A Rio+20 – Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, que aconteceu em junho no Rio de Janeiro – reuniu 188 países, entre chefes de Estado e representantes, para discutir temas sobre desenvolvimento sustentável e definir uma agenda de ações para as próximas décadas. “Com o evento, temas como cidades, consumo e produção sustentáveis, desastres naturais, trabalho verde, governança local e outros avançaram para novos patamares de importância na discussão global”, destaca Renato Eugênio de Lima, geólogo e professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
Apesar da grande expectativa criada em torno do evento que marcou 20 anos de realização da Conferência Rio-92, no entanto, a Rio+20 sofreu muitas críticas por não apresentar medidas concretas e imediatas para o desenvolvimento sustentável em seu documento final “O futuro que queremos”. Assim, muitas ações e discussões foram deixadas para 2015, quando serão estabelecidos os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), que deverão ser adotados pelos países signatários. Esses padrões ainda não foram definidos, mas entram em voga daqui a três anos, quando findam os Objetivos do Milênio da ONU (veja box), definidos em 2000.
Faltaram resoluções e líderes
Vários pontos colocados para discussão na Rio+20 acabaram sem resolução, como o fortalecimento do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) por meio de sua transformação em uma agência da ONU. O documento final da reunião prevê o fortalecimento do órgão, contudo não determina como isso ocorrerá. “Faltou a elaboração de um documento plausível, com objetivos, metas e prazos a serem cumpridos pelos países. O Brasil, enquanto líder das discussões, teve uma postura conciliadora entre as diferentes posições dos países participantes”, avalia Lucas César Sant´ana, geógrafo e docente da Universidade Estadual de Maringá (UEM), que participou do encontro como voluntário do comitê nacional de organização.
Outro assunto pendente diz respeito ao financiamento de ações para o desenvolvimento sustentável em países com menos recursos. Foi proposta a criação de uma espécie de agência financeira global, um fundo de US$ 30 bilhões por ano, constituído por recursos dos países ricos, medida essa não contemplada nas resoluções da Conferência. Sant´Ana aponta a conjuntura econômica mundial como um dos entraves para a falta de ações concretas resultantes da Rio+20. “A ideia me parece pertinente, porém o momento não foi oportuno para que se alcançasse a formação dessa agência, o que ficou para agendas futuras”, explica.
“Vários países não estavam seguros sobre qual caminho seguir num momento em que enfrentamos crise econômica, e isso gerou um sentimento de frustração. Por outro lado, os eventos oficiais paralelos à Conferência e às reuniões de ONGs e lideranças sociais foram muito instigadores, e as discussões, muito proveitosas”, pondera Lima.
Alexandre Soares Rosado, docente da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), concorda que o documento final é vago em diversos pontos e não estabelece metas capazes de serem mensuradas. “Quando o assunto é preservação ambiental, não temos mais tempo para ‘meias-medidas’. Entretanto, ainda considero o documento importante e relevante por estabelecer uma boa base para uma discussão mais profunda no futuro”, salienta.
Para Walter Leal Filho, professor da Universidade de Hamburgo (Alemanha), “o documento [final da Conferência] lista muitas das ações necessárias no futuro, de forma que não se pode negar sua utilidade. O que nos falta agora são mecanismos para a implantação das medidas declinadas no documento”.
A ausência de líderes de países de destaque, como Barack Obama (presidente dos Estados Unidos), Angela Merkel (chanceler da Alemanha) e Yoshihiko Noda (primeiro-ministro do Japão) foi outro aspecto enfraquecedor da reunião. Segundo Rosado, a ausência desses nomes já era esperada. “Existem grandes interesses econômicos que se opõem de uma maneira equivocada aos temas discutidos em reuniões como a Rio+20. O problema é que negar ou fugir do problema não significa que ele irá desaparecer”, alerta. “A participação dos chefes de Estado dos EUA, Alemanha e Japão daria uma maior publicidade ao evento, entretanto seus representantes cumpriram seu papel, principalmente quanto ao posicionamento louvável da secretária de Estado norte-americana Hillary Clinton com relação aos direitos das mulheres” (leia reportagem), defende Sant´ana.
Para que serve?
Apesar das críticas em relação ao documento final da Rio+20 e à ausência de chefes de Estado importantes, Rosado considera essenciais encontros como a Rio+20. “As críticas são inúmeras e incluem os gastos de se fazer reuniões desse porte. Sempre ficamos com uma sensação de ‘fala-se muito e pouco se faz’, mas ainda assim acredito que é de grande valor que os líderes das nações do globo se reúnam em torno de um objetivo comum. A força política dessas reuniões não deve ser menosprezada”, acredita.
“As discussões são naturalmente lentas quando temos tantos grupos distintos e muitas vezes com interesses conflitantes, mas é esse o melhor caminho para se conquistar uma agenda global, um pacto para um futuro melhor. Apenas espero que os líderes sejam mais pró-ativos e que tenhamos tempo suficiente para implantar as mudanças necessárias”, assinala Rosado.
Na opinião de Leal, esses eventos aumentam a visibilidade do tema. “Mesmo sendo por um espaço curto de tempo, essas reuniões são importantes para que a comunidade mundial se encontre, converse e analise os problemas atuais e futuros”. Já Rosado acrescenta que eventos desse porte servem para mobilizar a opinião pública em torno dos grandes temas relacionados à preservação do planeta. “Não são reuniões técnicas e os assuntos não são discutidos com a profundidade que merecem, mas corroboram a intenção de comprometimento de diversas nações do globo para alcançarmos um futuro melhor”, afirma.
Lima aponta que seria útil aperfeiçoar as reuniões prévias, com discussões mais profundas e maior exigência de comprometimento nos momentos anteriores as grandes Conferências. “É preciso também reforçar o papel das reuniões específicas, transformando as grandes reuniões em momentos de confirmação de avanços acordados em fóruns mais especializados”, sugere. Esses eventos, enfatiza, não devem tentar emplacar medidas de última hora, como se tentou em Copenhagen, na COP-15: “Estão em jogo interesses relevantes de cada país e isso não permite acordos sem prévia análise e longa discussão.”
Na análise de Sant´ana, o Brasil, como líder de uma conferência desse porte, perdeu a oportunidade de apresentar propostas mais efetivas. “Nós tivemos a Rio-92, passamos pela Rio+20 e não sabemos se teremos uma Rio+40. Se os problemas decorrentes da degradação ambiental já estão em curso, então por que suas soluções são proteladas?”, indaga. A questão que fica é quando partiremos da discussão à prática.
Objetivos do Milênio
Em 2000, a ONU estabeleceu com 189 países um compromisso para lutar contra a extrema pobreza e outros problemas sociais, acordo que resultou nos oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), com o prazo até 2015 para serem alcançados. São eles:
1) Redução da pobreza;
2) Atingir o ensino básico universal;
3) Igualdade entre os sexos e a autonomia das mulheres;
4) Reduzir a mortalidade na infância;
5) Melhorar a saúde materna;
6) Combater o HIV/Aids, a malária e outras doenças;
7) Garantir a sustentabilidade ambiental;
8) Estabelecer uma parceria mundial para o desenvolvimento.
Matéria de Patricia Piacentini, no pré-Univesp – Número 23 – Balanço da Rio+20, indicada por Valdir Lamim-Guedes
EcoDebate, 20/08/2012
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