lifespan, Nature, 05 October 2016 https://www.nature.com/articles/nature19793

Editorial. The limits to human lifespan must be respected Nature volume 538, 05/10/2016
https://www.nature.com/articles/538006a

Olshansky et al. Implausibility of radical life extension in humans in the twenty-first century, Nature, 07/10/2024 https://www.nature.com/articles/s43587-024-00702-3

Jennifer Beam Dowd, Antonino Polizzi, Andrea M. Tilstra. Progress Stalled? The Uncertain Future of Mortality in High-Income Countries, Population and Development Review, 04 November 2024
https://onlinelibrary.wiley.com/doi/full/10.1111/padr.12687

 

in EcoDebate, ISSN 2446-9394

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