sexta-feira, 17 de fevereiro de 2023

POLUIÇÃO MARINHA ESTÁ GERANDO ROCHAS FORMADAS POR PLÁSTICO.

Poluição marinha está gerando rochas formadas por plástico

Estudo demonstra como o plástico está se integrando ao ciclo geológico no ambiente costeiro e marinho

 

O aumento da produção e do consumo de novos materiais, a partir do desenvolvimento tecnológico, tem ampliado a capacidade de os seres humanos influenciarem o ciclo geológico da Terra, tornando-nos capazes de alterar irreversivelmente esses processos. A poluição, encontrada especialmente no ambiente marinho e ocasionada, em grande parte, pelos materiais plásticos, pode alterar até mesmo os cenários de fauna e de flora do ambiente terrestre.

É o que sugere um artigo publicado por cientistas da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e de outras instituições brasileiras no periódico Marine Pollution Bulletin, da plataforma ScienceDirect (Elsevier). Os autores encontraram novos dados que comprovam que o homem está atuando como agente geológico e ocasionando a geração de novas rochas, a partir da poluição marinha.

Antropoceno – impacto humano no planeta Terra é o campo de estudos dos pesquisadores do Antropoceno, perspectiva que representa o tempo em que a humanidade está se tornando o agente geológico ativo dos processos geológicos atuais. O tempo geológico, que embasa importantes teorias fundamentais da ciência moderna –como a Teoria da Evolução –, representa o reconhecimento de uma escala cronológica que subdivide os 4,5 bilhões de anos de história da Terra e é crucial para o entendimento da evolução do planeta, desde o seu início até como o conhecemos hoje.

estudo relata a ocorrência de rochas idênticas às naturais mas compostas por plástico no Parcel das Tartarugas, região da Ilha da Trindade – ilha vulcânica localizada a 1.140 quilômetros de Vitória (Espírito Santo) e administrada pela Marinha do Brasil. O local é uma importante reserva marinha do Atlântico Sul e uma Unidade de Monumento Natural Brasileiro. As rochas constituídas por plástico foram identificadas próximo à maior região de ninhos da tartaruga-verde (Chelonia mydas) e de recifes de caracóis marinhos do Brasil.

Pertencente à chamada Amazônia Azul – área com riquezas naturais e minerais abundantes que apenas o Brasil pode explorar economicamente –, a ilha é habitat natural de aves marinhas e alberga um ecossistema frágil e único que inclui espécies endêmicas de peixes e diferentes conjuntos recifais.

A descoberta de Fernanda Avelar Santos, doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Geologia da UFPR, aconteceu durante atividades de mapeamento geológico na Ilha.

“Identificamos quatro tipos de formas de detritos plásticos, distintos em composição e aparência. Os depósitos plásticos na plataforma litorânea recobriam rochas vulcânicas; sedimentos da atual praia compostos por cascalhos e areias; e rochas praiais com superfície irregular devido à erosão hidrodinâmica”, descreve a pesquisadora.

Os plastiglomerados, análogos às rochas sedimentares, foram relatados pela primeira vez no Havaí, em 2014. Outro material identificado na ilha brasileira foi o plastistone, similar às rochas ígneas e com composição predominantemente plástica. O elemento foi encontrado recobrindo rochas vulcânicas existentes na região, que registram o último episódio de vulcanismo ativo no Brasil.

“Além disso, observamos piroplásticos, descritos pela primeira vez na costa da Inglaterra”, revela Fernanda.

Os materiais retratados no artigo foram visualizados em campo em 2019 e possuem, no máximo, duas décadas de existência. Amostras coletadas passaram por análises laboratoriais que permitiram reconhecer diferentes formas de detritos plásticos. A autora explica que o fenômeno local-único ocorre acima de dois tipos diferentes de substratos – que estabelecem a ligação entre o substrato geológico e as formas plásticas.

Antropoceno: a era das consequências promovidas pelos homens no tempo geológico

A principal contribuição do artigo é o reconhecimento de que os seres humanos estão se comportando como agentes geológicos e influenciando os depósitos sedimentares. Com base nas intervenções humanas, os autores alertam que é necessário questionar o que é verdadeiramente natural.

Para a pesquisadora e coautora Giovana Diório, mestranda em Geologia na UFPR, o atual comportamento das pessoas em relação à poluição marinha está provocando uma mudança de paradigma da Geologia clássica, que possui uma perspectiva pré-antropocênica, ou seja, que entende os processos antigos da história da Terra a partir de uma concepção baseada no período anterior à interferência significativa do ser humano nos processos naturais.

“As ocorrências mostram que o impacto humano, assim como os seus resíduos, estão tão presentes no meio ambiente que começaram a influenciar processos antes considerados essencialmente naturais, a exemplo da formação de rochas”, pondera Giovana.

“Ao longo do tempo geológico, os principais agentes transformadores dos registros da Terra eram naturais. Por exemplo, processos tectônicos e mudanças climáticas. No entanto, a ação humana nos tempos atuais está tão penetrante que está modificando o planeta de forma mais acelerada do que os processos naturais”, declara a autora principal do artigo, que exemplifica: “ao destruirmos montanhas para exploração mineral ou realizarmos a construção de estradas, em semanas ou poucos anos essa montanha pode ser aplainada. Em um contexto de erosão natural, esse processo levaria milhares ou milhões de anos”.

O processo de formação de uma rocha a partir da poluição marinha, por exemplo, é rápido e depende de três etapas, nas quais o ser humano atua como principal agente geológico: disponibilidade de lixo plástico no ambiente marinho ou costeiro; arranjo e deposição do lixo em um local da praia, que ocorre quando as pessoas juntam o lixo a fim de descartar ou fazer fogueira; e aumento da temperatura do ambiente por meio de fogo, que derrete o plástico interage com os sedimentos da praia formando cimento plástico e, consequentemente, essas rochas.

Estudo demonstra como o plástico está se integrando ao ciclo geológico no ambiente costeiro e marinho

 

Para o geólogo Carlos Conforti Ferreira Guedes, professor do departamento de Geologia da UFPR e colaborador no artigo publicado, é necessário preservar estratigraficamente o impacto humano na Terra. A análise sedimentar e estratigráfica é o estudo e a descrição dos sedimentos e rochas sedimentares para interpretar como eles foram formados.

Ele explica que, com os materiais não-naturais, como lixo e plásticos, ocorrendo de forma indiscriminada na natureza, eles passaram a participar dos processos sedimentares e a se acumularem junto às rochas clássicas, ficando preservados no que se chama de registro geológico. “Quando os geólogos do futuro forem analisar as rochas deste período, poderão reconhecer o impacto humano na Terra pela identificação desses materiais não-naturais junto aos materiais naturais”, reflete.

Apesar de ainda não ser possível definir os impactos dessas rochas compostas por plásticos para o meio-ambiente e como elas irão se comportar no registro geológico, Fernanda sugere que as Geociências comecem a considerar a ação humana, assim como os materiais antropogênicos, como atributos fundamentais nos processos recentes.

“Atualmente, os conceitos clássicos da Geologia consideram apenas os fatores naturais como preponderantes para definir termos, como a definição de rocha. Em uma perspectiva do Antropoceno, estes critérios precisam ser atualizados e integrar a ação humana como aspecto fundamental. Dessa forma, poderemos entender de que modo estamos impactando o sistema terrestre atual e buscar soluções para amenizar e construir um futuro geológico em harmonia com os sistemas naturais”, alerta a cientista.

O impacto humano no planeta Terra é o campo de estudos dos pesquisadores do Antropoceno, perspectiva que representa o tempo em que a humanidade está se tornando o agente geológico ativo dos processos geológicos atuais.

O tempo geológico, que embasa importantes teorias fundamentais da ciência moderna – como a Teoria da Evolução –, representa o reconhecimento de uma escala cronológica que subdivide os 4,5 bilhões de anos de história da Terra e é crucial para o entendimento da evolução do planeta, desde o seu início até como o conhecemos hoje.

Fonte: Ciência UFPR

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in EcoDebate, ISSN 2446-9394

A MONTANHA DA DÍVIDA GLOBAL E O ISCO DA DÍVIDA ESTAGFLACIONÁRIA.

A montanha da dívida global e o risco da dívida estagflacionária, artigo de José Eustáquio Diniz Alves

A economia internacional tem crescido nas últimas décadas às custas de uma avalanche de dívidas.

No setor privado, a montanha de dívidas inclui famílias (como hipotecas, cartões de crédito, empréstimos para automóveis, empréstimos estudantis, empréstimos pessoais), empresas e corporações (empréstimos bancários, títulos de dívida e dívida privada) e o setor financeiro (passivo de instituições bancárias e não bancárias).

No setor público, estão os títulos do governo central, provincial e local e outros passivos formais, bem como dívidas implícitas, como passivos não financiados de esquemas de pensões pré-pagas e sistemas de saúde.

O gráfico abaixo, de artigo do FMI (12/12/2022), mostra que a dívida estava perto de 100% do PIB global em 1970 e passou para cerca de 250% atualmente. A dívida pública e privada total diminuiu em 2021 para o equivalente a 247% do produto interno bruto (PIB) global, caindo 10 pontos percentuais em relação ao seu nível máximo em 2020, de acordo com a última atualização do banco de dados da dívida global do FMI. Expressa em dólares, no entanto, a dívida global continuou a crescer, embora a um ritmo muito mais lento, atingindo um recorde de US$ 235 trilhões no ano passado.

crescimento do endividamento global público e privado

 

Segundo Nouriel Roubini (02/12/2022), anos de flexibilização quantitativa (QE) e de crédito mantiveram os custos dos empréstimos próximos de zero e, em alguns casos, até negativos (como na Europa e no Japão até recentemente). A explosão de índices insustentáveis de dívida implicava que muitos tomadores de empréstimos – famílias, corporações, bancos, bancos paralelos, governos e até mesmo países inteiros – eram “zumbis” insolventes sustentados por baixas taxas de juros (que mantinham os custos do serviço da dívida administrável).

Durante a crise financeira global de 2008 e a crise do COVID-19, muitos agentes insolventes que teriam ido à falência foram resgatados por políticas de taxa de juros zero ou negativa, QE e resgates fiscais definitivos.

Porém, Roubini alerta que agora, a inflação (alimentada pelas mesmas políticas fiscais, monetárias e de crédito ultra flexíveis) está cobrando o seu preço. Com os bancos centrais forçados a aumentar as taxas de juros em um esforço para restaurar a estabilidade de preços, os zumbis estão experimentando aumentos acentuados nos custos do serviço da dívida. Para muitos, isso representa um golpe triplo, porque a inflação também está corroendo a renda familiar real e reduzindo o valor dos bens familiares, como casas e ações.

Igualmente, isto vale para corporações, instituições financeiras e governos frágeis e super alavancados: eles enfrentam custos de empréstimos em alta acentuada, rendas e receitas em queda e valores de ativos em declínio, tudo ao mesmo tempo.

O FMI considera que as perspectivas de crescimento econômico global estão enfrentando uma mistura única de ventos contrários, incluindo a invasão da Ucrânia pela Rússia, aumentos nas taxas de juros para conter a inflação e efeitos pandêmicos persistentes, como os bloqueios da China e interrupções nas cadeias de suprimentos.

O último relatório do Panorama Econômico Mundial reduziu a previsão de crescimento global para 2023, já que as perspectivas econômicas globais são mais sombrias. Hoje, a civilização enfrenta simultaneamente os efeitos de uma pandemia, uma guerra na Europa e um desafiador cenário inflacionário.

Este ambiente é favorável à volta da estagflação, pois para contrapor a política monetária frouxa, a receita ortodoxa é os governos tomarem medidas fiscais contracionistas (aumento de impostos). Tudo isto indica que a época do crescimento econômico acelerado chegou ao fim e, num quadro de envelhecimento populacional global, a probabilidade é de menor crescimento econômico nos próximos anos.

Como disse Roubini: “A grande crise da dívida estagflacionária está aí vivíssima e prosperando”.

José Eustáquio Diniz Alves
Doutor em demografia, link do CV Lattes:
http://lattes.cnpq.br/2003298427606382

Referência:

Vitor Gaspar, Paulo Medas, Roberto Perrelli. Riding the Global Debt Rollercoaster, IMF, 12/12/2022
https://www.imf.org/en/Blogs/Articles/2022/12/12/riding-the-global-debt-rollercoaster

Nouriel Roubini. O Colapso Inevitável, Project Syndicate, 02/12/2022
https://www.project-syndicate.org/commentary/stagflationary-economic-financial-and-debt-crisis-by-nouriel-roubini-2022-12/portuguese?barrier=accesspaylog

 

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in EcoDebate, ISSN 2446-9394

ESTUDO IDENTIFICA RESÍDUOS DE AGROTÓXICOS EM PAPINHAS INFANTIS.

 papinha

Estudo identifica resíduos de agrotóxicos em papinhas infantis

“Ainda que estejam dentro dos limites preconizados pela legislação europeia, o ideal é que essas substâncias não sejam encontradas em alimentos infantis”

Autoria – Monica Tarantino | Agência Fapesp
Fotos – Reprodução
Edição de imagem – Paulo Cavalheri
Jornal da UNICAMP

Estudo conduzido por cientistas do Brasil e da Espanha rastreou a presença de 21 agrotóxicos (incluindo fungicidas, inseticidas e herbicidas) e quatro toxinas produzidas por fungos do gênero Aspergillus (aflatoxinas) em 50 amostras de alimentos industrializados para bebês comercializados em supermercados no Estado de São Paulo.

A boa notícia é que não foram encontradas nas amostras selecionadas as temidas aflatoxinas, que são tóxicas ao organismo humano e de animais e podem surgir em cereais, grãos e outros cultivos. A aflatoxina B1, por exemplo, é comprovadamente carcinogênica.

A pesquisa foi conduzida pela engenheira de alimentos Rafaela Prata, com apoio da Fapesp, e divulgada na revista Food Control.

Quanto aos agrotóxicos, o estudo revelou inicialmente a presença de sete dos 21 compostos rastreados. “Encontramos resíduos de pesticidas em 68% das amostras analisadas de alimentos infantis. No recorte por composição e sabor, 47% das papinhas com frutas apresentaram pelo menos um resíduo de agrotóxico, índice que foi de 85% para as comidas de bebês à base de carne e vegetais”, descreve a pesquisadora.

As concentrações dos agrotóxicos identificados ficaram abaixo dos limites máximos de resíduos estabelecidos pela legislação europeia desde 2006, que foi usada como padrão no estudo. De modo geral, na União Europeia, o limite é de 10 microgramas por quilo de alimento para diferentes agrotóxicos. Limites ainda mais baixos foram determinados para agrotóxicos específicos, como fipronil (4 microgramas por quilo). “Não existe, no Brasil, uma legislação própria para limitar a concentração de resíduos de agrotóxicos em alimentos infantis”, diz Prata. “O que existe são monografias sobre agrotóxicos no site da Agência Nacional de Vigilância Sanitária [Anvisa], que consultamos para ver em quais cultivos o uso de determinado produto é autorizado, bem como os limites máximos em alimentos, mas nada sobre as papinhas”, diz Prata.

Para a pesquisadora, falta uma regulamentação específica para esses produtos. “Os bebês são um grupo populacional sensível e vulnerável porque ingerem mais alimentos por quilograma de peso corporal do que os adultos e seus sistemas de desintoxicação e vias metabólicas não estão totalmente desenvolvidos. É importante conhecer a composição dos alimentos oferecidos a eles”, justifica a pesquisadora.

“Ainda que estejam dentro dos limites preconizados pela legislação europeia, o ideal é que essas substâncias não sejam encontradas em alimentos infantis”, afirma o pesquisador espanhol Roberto Romero-González. Referência internacional no estudo de contaminantes e supervisor deste projeto de pesquisa no exterior, González é um dos líderes do Laboratório de Química Analítica e Contaminantes do Research Centre for Mediterranean Intensive Agrosystems and Agri-Food Biotechnology (Ciaimbital), na Universidade de Almeria, na Espanha, onde foi realizada parte das análises das papinhas brasileiras, com financiamento da Fapesp.

Faltam estudos

presença de pesticidas e de toxinas produzidas por fungos em alimentos infantis ainda é pouco estudada no Brasil, embora avance em países europeus. “Somos um dos maiores consumidores dessas substâncias do mundo. Precisamos investir nesse tipo de pesquisa”, defende Prata. “Até onde sabemos, foi a primeira análise feita com uma metodologia desenvolvida para identificar pesticidas de classes diferentes e micotoxinas em alimentos infantis à base de carnes e vegetais.”

Parte da investigação foi conduzida no Laboratório de Análises de Alimentos I da Faculdade de Engenharia de Alimentos da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), sob a coordenação da professora Helena Godoy, que estuda contaminantes em alimentos infantis e validação de métodos com apoio da Fapesp. Anteriormente, o país dispunha apenas de dados sobre a contaminação por agrotóxicos em papinhas feitas com frutas.

Logo depois dessa análise, o grupo submeteu as mesmas amostras a uma nova triagem para rastrear a presença de 2.424 contaminantes não abordados a princípio, entre eles outros pesticidas, hormônios, medicamentos veterinários e seus metabólitos (substâncias derivadas da metabolização desses compostos químicos pelo organismo humano).

“Encontramos mais dez agrotóxicos e um metabólito, demonstrando que o método que desenvolvemos é sensível e eficaz”, diz Prata. Ela se refere ao processo de inovação, com uso de novos materiais, para adaptar metodologias usadas para identificar um único composto à detecção simultânea de um conjunto de resíduos de agrotóxicos e micotoxinas. “Nós conseguimos desenvolver um método analítico multirresíduos confiável e validá-lo totalmente. Pode ser uma ferramenta útil para programas de vigilância de alimentos”, afirma.

Segundo a pesquisadora, o metabólito sulfóxido de aldicarbe foi encontrado em três sabores de papinhas: caldo de feijão, arroz e carne; legumes e carne; e abóbora, feijão preto e peito de frango. O teste não mediu a quantidade de resíduos.

O aldicarbe é um pesticida proibido no Brasil desde 2012. Por sua alta toxicidade, era usado ilegalmente como raticida (o popular “chumbinho”). Segundo o toxicologista Daniel Junqueira Dorta, professor de química forense na USP de Ribeirão Preto, trata-se de pesticida que se degrada rapidamente no solo, em cerca de duas ou três semanas. A presença de resíduos no alimento sugere, portanto, o uso irregular nas lavouras. Da mesma forma, o composto se degrada rapidamente no organismo e é eliminado.

“O efeito pior do aldicarbe é agudo, por concentração mais alta”, diz o toxicologista. “De todo modo, não deveria haver resíduo desse tipo de jeito nenhum”, diz o toxicologista. Para a professora Helenice de Souza Spinosa, da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP, que analisou a toxicidade do composto em cães e gatos, o achado é relevante e precisa ser mais bem investigado e detalhado. Ela lembra ainda que o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), além das próprias empresas, faz o monitoramento da presença de contaminantes nos alimentos por amostragem regularmente.

“Se você pensar que a criança vai se alimentar com pequena quantidade e nesse estudo nem está quantificado, ou seja, podem ser apenas traços, isso não vai causar intoxicação aguda. Mas o achado é importante: embora proibido, pode ser que estejam usando e não sabemos”, diz Spinosa.

Procurada pela reportagem, a Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (Abia) sugeriu, por meio de sua assessoria de imprensa, que a Agência Fapesp entrasse em contato com a Associação Brasileira da Indústria de Alimentos para Fins e Congêneres (Abiad). Em nota, a Abiad afirmou que as empresas a ela associadas seguem todas as normas e legislações nacionais vigentes e que têm restritas políticas para garantir a qualidade dos produtos aos consumidores.

“Os alimentos passam por diversos e rígidos processos de controle de vigilância sanitária, sendo aprovados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária, e só então liberados para o consumo do público. A Abiad também reforça que nenhuma das empresas associadas foi informada por órgãos que regulamentam a qualidade dos produtos no Brasil sobre substâncias irregulares encontradas em alimentos infantis.”

Acesse o artigo Targeted and non-targeted analysis of pesticides and aflatoxins in baby foods by liquid chromatography coupled to quadrupole Orbitrap mass spectrometry

Matéria originalmente publicada no site da Agência Fapesp. 

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in EcoDebate, ISSN 2446-9394

TEMPERATURA OCEÂNICA RECORDES AFETAM O CLIMA GLOBAL.

 Um mapa-múndi plotado com blocos de cores representando percentis das temperaturas médias globais da terra e do oceano para todo o ano de 2022. Os blocos de cores representam o aumento do calor, de azul escuro (área mais fria recorde) a vermelho escuro (área mais quente recorde) e abrangendo áreas em entre

Um mapa-múndi plotado com blocos de cores representando percentis das temperaturas médias globais da terra e do oceano para todo o ano de 2022. Os blocos de cores representam o aumento do calor, de azul escuro (área mais fria recorde) a vermelho escuro (área mais quente recorde) e abrangendo áreas em entre “muito mais frio que a média” até “muito mais quente que a média”. (NOAA NCEI)

Temperaturas oceânicas recordes afetam o clima global

Uma temperatura oceânica recorde contínua com o aumento da estratificação e mudanças no padrão de salinidade da água fornecem informações sobre o que o futuro reserva em meio a um clima perpetuamente aquecido.

Institute of Atmospheric Physics*, Chinese Academy of Sciences
O estado de nossos oceanos pode medir a saúde do mundo e, a julgar pelas observações oceânicas atualizadas de 24 cientistas em 16 institutos em todo o mundo, precisamos de um médico. 
Os três principais indicadores da mudança climática incluem temperaturas recordes históricas contínuas, altos níveis de contraste de salinidade oceânica e aumento da estratificação oceânica (separação da água em camadas) sem sinais de desaceleração. 
Esses indicadores estão levando os cientistas a abordar e prever rapidamente os componentes futuros das mudanças climáticas para melhor preparar o público para um futuro climático extremo à frente. 
Os resultados foram publicados recentemente, onde um novo recorde de 0-2000 m de conteúdo de calor oceânico (OHC) foi estabelecido e registrado em 2022, com uma adição de aproximadamente ~10 Zetta joules (ZJ) de calor no oceano em relação a 2021. Um Zetta joule é um joule (unidade para medir “trabalho” ou “calor”) com 21 zeros atrás dele.
Os resultados foram publicados em 11 de janeiro de 2023 na Advances in Atmospheric Science . Ele resume dois conjuntos de dados internacionais: do Instituto de Física Atmosférica (IAP) da Academia Chinesa de Ciências (CAS) e dos Centros Nacionais de Informações Ambientais (NCEI) da Administração Nacional Oceânica e Atmosférica (NOAA), que analisam observações do conteúdo de calor do oceano e seu impacto datando da década de 1950. “Os dados do IAP e do NCEI mostram uma mensagem consistente de que o conteúdo de calor do oceano superior a 2.000m atinge um valor recorde em 2022”, disse Tim Boyer, pesquisador sênior do NCEI/NOAA.
10 ZJ de calor é igual a ~100 vezes a geração mundial de eletricidade em 2021 (28466 TWH), ~325 vezes a produção de eletricidade da China em 2021 (8537 TWH), ~634 vezes a produção de eletricidade nos Estados Unidos em 2021 (4381 TWH). 10 ZJ de calor também podem ferver 700 milhões de chaleiras de 1,5L por segundo no ano passado.
“O aquecimento global continua e se manifesta no calor recorde do oceano, e também em extremos contínuos de salinidade. Este último destaca que as áreas salgadas ficam mais salgadas e as áreas frescas ficam mais frescas e, portanto, há um aumento contínuo na intensidade do ciclo hidrológico.” disse CHENG Lijing, principal autor e pesquisador do IAP/CAS.
O que não é difícil de entender é como essa quantidade de calor que vai para os oceanos tem sérias consequências e, na verdade, vem muito mais rápido do que se esperaria. A salinidade crescente e, portanto, a estratificação dos oceanos podem alterar a forma como o calor, o carbono e o oxigênio são trocados entre o oceano e a atmosfera acima dele. Este é um fator que pode causar a desoxigenação do oceano, ou perda de oxigênio, dentro da água. A desoxigenação em si é um pesadelo não apenas para a vida e os ecossistemas marinhos, mas também para os humanos e nossos ecossistemas terrestres. 
A redução da diversidade oceânica e o deslocamento de espécies importantes podem causar estragos em comunidades dependentes da pesca e suas economias, e isso pode ter um efeito cascata na maneira como a maioria das pessoas consegue interagir com seu ambiente.
Alguns lugares já estão vendo os impactos de um oceano em rápido aquecimento, e eles não são exatamente como o esperado. 
“Alguns lugares estão passando por mais secas, o que leva a um risco maior de incêndios florestais, e outros lugares estão passando por grandes inundações devido a fortes chuvas, muitas vezes apoiadas pelo aumento da evaporação dos oceanos quentes. Isso contribui para mudanças no ciclo hidrológico e enfatiza o papel interativo que os oceanos jogam.” disse Kevin Trenberth, terceiro autor do artigo e pesquisador do Centro Nacional de Pesquisa Atmosférica e da Universidade de Auckland. Um aumento na temperatura e na salinidade da água contribui diretamente para a formação de camadas de água em vez de se misturar, e isso é apenas parte do que prejudica o delicado equilíbrio entre nossos oceanos e a atmosfera.
“No futuro, o grupo se concentrará em entender as mudanças dos principais ciclos da Terra e melhorar as projeções futuras das mudanças de calor, água e carbono da Terra. Esta é a base para os humanos se prepararem para as mudanças e riscos futuros. ” disse John Abraham, professor da Universidade de St. Thomas, o segundo autor deste estudo. 
O rastreamento contínuo dessas mudanças dará aos cientistas uma ideia do que pode ser feito preventivamente para se preparar para temperaturas mais altas, clima extremo e todas as outras consequências que acompanham o aquecimento dos oceanos e um ciclo hidrológico impactado. 
“Os oceanos estão absorvendo a maior parte do aquecimento das emissões humanas de carbono”, disse o autor do artigo, Michael Mann, professor da Universidade da Pensilvânia. “Até atingirmos as emissões líquidas zero, esse aquecimento continuará e continuaremos a quebrar recordes de conteúdo de calor oceânico, como fizemos este ano. Melhor conscientização e compreensão dos oceanos são a base para as ações de combate às mudanças climáticas.”

Referência:

Cheng, L. J., and Coauthors, 2023: Another year of record heat for the oceans. Adv. Atmos. Sci., https://doi.org/10.1007/s00376-023-2385-2

 

Henrique Cortez *, tradução e edição.

 

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Informe do Institute of Atmospheric Physics, Chinese Academy of Sciences, in EcoDebate, ISSN 2446-9394