segunda-feira, 30 de setembro de 2019
domingo, 29 de setembro de 2019
OS 70 ANOS DA REVOLUÇÃO COMUNISTA NA CHINA.
Os 70 anos da Revolução Comunista na China, artigo de José Eustáquio Diniz Alves
“A revolução não é um convite para um jantar”
Mao Tse-Tung
[EcoDebate] No dia 01 de outubro de 1949, depois de uma longa marcha e do acúmulo de uma série de vitórias parciais, o líder do Exército de Libertação Popular e do Partido Comunista Chinês (PCC), Mao Tse-tung, proclamou, em Pequim, na Praça Tiananmen, a República Popular da China. Em seguida, Chiang Kai-shek, do kuomintang (Partido Nacionalista Chinês) se refugiou em Taiwan e proclamava a República da China.
Os 70 anos da Revolução Comunista na China, grosso modo, podem ser divididos em duas partes: um fracasso nos primeiros 30 anos e um sucesso nos 40 anos seguintes. Entre 1949 e 1979 a China viveu um período de grande turbulência, com muita fome, já que o povo chinês não foi “convidado para um jantar”.
Nas três primeiras décadas o gigante asiático se isolou do mundo, regrediu em termos econômicos e viveu três momentos cruciais: o “Grande salto para a frente”, a “Revolução Cultural” e a “Camarilha dos quatro”.
O “Grande salto para a frente” foi uma política lançada por Mao Tsé-Tung entre 1958 e 1960, que visava transformar a China Comunista em uma nação desenvolvida e socialmente igualitária em “um salto” (curto tempo), acelerando a industrialização urbana. Porém, o processo de industrialização fracassou, consumiu muitos recursos da área rural e provocou uma grande fome e uma das maiores mortalidades da história. As mortes ocorridas neste período são estimadas entre 20 e 50 milhões de óbitos, um número tão grande que provocou uma redução da esperança de vida da população mundial. Segundo a Penn World Table, a renda per capita da China, em poder de paridade de compra, era de US$ 883 em 1953 e caiu para US$ 834 em 1962.
A “Revolução Cultural” ocorreu principalmente na década de 1960 (mas se prolongou até a morte de Mao) e foi uma reação aos críticos da linha adotada pelo comitê do Partido Comunista e aos críticos do “Grande salto para a frente”. Para se manter no controle do Partido e do Estado, Mao Tse-tung incentivou o culto à personalidade e a difusão do “Livro Vermelho”, com citações de Mao. Os alvos da Revolução Cultural foram os membros do partido que mostravam alguma simpatia com o Ocidente ou com a União Soviética, a burocracia estatal, os intelectuais e todo o conhecimento consolidado e as políticas públicas na área de educação, saúde, etc. O sectarismo manteve a China pobre e isolada.
Depois da morte de Mao Tsé-Tung, em 9 de setembro de 1976, a chamada “Camarilha dos Quatro”, composta por Jiang Qing (esposa de Mao Tse-tung), Zhang Chunqiao, Wang Hongwen e Yao Wenyuan, tentaram dar continuidade à Revolução Cultural e ao isolamento do país, mas foram derrotados, abrindo espaço para a ascensão das forças reformistas. Ainda segundo a Penn World Table, a renda per capita da China ficou praticamente estagnada entre 1966 e 1976, passando de US$ 1119 para US$ 1210. Nos primeiros 30 anos da Revolução, a renda per capita chinesa era uma das mais baixas do mundo.
Entre 1976 e 1978 o poder na China mudou de mãos e de orientação. O novo líder, Deng Xiaoping (1904-1997), assumiu as rédeas do PCC e introduziu uma série de reformas, que ficaram conhecidas como a “segunda revolução”, provocando uma completa transformação do país, que abandonou o coletivismo comunista e assumiu uma feição mista, conhecida como “Socialismo de mercado” ou “Capitalismo de Estado”. A partir de 1978 a China dá realmente um grande salto para a frente e se torna a primeira economia mundial (medida em poder de paridade de compra), transformando o experimento dos últimos 40 anos em o maior e mais rápido exemplo de sucesso da história econômica mundial. Em 2016, a renda per capita chinesa ultrapassou a renda per capita brasileira.
O gráfico abaixo, com dados do FMI, mostra como a China saiu de uma situação de irrelevância econômica, cresceu e deslocou os EUA da posição de maior economia do mundo. Em 1980, o PIB dos EUA representava 21,6% do PIB mundial, enquanto o PIB da China representava apenas 2,3% (os EUA tinham uma economia quase 10 vezes maior). O PIB do Brasil representava 4,4% da economia global (o PIB do Brasil era quase 2 vezes maior do que o da China). Mas o quadro mudou totalmente nos últimos 40 anos. Em 2014, a economia chinesa superou a economia americana e em 2020, o FMI estima que o PIB da China representará 19,7% do PIB mundial e o PIB dos EUA apenas 14,8%. Nunca na história um país galgou crescimento tão rápido e expressivo.
A renda per capita da China (em poder de paridade de compra, a preços constantes), em 1980, segundo dados do FMI, era de US$ 722 contra US$ 790,00 do Burundi, US$ 11,4 mil do Brasil e US$ 29,1 mil dos EUA. A renda per capita da população brasileira era 16 vezes maior do que a da população Chinesa e a americana era 40 vezes maior. Mas em 2020, a renda per capita chinesa (com US$ 18 mil) atinge um nível maior do que a renda per capita brasileira (US$ 14,8 mil), sendo que a dos EUA está em US$ 57,2 mil. Portanto, o chinês médio já ganha mais do que o brasileiro, embora tenha, atualmente, uma renda 3 vezes menor do que a do americano médio.
Em termos demográficos, a população da China era de pouco mais de meio bilhão de pessoas em 1950 e deve atingir o pico de 1,44 bilhão de habitantes em 2029. A partir de 2030 haverá decrescimento populacional e a China deve chegar em 2100 com uma população de pouco mais de 1 bilhão de pessoas. A população em idade ativa que estava em 1 bilhão de potenciais trabalhadores em 2015 já está em declínio e deve se reduzir para a metade até o final do século.
Quem dita o ritmo de crescimento e de redução populacional é a taxa total de fecundidade (TFT). O gráfico abaixo mostra que a TFT estava em 6 filhos por mulher na época da Revolução Comunista e caiu na década de 1950. Porém, com a alta mortalidade ocorrida na época do “Grande salto para a frente” e com o caos econômico, social e político ocorrido durante a “Revolução Cultural” a TFT voltou a subir e ficou em 6,5 filhos por mulher no quinquênio 1965-70.
Todavia, o alto crescimento demográfico dificultava a luta para a redução da pobreza e, no início dos anos de 1970, ainda na época de Mao Tse-tung, foi lançada a política “Mais Tarde, Mais Tempo e em Menor Número” (em chinês: “Wan, Xi, Shao” e em inglês: “later, longer, fewer”) que incentivava as mulheres a terem o primeiro filho em idades mais avançadas, que mantivessem um espaçamento maior entre os filhos e que limitasse o tamanho da prole, adotando um tamanho pequeno de família.
A política “Wan, Xi, Shao” foi um sucesso e a taxa de fecundidade caiu de mais de 6 filhos para menos de 3 filhos em 1980. Tudo indicava que a fecundidade continuaria caindo. Porém, um governo autoritário não costuma respeitar as livres escolhas e os direitos sexuais e reprodutivos. No bojo das reformas implementadas por Deng Xiaoping em dezembro de 1978, foi instituída a “Política de filho único”, a iniciativa controlista mais draconiana da história da humanidade.
Em consequência, mesmo com a maior parte da população vivendo no meio rural, a fecundidade continuou caindo e a TFT ficou abaixo do nível de reposição no quinquênio 1990-95 (com 1,9 filho por mulher) e se manteve ao redor de 1,6 filho por mulher entre 2000 e 2015. Ou seja, depois de cerca de 35 anos de “Política de filho único” a TFT chinesa permanece baixa e o número de nascimentos anuais caiu de pouco mais de 30 milhões no quinquênio 1965-70 para cerca de 17 milhões de bebês na atual década (2011-20).
Para o demógrafo Baochang Gu, embora tenha havido exceções, especialmente na zona rural e entre minorias étnicas, a regulamentação rigorosa do filho único foi mantida até novembro de 2013, quando se permitiu que um casal tivesse um segundo filho, no caso de algum dos cônjuges fosse filho único. Em outubro de 2015, foi permitido a todos os casais terem o segundo filho. Em 2018 foram eliminadas as restrições ao número de filhos desejados.
Contudo, a baixa taxa de fecundidade veio para ficar, pois a flexibilização não implicou em um surto de nascimentos. Em 2016, imediatamente depois que se permitiu o segundo filho, nasceram 17,9 milhões de crianças, de acordo com a Agência Nacional de Estatísticas. Apenas 1,3 milhão a mais do que em 2015 e metade do que o Governo previa. Já em 2017, o número de nascimentos foi ainda menor, 17,2 milhões de novos bebês, muito abaixo dos 20 milhões estimados pelas autoridades. Em 2018, o número de nascimentos voltou a cair.
O fato é que a China adotou o modelo de baixo crescimento demográfico e alto crescimento econômico, possibilitando o aumento da renda per capita e a retirada de cerca de 1 bilhão de pessoas da extrema pobreza. O crescimento foi tão espetacular que muita gente se refere aos últimos 40 anos como o “milagre chinês”.
Evidentemente, nem tudo são flores. O custo ambiental do sucesso chinês foi dramático. A China é o maior poluidor do Planeta e campeão absoluto da emissão de gases de efeito estufa. A Pegada Ecológica chinesa é muito mais elevada do que a Biocapacidade e o país tem um alto déficit ambiental. Problemas como o da febre suína (um vírus altamente contagioso, sem cura conhecida, e com uma taxa de sobrevivência quase nula para os porcos infectados) aconteceu na África e se espalhou na China, que é a maior produtora e consumidora de carne suína do mundo. O país é responsável por mais da metade da população global de porcos. O Departamento Nacional de Estatística do país diz que a população de porcos caiu em quase 40 milhões, para 375,3 milhões, em relação ao ano anterior, devido ao surto de febre suína. Mas a epidemia pode dizimar cerca de 200 milhões de porcos. Isso teria um impacto negativo sobre a economia chinesa, uma vez que os preços da carne suína contribuem de forma importante para seus níveis de inflação e os preços da carne suína na China poderão subir mais de 70% no segundo semestre deste ano. Isto poderá ser a centelha de muitas manifestações populares e, certamente, vai atrapalhar a festa dos 70 anos da Revolução Chinesa.
Em termos políticos a China é uma ditadura de partido único, com controle da mídia e com grande controle da Internet e das redes sociais. Em 1959, houve a intervenção no Tibete, que restringiu a autonomia local e provocou o exílio do líder espiritual Dalai Lama, há 60 anos. Em 1989, o governo de Pequim reprimiu violentamente as manifestações populares na Praça Tiananmen. Na China não há liberdade religiosa e diversas religiões sofrem com a repressão do Estado. Os povos Uigures, de Xinjian, uma minoria muçulmana que fala um idioma próximo do turco, têm denunciado que um milhão de pessoas estavam sendo tratadas como “inimigos do estado”, sendo vítimas de “aprisionamento em massa” em “centros de contra extremismo”.
Agora em 2019, o PCC ameaça reprimir as manifestações populares em Hong Kong. Quatro meses de espetaculares manifestações na ilha estão atrapalhando os preparativos para a festa dos 70 anos da Revolução. Cerca de 20% da população de Hong Kong (mais de 1,5 milhão de pessoas) foram para as ruas no dia 18 de agosto, pedindo democracia e mostrando que não será fácil esmagar as manifestações democráticas. A situação se agrava especialmente para os honcongueses que não querem ser plenamente chineses. A despeito da riqueza de Hong Kong, tudo está cada vez mais caro na cidade, a desigualdade social aumenta e os jovens sofrem com a falta de mobilidade social ascendente. Acima de tudo, a população de Hong Kong não aceita o modelo autoritário da República Popular da China.
A linha dura de Xi Jinping em relação a Hong Kong acende o alerta para o caso de Taiwan e reduz ainda mais a chance de uma unificação pacífica das duas Chinas. A China continental parece abandonar seus esforços para conquistar corações e mentes em Taiwan e incrementou constantemente suas capacidades militares, gerando medo que possam ser usadas. Isto provocaria uma guerra com os EUA, jogando as duas potências na Armadilha de Tucídides.
Cabe ressaltar, que apesar de todo o progresso econômico – embora com restrição da liberdade individual e ameaça de um conflito internacional – a China ainda é um país de renda média e pode apresentar dificuldade para dar o salto para um país de renda alta. O envelhecimento populacional e o fim do bônus demográfico vão dificultar a continuidade do crescimento econômico nas próximas décadas, enquanto cresce no mundo as resistências contra as políticas mercantilistas do país. O cenário é de dificuldades internas e externas.
Contudo, o governo de Xi Jinping deseja comemorar os 100 anos do PCC em 2021 e tem um plano para fazer da China o país mais avançado do mundo até 2049, quando do aniversário de 100 anos da Revolução Comunista (ver figura abaixo). O plano tem parte de uma realidade que o país já é a fábrica do mundo e a campeã da produção de bens manufaturados. Com a política “Made in China 2025” o país pretende alcançar a produção de bens mais sofisticados e de maior valor agregado, se igualando na liderança da ciência e da tecnologia. Até 2035, a China pretende se destacar entre as grandes economias mundiais. Em 2049, o “Império do Meio” pretende liderar o mundo no conjunto das manufaturas e no que há de mais avançado na ciência e tecnologia.
Todavia, o caminho para a hegemonia global não será fácil, pois haverá pressões externas e internas. A guerra comercial e cambial entre os EUA e a China é só uma parte do problema que ocorre com a ascensão da China no cenário do poder mundial. Internamente, existem muitas manifestações contra o autoritarismo e o centralismo do PCC. O desacoplamento da “Chimerica” vai trazer dificuldades. O desequilíbrio na razão de sexo deixou milhões de homens sem parceiras na idade de casar e o envelhecimento populacional será muito rápido e intenso, aumentando a razão de dependência demográfica.
Enfim, os 70 anos da Revolução Chinesa foram marcados por muito sofrimento (de 1949 a 1978) e por muito progresso (entre 1978 a 2019). A China tem mostrado vontade e capacidade para deixar para trás a miséria e o subdesenvolvimento. O país tem demonstrado determinação para realizar grandes obras, como a do novo Aeroporto Internacional de Pequim-Daxing – conhecido como estrela-do-mar, inaugurado uma semana antes da data de aniversário dos 70 anos da Revolução de 1949. Mas o caminho para se tornar uma potência internacional, com alto padrão de vida para a população e com respeito ao meio ambiente não será tranquilo e sem obstáculos.
A China adota o modelo conhecido como “Consenso de Beijing” que se opõe ao modelo liberal conhecido como “Consenso de Washington”. Até recentemente os cientistas políticos consideravam que um país só atinge alto nível de desenvolvimento socioeconômico se adotar os princípios do regime democrático. Porém, a China está prestes a se tornar um país desenvolvido e com liderança tecnológica, mesmo sendo um regime autoritário e com alto grau de controle da mídia e das redes sociais.
O Império Soviético também comemorou 70 anos. Mas caiu logo em seguida. Contudo, o “Império do Meio” Vermelho pensa no longo prazo e já vislumbra um horizonte de sucesso em 2049, nos 100 anos da Revolução Comunista Chinesa. Resta saber se conseguirão chegar aos píncaros sem grandes atritos com a comunidade internacional, sem grandes revoltas no território nacional e sem a destruição da base ecológica, que é a condição necessária para o florescimento de qualquer civilização.
José Eustáquio Diniz Alves
Colunista do EcoDebate.
Doutor em demografia, link do CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/2003298427606382
Colunista do EcoDebate.
Doutor em demografia, link do CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/2003298427606382
Referências:
ALVES, JED. A ascensão da China, a disputa pela Eurásia e a Armadilha de Tucídides. Entrevista especial com José Eustáquio Diniz Alves, IHU, Patrícia Fachin, 21 Junho 2018
ALVES, JED. China, nova potência mundial Contradições e lógicas que vêm transformando o país. Revista do Instituto Humanitas Unisinos (IHU), China, nova potência mundial: Contradições e lógicas que vêm transformando o país. São Leopoldo, Nº 528, Ano XVIII, 17/9/2018 pp 51-58
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 27/09/2019
PROTOCOLO DE MONTREAL : 32 ANOS DE AVANÇOS E DESAFIOS.
32 anos do Protocolo de Montreal, avanços e desafios, por Rodrigo Berté e Augusto Lima da Silveira
[EcoDebate] O Protocolo de Montreal, que trata de substâncias que fragilizam a camada de ozônio, é um tratado internacional em que os países signatários comprometem-se a substituir as substâncias que demonstrem ser responsáveis pela destruição do ozônio, a partir de 16 de setembro de 1987, entrando em vigor em 1 de janeiro de 1989. A diminuição da camada de ozônio é um dos impactos antrópicos mais significativos da história da humanidade. Nos anos 80, foi descoberto um “buraco” na camada de ozônio na região Antártida. Foi um triste achado que chamou a atenção da comunidade científica mundial que, consequentemente, alertou governantes para que tomassem medidas e decisões imediatas, voltadas a proteção do meio ambiente e de todas as formas de vida no planeta.
A ameaça da degradação da camada de ozônio resulta da nossa vulnerabilidade frente aos raios ultravioleta (UV) emitidos pelo sol. Essa camada nos protege do desenvolvimento de doenças com origem em mutações genéticas, como o câncer de pele, resultante da exposição intensa aos raios UV. A abertura de uma fenda nesta camada colocou as autoridades em alerta para os riscos aos quais estaríamos expostos.
Graças ao Protocolo de Montreal, um acordo ratificado por 40 países, foi possível eliminar muitos produtos químicos nocivos e que rompem essa proteção natural, anteriormente utilizados na fabricação de: aerossóis, geladeiras, ar condicionado, entre outros. Comemoramos em setembro, 32 anos do referido protocolo. A compreensão do fenômeno foi por muito tempo um grande paradoxo, pois observava-se que o hemisfério norte era o maior produtor de gases potencialmente nocivos à camada de ozônio. Por outro lado, esses gases ao atingirem a estratosfera (pela circulação da atmosfera), migravam para o Equador e para os polos, pelas correntes atmosféricas fazendo com que o hemisfério Sul fosse o mais afetado.
De acordo com o pesquisador Wolfran, o que aconteceu é que os gases nocivos foram redistribuídos globalmente e, em particular, no hemisfério Sul há uma combinação de fatores externos que maximizam a destruição da camada de ozônio, como a presença de gases destrutivos, o intenso resfriamento da atmosfera em determinados períodos e a formação de nuvens estratosféricas polares.
O Protocolo de Montreal foi um grande marco entre os acordos internacionais para a proteção ambiental, pois foi o ponto de partida para grandes mudanças tecnológicas. Uma dessas mudanças foi a substituição de produtos que utilizavam os gases CFCs (que contém cloro, flúor e carbono na composição) por outros com menor poder de destruição do ozônio. Atualmente, é possível observar a identificação em produtos que substituíram os gases CFCs de sua composição como “produtos que não agridem a camada de ozônio”.
Apesar de a ameaça dos CFCs ter sido controlada com a implementação do tratado e as consequentes mudanças tecnológicas das indústrias, ainda é possível verificar a ação desses gases. Isso porque um grande número de produtos à base de CFCs produzidos no passado estão descartados inadequadamente nos lixões do mundo todo, liberando de forma gradual essas substâncias para a atmosfera.
Portanto, apesar dos avanços que o tratado trouxe, é preciso enfrentar mais uma batalha para a proteção da camada de ozônio: o descarte correto de resíduos sólidos. Implementar políticas para gerenciar corretamente esses resíduos é atualmente um grande desafio para a humanidade e um “nó” a ser desatado cuja resolução trará muitos benefícios do ponto de vista ambiental, inclusive para a proteção da camada de ozônio.
Autores
Prof. Rodrigo Berté, Ph.D – Diretor da Escola Superior de Saúde, Biociências, Meio Ambiente e Humanidades do Centro Universitário Internacional Uninter.
Prof. Me. Augusto Lima da Silveira – Coordenador do Curso Superior Tecnologia em Saneamento Ambiental na modalidade a distância do Centro Universitário Internacional Uninter.
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 27/09/2019
sexta-feira, 27 de setembro de 2019
CONSTRUÇÃO DA USINA DE BELO MONTE DESCUMPRIU PROMESSA DE LEVAR DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL À REGIÃO AMAZÔNICA.
Construção da usina de Belo Monte descumpriu promessa de levar desenvolvimento sustentável à região amazônica
Construção da usina de Belo Monte contribuiu para o aumento do custo de vida e da energia elétrica para a população de Altamira, no Pará, além de agravar problemas nos sistemas de habitação e de água e saneamento, aponta estudo apoiado pela FAPESP
Elton Alisson | Agência FAPESP – Em um intervalo de pouco mais de 40 anos, Altamira, no sudoeste do Pará, foi cenário de duas grandes obras de infraestrutura. A primeira foi a construção da rodovia Transamazônica, entre 1971 e 1973, e a segunda, a usina hidrelétrica de Belo Monte, na bacia do Rio Xingu, iniciada em 2011.
Estudioso dos impactos sociais e ambientais desses dois grandes projetos, Emilio Moran, professor da Universidade Estadual de Michigan, nos Estados Unidos, e pesquisador visitante do Núcleo de Estudos Ambientais (Nepam) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), avalia que os distúrbios causados por ambas as construções no município paraense tiveram algumas semelhanças.
“Quando cheguei a Altamira, em 1972, para pesquisar sobre a Transamazônica, presenciei a explosão populacional de mil para 10 mil habitantes em menos de um ano, o aumento do custo de vida e as rápidas transformações sociais e espaciais na cidade em função da velocidade da implantação da obra”, disse Moran.
“Ao voltar para a região, em 2010, para estudos sobre a usina de Belo Monte, fiquei surpreso ao me deparar com uma situação parecida: uma nova explosão demográfica, de 75 mil para 150 mil habitantes em dois anos, e uma série de problemas desencadeados por uma obra dessa magnitude. Parece que, passados quase 40 anos, as lições sobre como gerenciar grandes projetos de infraestrutura não foram aprendidas”, afirmou o pesquisador em um seminário realizado na sede da FAPESP nos dias 27 e 28 de agosto.
Durante o evento, foram apresentados os resultados de uma pesquisa sobre os processos sociais e ambientais da construção da hidrelétrica de Belo Monte. Uma das principais conclusões foi que as promessas de induzir o desenvolvimento econômico sustentável da região, por meio da geração de empregos e melhorias nos serviços públicos de saneamento, saúde e educação, feitas antes e durante a construção da usina, na qual foram investidos R$ 42 bilhões, não se concretizaram. Pelo contrário: contribuíram para aumentar o custo de vida e da energia elétrica para a população, agravar problemas nos sistemas de habitação e de água e saneamento, além de levar a uma diminuição da produção de alimentos e da pesca na região.
A pesquisa foi realizada nos últimos cinco anos, no âmbito de um projeto coordenado por Moran e apoiado pela FAPESP, na modalidade São Paulo Excellence Chair (SPEC).
Um dos objetivos do SPEC é trazer do exterior para São Paulo – por um período de, pelo menos, 12 semanas por ano – um pesquisador com distinção em sua área do conhecimento e reconhecimento internacional, com a tarefa de criar núcleos de pesquisa em universidade paulista e liderar um projeto de pesquisa apoiado pela Fundação, explicou Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico da FAPESP.
“A ideia é criar oportunidades de pesquisa de excelente qualidade e competitivas internacionalmente e também possibilitar que jovens pesquisadores em São Paulo possam conviver com cientistas estrangeiros líderes em suas áreas”, afirmou Brito Cruz.
Foi com essa missão que Moran dividiu seu tempo entre a Universidade de Michigan e o Nepam, da Unicamp, liderando um projeto que tinha como objetivo tratar, sob um ponto de vista científico, uma questão, como ele diz, desde início muito politizada: os impactos sociais e ambientais da construção da usina de Belo Monte.
“A ideia foi reunir todas as informações possíveis de todos os atores envolvidos na obra, como o consórcio responsável pela construção, as agências de governo responsáveis pela implementação e a população afetada, para possibilitar o entendimento da complexidade e documentar o processo de uma forma rigorosa, sem introduzir nenhum viés analítico”, disse.
Nova organização espacial
Na avaliação de Moran, os únicos benefícios da obra para a região foram a pavimentação de um grande trecho da Transamazônica – uma reivindicação antiga – e a criação de empregos na obra e no setor comercial durante a construção, mas de forma muito temporária. O pico de criação de empregos aconteceu no terceiro ano da empreitada, depois começou um processo de demissões até o término da construção, disse o pesquisador.
O aumento da população, em razão da chegada de 50 mil pessoas a Altamira entre 2011 e 2015 para trabalhar diretamente na obra ou nos setores de comércio e de serviços, resultou em especulação imobiliária na cidade, que já sofria uma insuficiência crônica de moradias. Além disso, deu origem a novos loteamentos planejados e não planejados e novos bairros periféricos.
Com todas essas mudanças, uma nova organização espacial urbana surgiu. “Ocorreu uma nova distribuição da população urbana, antes muito mais concentrada no centro da cidade e, com a construção da usina, um espalhamento maior para outros bairros”, disse Guillaume Leturcq, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e um dos pesquisadores participantes do projeto.
O aumento da densidade populacional também agravou os problemas sanitários da cidade, apontaram os pesquisadores.
Antes da obra, 86% da população de Altamira usava poços para consumo doméstico de água e, mais de 90%, fossas sépticas para descarte de esgoto.
Com o aumento da população e a demora nos investimentos em saneamento na cidade, que não contava com uma rede de esgoto, novos poços e fossas foram construídos, aumentando o risco de contaminação da água.
“Como as moradias ficaram mais próximas, ao abrir um poço, um novo morador não tem certeza se ele está longe da fossa do vizinho”, explicou Cristina Gauthier, doutoranda na Universidade Estadual de Michigan, que estudou o assunto durante o projeto.
A elevação do nível da água do rio Xingu para a construção da barragem contribuiu para agravar o problema ao diminuir a distância entre o fundo das fossas e as águas subterrâneas, apontou Gauthier.
“O transporte de contaminantes das fossas para as águas subterrâneas acontece mais rápido nesse caso”, disse.
Populações atingidas
O aumento do nível da água com a barragem também causou o deslocamento de 22 mil pessoas que viviam às margens do rio Xingu e na cidade de Altamira, em áreas baixas que seriam inundadas pelo reservatório, para cinco reassentamentos urbanos coletivos (RUCs), construídos pelo consórcio responsável pela obra em áreas periféricas de Altamira, a mais de dois quilômetros do centro.
Essa população vivia, até então, em casas de palafitas, próximas a igarapés ou áreas chamadas de “baixões”. As comunidades reuniam pescadores e ribeirinhos citadinos – que, além de morar em ilhas no Xingu, também tinham uma casa de palafita na cidade para ter acesso aos serviços de saúde, educação e comercializar a pesca.
“Essas pessoas perderam o contato com vizinhos e familiares que moravam próximas a elas nessas comunidades de palafitas e ‘baixões’, além da ligação com o rio, e foram reassentadas a mais de dois quilômetros do centro da cidade”, disse Leturcq.
“Foi um processo de migração único no país. Altamira é a cidade mais impactada pela construção de uma usina hidrelétrica de forma direta no Brasil”, afirmou.
A população de ribeirinhos citadinos e nas ilhas inundadas pelo reservatório foi a mais afetada pela obra, destacaram os pesquisadores.
Ao contrário dos grupos indígenas e de pescadores, que tiveram seus direitos específicos reconhecidos, os ribeirinhos a jusante da obra – no rio abaixo da barragem no Xingu – foram ignorados tanto nos estudos de impacto como no processo de reconhecimento e indenização de danos causados pela obra, apontou Vanessa Boanada Fuchs, pesquisadora da University of St. Gallen, da Suíça, e participante do projeto.
“Os gestores do empreendimento diziam que nunca tinham ouvido falar em ribeirinhos citadinos como grupo de população tradicional, e que eram simplesmente pescadores”, disse Fuchs.
“Levantamos a questão de que essa população precisaria ser indenizada pelas duas moradias que faziam parte de seu modo de vida, por ter sido retirada de uma ilha que foi inundada pela barragem e pela perda da moradia de palafita, na cidade. Os gestores da obra se recusaram a reconhecer esse modo de vida e isso gerou muita polêmica no processo indenizatório”, contou.
A população ribeirinha continua tentando reconhecimento de seu modo de vida com apoio do Ministério Público Federal, disse Fuchs.
Muito menos estudados do que as populações indígenas que vivem em territórios delimitados, os ribeirinhos descendem de nordestinos que foram trabalhar na Amazônia durante o ciclo da borracha e de outros imigrantes da região Nordeste.
Um número expressivo deles tem relação de parentesco com grupos indígenas, como os jurunas, mas eles se identificam como ribeirinhos e vivem dispersos ao longo dos rios, fora de áreas protegidas, explicou a pesquisadora.
“Apesar de terem origens distintas e ocupar territórios diferentes, eles partilham de algumas práticas socioculturais e ambientais em que o papel do rio é central”, disse Fuchs.
Como não foram identificados tanto pelo governo como pelos empreendedores da obra como um grupo populacional com direitos específicos, a exemplo dos indígenas, muitos ribeirinhos foram removidos de áreas próximas ao rio como um habitante comum da cidade e receberam como indenização pela casa uma quantia variável de dinheiro ou a possibilidade de obter uma nova moradia em um reassentamento, distante do rio, afirmou Fuchs.
“As mulheres ribeirinhas também pescavam com os maridos e a mudança da família para longe dos rios causou uma perda de renda familiar”, disse a pesquisadora.
Impactos econômicos
A construção da usina também causou perdas econômicas para ribeirinhos em comunidades localizadas não só a jusante – no rio abaixo da barragem, no Xingu –, como também a montante (na parte de cima do reservatório do rio), ponderaram os pesquisadores.
Durante um estudo de mestrado feito no âmbito do projeto pela doutoranda Laura Castro-Diaz, da Universidade Estadual de Michigan, em uma comunidade de ribeirinhos em Vila Nova, situada a jusante do rio, os pescadores apontaram uma diminuição na abundância e variedade de espécies de peixes com maior importância na região. Entre eles, o piraíba (Brachyplathystoma filamentosum) e o tucunaré (Cichla ocellaris).
“A construção da barragem diminuiu o fluxo da água e, com isso, houve uma perda dos pontos de pesca. Isso também aumentou as despesas de deslocamento dos ribeirinhos, que agora precisam ir para mais longe para conseguir pescar”, disse Castro-Diaz.
Outro setor impactado pela obra foi o agropecuário. A construção da usina hidrelétrica contribui para diminuir a produção agrícola familiar em Altamira ao diminuir a disponibilidade de trabalhadores para a atividade, atraídos por empregos na obra.
No período entre 2010 e 2014, 34% dos agricultores patronais e 29% dos produtores agrícolas familiares reportaram ter observado uma queda na disponibilidade de mão de obra em razão da migração de trabalhadores para a cidade para trabalhar na construção de Belo Monte, o que fez aumentar o custo salarial.
No mesmo período, 60% dos agricultores que se dedicavam à agricultura familiar abandonaram suas lavouras de culturas anuais como arroz, feijão e milho. Em contrapartida, aumentou a produção de cacau e a bovinocultura na região, de acordo com dados apresentados por Miqueias Calvi, professor da Universidade Federal do Pará (UFPA), também participante do projeto.
“A construção da usina de Belo Monte foi apresentada como a via para o progresso e crescimento econômico da região, uma vez que iria induzir setores na região, como o agropecuário, para atender à demanda do aumento da população. Mas aconteceu o contrário”, afirmou Calvi.
Hoje, Altamira importa alimentos de outras regiões do país, como pescados de Santa Catarina, frutas de São Paulo e arroz do Rio Grande do Sul, exemplificou o pesquisador.
“Os impactos econômicos positivos da obra foram temporários e transitórios e não contribuíram para a construção de bases para um desenvolvimento sustentável. Foi uma oportunidade perdida”, avaliou Calvi.
Este texto foi originalmente publicado por Agência FAPESP de acordo com a licença Creative Commons CC-BY-NC-ND. Leia o original aqui.
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 05/09/2019
DESERTIFICAÇÃO.
Desertificação: ONU pede investimentos na restauração de solos para salvar planeta e estimular economia
ONU News/Daniel Dickinson. Mudança climática e uso pouco sustentável dos solos provocou desertificação nos Camarões
Solos fornecem 99,7% dos alimentos que ingerimos; nesse momento, desertificação já está gerando uma perda entre 10% e 17% do Produto Interno Bruto global.
ONU News
Investir na restauração dos solos ajuda a manter o planeta saudável e pode ser o ponto de partida para resolver alguns dos maiores problemas de nosso tempo, disse o chefe da entidade da ONU que combate a desertificação.
O secretário executivo da Convenção das Nações Unidas para Combater a Desertificação, Ibrahim Thiaw, falou a jornalistas na sexta-feira durante a COP14, a cúpula global sobre o tema que acontece em Nova Deli, na Índia.
Investimento
Thiaw disse que se deve “investir na restauração dos solos como forma de melhorar os meios de subsistência, reduzindo as vulnerabilidades que contribuem para as mudanças climáticas e os riscos para a economia.”
Na COP14, que acontece até 13 de setembro, participam ministros, cientistas, representantes do governo, organizações não-governamentais e vários grupos comunitários de 196 países. O objetivo é chegar a acordo sobre novas ações para aumentar a fertilidade da terra.
Recurso
O representante disse que “a terra fornece 99,7% dos alimentos que ingerimos”, mas que “também fornece a água que bebemos.” Segundo ele, “o precioso recurso está em sério risco.
No ano passado, 25 países pediram medidas de emergência após uma seca generalizada. Em média, 70 países são afetados por secas todos os anos. Muitas vezes, as comunidades mais pobres são as que mais sofrem, lidando com o esgotamento de recursos e ficando dependentes de ajuda humanitária.
Ibrahim Thiaw disse que a degradação dos solos também “tem conexões com paz e segurança”, porque força as comunidades a competir pelo acesso à terra e à água e, em alguns casos, entrando em conflito.
Prejuízos
À medida que o fenômeno da desertificação se intensifica, existirão mais migrações forçadas, pressões crescentes sob os solos férteis e, ao mesmo tempo, mais insegurança alimentar e encargos financeiros.
Nesse momento, segundo o representante, a desertificação já está gerando uma perda entre 10% e 17% do Produto Interno Bruto, PIB, global.
Este problema, quando ligado à perda de biodiversidade, deu origem a mudanças ambientais que podem forçar até 700 milhões de pessoas a migrar até 2050.
Encontro
Até 13 de setembro, os países presentes na COP14 devem chegar a acordo sobre cerca de 30 decisões para garantir que os objetivos da Convenção 2018-2030 sejam alcançados. O compromisso mais abrangente é alcançar a neutralidade da degradação de terras.
Os Estados-membros devem adotar uma declaração para ser apresentada na próxima Cúpula de Ação Climática da ONU, que acontece a 23 de setembro em Nova Iorque. O documento deve destacar a restauração dos solos como parte da solução no combate à mudança climática.
PMA/James Belgrave.
Da ONU News, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 09/09/2019
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